Pobre Condição

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot
Sorte teve ela em não ter nascido por Angola, onde as autoridades competentes exercem um policiamento feroz, traduzido em pressões para que a homóloga do PALOP prescindisse da representação por se não inserir no cânone, na ocasião criado, de um padrão de beleza consubstanciado numa tonalidade dérmica de escuridão mínima...
Pode parecer tema demasiado tétrico para uma primaveril e luminosa manhã de Domingo, mas gostaria, hoje, de Vos deixar algumas linhas sobre George Selwyn, aqui ao lado representado, numa pintura de Reynolds. Disse tétrico porque é considerado o maior necrófilo do Ocidente Europeu. Quem delirou com as cenas imortais de «BELLE DE JOUR», de Buñuel, viu muito pouco, quando as comparamos com a biografia deste Gentleman.
Trata-se de de uma estranha personalidade que o setecentismo inglês produziu, uma espécie de proustiano Swan avant la lettre, frequentador exaustivo das mais requintadas festas da Aristocracia, e da Realeza, até. Relacionado com o Dr. Johnson, expulso no entanto de Oxford por ter celebrado uma ceia com um cálice consagrado, reivindicando ser uma reencarnação de Jesus Cristo, era, segundo todos os testemunhos, muito agradável de trato e, com Walpole, o autor da melhor epistolografia da época.
O seu traço mais visível, contudo, era a paixão que a morte lhe despertava. A sua rede de correspondentes e informadores avisava-o sempre que se perspectivava ou constatava uma morte com carácter peculiar. Adorava assistir a execuções, enterros, ou, simplesmente, a pessoas expirando, tranquilamente, no leito. Não se sabe em que grau a sexualidade interviria nesta minoritária modalidade de excitação e não parece que qualquer pendor sádico possa ser diagnosticado, porque delirava igualmente com os tormentos mais terrífcos ou com os mais pacíficos dos passamentos.
Além de uma língua temida por todos, era dono de um certo sentido de humor. Tendo sido distinguido com um local privilegiado para testemunhar a crudelíssima execução de Damien, o frustrado assassino de Luís XV, por se tratar de um conhecedor, num tempo em que a tentativa de assassinato de um Rei suscitava tal horror reactivo, foi-lhe perguntado, por um dos auxiliares da cerimónia, se era ele o carrasco. Ao que respondeu «Não, Monsieur. Não tenho essa honra. Não sou mais do que um amador».
O seu grande amigo Lord Holland, agonizante, conseguiu, nos últimos momentos, dar ao mordomo a instrução seguinte: «Da próxima vez que Mr. Selwin perguntar por mim, tragam-no ao meu quarto. Se eu estiver vivo terei muito prazer em vê-lo; se já estiver morto, ele terá muito prazer em ver-me.». Mas uma figura como já não há.
Comprei este para mim desconhecido livro, do qual apenas já li 56 das 269 páginas. O Autor parece partir de posição bastante crítica. Importa reter estas palavras, aplicadas ao tema do livro, mas estendida expressamente aos restantes centros de poder discretos:
«Les dictatures occultes sont les plus odieuses, car elles n´ont pas la franchise de leur responsabilité; elles ont alors toutes les audaces puisqu´elles demeurent impunies et que leur pouvoir les protège mieux que n´importe quel faisceau noir, brun ou rouge. Elles ne peuvent exister d´ailleurs qu´en democratie.».
Quando acabar o livro darei mais notícia dele.
Celebrizado por Schopenhauer, mas conhecido desde a Grécia Antiga, encontra-se muito espalhado o reconhecimento da superioridade dos animais irracionais sobre os seus colegas humanos. Ora, o que em muito pessimista vem do puro desgosto, é preferência naturalíssima noutros, como a satirizada por um prisioneiro de guerra francês, nos princípios do Século XIX, sobre a hierarquia de afectos familiares de um aristocrata britânico.
Na morte de Alida Vali, ouso contestar o relevo que tem sido dado no Mundo anglo-americano ao seu protagonismo em «O TERCEIRO HOMEM», de Carol Reed. Se é certo que ia bem nessa fita notável, estava longe de nela ter o protagonismo que a imortalizou no papel da Condessa Serpieri, em «SENSO», de Visconti. Nunca a traição teve quem melhor a encarnasse, como autora, no plano nacional, contra os seus; e como vítima, no passional, humilhada e preterida por aquele que a levara a descer aos Infernos do Crime.
