As Frustrações da Ironia
Calhou num 31 de Julho o derradeiro dia da vexação oficial imposta a Daniel Defoe, através da exposição no pelourinho. Fruto também das sucessivas transferências de causas e Senhores que serviu, quer como panfletário, quer como "assessor" gestor de imagem, ou espião, dos Stuarts ao seu rival de proveniência holandesa, passando aos governos Tories e Whigs que se sucederiam até aos primeiros tempos da Dinastia de Hanover, não tinha uma alma, com excepção do Conde de Oxford e Mortimer, que se apiedasse dele. Como em tudo na vida, quisera defender os puritanos Dissenters, de que era originário, após tê-los criticado severamente. Tentou fazer tal com a redacção de um "manual" sobre a maneira mais «eficaz» - shorter - de lidar com o grupo, como se tivesse sido um fanatizadíssimo adversário deles, um exterminante Pastor High Church - a assiná-lo. Parte do Governo percebeu quão corrosivo era o tom humorístico e processou-o em conformidade. Mas muitos dos pretensos alvos que procurava beneficiar e alguns perseguidores deles tomaram à letra o escrito, fundando nele a sua hostilidade ao Autor, ou aos visados, respectivamente.
O resto é o que se sabe. Apesar do contentamento de um Pope, que chegou a ficcionar um já em desuso corte de orelhas do condenado, dessa forma enganando ainda hoje muitos investigadores estrangeiros, portugueses de vulto incluídos, a multidão, habitualmente colaborante nestas execuções soft, em fez de atirar os ovos e excrementos do costume, dava-lhe água e comida e recitava o seu «Hino ao Pelourinho», como manifestação anti-governamental. Mas o Escritor, que não era a corajem personificada, já tinha experimentado suficientes sofrimentos.
Moral da História: só pode com êxito esgrimir ironias quem se sabe inequivocamente de que lado está.