Manhã perdida para a blogação, por renitência do Blogger de «O Misantropo Enjaulado» em cumprir o seu dever. Almoço e tarde passeando por Lisboa em Maravilhosa Companhia. No fim, ainda tempo para encontrar num Grande Alfarrabista esta gravura setecentista de qualidade mais do que aceitável, dando testemunho do carácter atrabiliário que Alguns Amigos celebrizaram. Melancolia e livros, parelha ideal para o autor, boca amordaçada, desejabilidade para Os que o conhecem bem. E no Século XVIII não havia blogosfera...
O do Dragão, certamente. Penso no Nonas, no Nelson, no Fernando Carvalho, no TSantos... O day after da conquista do título calha a 23 de Abril... Dia de São Jorge, que teve encontro imediato nem sei já de que grau com o réptil alado. Juro, a pés juntos, que não me estou a meter com o nosso Colega do Dragoscópio. Só quero deixar aqui as minhas felicitações à Espécie animal que se pretendia extinta, pedindo-lhes perdão por não deixar de invocar o Santo que é o Padroeiro de Inglaterra desde o reinado de Eduardo III. E de Lhes sugerir que vivam com os olhos postos no dia de ontem e não no de hoje.
Abraços com a chama do lampião, que não a que se deita pela boca. O quadro alusivo é de Rafael.
A designação precursora do Domingo de Pascoela, o primeiro após o da Páscoa, tinha origem no antigo hábito de ser neste dia que os baptizados da Festa Maior largavam as vestes brancas que usavam durante uma semana também sagrada, em que até os escravos eram poupados ao trabalho duro. Tempo pois da renovação humana por excelência, após o Sacrifício Divino que culminara a Nova Aliança. Mas este Dia, também designado por Quasimodo, a partir das palavras litúrgicas, foi também ocasião para a mais célebre das dúvidas. A de São Tomé, cuja exigência de tocar a Chaga aqui se deixa, segundo Caravaggio. Dia profundamente humano pois, quer no repensar, quer na força da Fé, fontes para meditarmos a nossa condição e a nossa relação com a Sagrada Mensagem.
o Lotus Dourado, resultado da atrofia do crescimento dos pés das Mulheres das classes altas da China, o qual, originado no princípio da Dinastia Song pela preferência de um Imperador que gostava de Raparigas de pé pequeno, desencadeou uma moda que durou mais de mil anos. A peça, publicada no Número 24 (II Série) da «REVISTA DE CULTURA» do Instituto Cultural de Macau,oferece um interessante confronto entre a prática ainda largamente subsistente no Séc. XIX e a indumentária oitocentista das ocidentais, assente na utilização do espartilho. É curioso ver o horror de uma Imperatriz do Meio face a esse "costume bárbaro" que não deixaria a apertada vítima respirar, contraposto à tentativa revoltada de um casal anglo-saxónico de impedir uma vizinha china de mutilar os pés da filha de poucos anos que ia urrando de dor ao ser enfaixada, perante a reacção indignada da mãe, que sabia ser esse o meio mais eficiente de furtá-la à condição servil.
O que mais retive, por muito estranho que o aperto corporal me surja, foi a desfaçatez com que, não sentindo horror por uma alteração da natureza, de deformação certa, com quebras internas, se condenava um traço da outra cultura, que, mesmo reprovado, nos parece relativamente benigno. Conta a velha história que quando saiu o édito prescrevendo a morte para todos os animais de boca grande, o hipopótamo também comprimiu a sua o mais que conseguiu, dizendo: «coitadinho do crocodilo».
As imagens são dos sapatinhos que cobriam os pés submetidos à estagnação, com a evidência da respectiva pequenês. e do que eles envolviam, com realce para o tipo de deformação a que obrigavam.
Bo Derek foi nomeada, no seu País, Advogada do Governo para a Vida Selvagem. Se demonstrar pelos animais em liberdade condicionada o mesmo amor que tem alardeado por cavalos e cães, temos Mulher. Mas os Fans, em cujo número me não incluo, dirão que esse é estatuto mais do que adquirido. De qualquer forma, o meu primeiro pensamento vai para a felicidade dos bichos... como a ilustrada na fotografia.
O misantropo conseguiu fugir da cela onde exerce o seu vício internáutico, para assistir à conferência de logo, que será moderada por Esta Grande Blogger. Estou certo de que Ela o fará às mil maravilhas, como tudo em que toca. Mas numa coisa está antecipadamente Fracassada: em conseguir alguma moderação da parte deste admirador incondicional, agora à solta.