Thursday, June 30, 2005
A Derme Hipersensível
Os defensores das liberdades inividuais no Reino
Unido andam a dizer do Sr. Blair aquilo que Mafoma
não ousou dizer do presunto, por, finalmente, ter sido
instituída em terras de Sua Majestade a obrigatoriedade
de um documento e identificação. Fala-se de abuso de
poder por parte do Estado, atropelos aos direitos de
cada um e criação de um estado Big Brother. Que sentido
faz isto para um continental, maxime um português, seja
por ser portador de uma pele pouco menos que paquidérmica,
seja por ela andar tremendamente calejada dos açoites
imemoriais?
Unido andam a dizer do Sr. Blair aquilo que Mafoma
não ousou dizer do presunto, por, finalmente, ter sido
instituída em terras de Sua Majestade a obrigatoriedade
de um documento e identificação. Fala-se de abuso de
poder por parte do Estado, atropelos aos direitos de
cada um e criação de um estado Big Brother. Que sentido
faz isto para um continental, maxime um português, seja
por ser portador de uma pele pouco menos que paquidérmica,
seja por ela andar tremendamente calejada dos açoites
imemoriais?
Da Filifagia Televisiva
Vivemos tempos em que os cargos políticos são
abominavelmente preenchidos pelas pessoas que
as televisões fazem entrar pelas nossas casas
adentro, por vezes sem qualquer conexão curricular
à intervenção no debate da Coisa Pública. Foi nesta
onda que Sintra ganhou dois Presidentes de Cãmara,
uma ex-apresentadora de um programa sobre a Língua
Portuguesa e um comentador desportivo.
Noutro plano, o do debate tipo crossfire, os dois mais
recentes Chefes de Governo deveram a foguetesca ascensão
à performance televisiva que, semanalmente, a T.V. nos
trazia e em que se enfrentavam. A previsibilidade dos seus
futuros era tal que, meses antes de se colocar a sério a
hipótese de qualquer deles ter a responsabilidade máxima
pela governação do País, foram ambos levados pela mão do
Dr. Balsemão a reuniões de um semi-secreto forum internacional
de que faz parte.
E nisto surge uma nova que me respeita directamente. O que
sobrou do P.P.M. resolveu apresentar como candidata à Câmara de
Cascais, concelho onde sou munícipe, a ex-vedeta televisiva Elsa
Raposo. Nada tenho contra a Senhora e não creio que venha a ser
um factor. Mas, para evitar depressões pós-eleitorais, aconselho-a
a que não se meta nisso. Pelo que se viu com Santana e se começa
a ver com o tratamento televisivo de Sócrates, o divertimento
máximo dos nossos canais audiovisuais vai sendo o de devorar com
alegria e prontidão os ídolos que inventaram na véspera, para os
poderem substituir por novas criações.
abominavelmente preenchidos pelas pessoas que
as televisões fazem entrar pelas nossas casas
adentro, por vezes sem qualquer conexão curricular
à intervenção no debate da Coisa Pública. Foi nesta
onda que Sintra ganhou dois Presidentes de Cãmara,
uma ex-apresentadora de um programa sobre a Língua
Portuguesa e um comentador desportivo.
Noutro plano, o do debate tipo crossfire, os dois mais
recentes Chefes de Governo deveram a foguetesca ascensão
à performance televisiva que, semanalmente, a T.V. nos
trazia e em que se enfrentavam. A previsibilidade dos seus
futuros era tal que, meses antes de se colocar a sério a
hipótese de qualquer deles ter a responsabilidade máxima
pela governação do País, foram ambos levados pela mão do
Dr. Balsemão a reuniões de um semi-secreto forum internacional
de que faz parte.
E nisto surge uma nova que me respeita directamente. O que
sobrou do P.P.M. resolveu apresentar como candidata à Câmara de
Cascais, concelho onde sou munícipe, a ex-vedeta televisiva Elsa
Raposo. Nada tenho contra a Senhora e não creio que venha a ser
um factor. Mas, para evitar depressões pós-eleitorais, aconselho-a
a que não se meta nisso. Pelo que se viu com Santana e se começa
a ver com o tratamento televisivo de Sócrates, o divertimento
máximo dos nossos canais audiovisuais vai sendo o de devorar com
alegria e prontidão os ídolos que inventaram na véspera, para os
poderem substituir por novas criações.
O Objecto do Arquivamento
Revela o Diário de Notícas de hoje que o Dr. Isaltino
de Morais, interrogado acerca da decisão que o veio a
constituir como arguido no Processo da conta da Suíça
não declarada no Tribunal Constitucional, declarou que
esperava que fosse «um passo apenas para o arquivamento
do processo». Cada um é livre de ter as esperanças que
quer. Mas a constituição de alguém como Arguido não é o
passo idóneo para esse objectivo. Ela tem lugar quando
se apura haver indícios suficientes para acusar,ou pode,
em certos casos, visar a própria protecção do averiguado,
na medida em que estenda os meios de defesa ao seu dispor.
Para arquivar é que não é tida nem achada.
Ou por outra, talvez seja essencial a um arquivamento muito
mais desejável - o da carreira política do Dr. Isaltino.
de Morais, interrogado acerca da decisão que o veio a
constituir como arguido no Processo da conta da Suíça
não declarada no Tribunal Constitucional, declarou que
esperava que fosse «um passo apenas para o arquivamento
do processo». Cada um é livre de ter as esperanças que
quer. Mas a constituição de alguém como Arguido não é o
passo idóneo para esse objectivo. Ela tem lugar quando
se apura haver indícios suficientes para acusar,ou pode,
em certos casos, visar a própria protecção do averiguado,
na medida em que estenda os meios de defesa ao seu dispor.
Para arquivar é que não é tida nem achada.
Ou por outra, talvez seja essencial a um arquivamento muito
mais desejável - o da carreira política do Dr. Isaltino.
Leitura Matinal -42
Hoje, pela primeira e, espero que última vez, trago
um poema de Autor que não aprecio. Refiro-me a
Almeida Garrett e esta transigência fica a dever-se
ao facto de, apesar de tudo, no interesse cultural do
País, me congratular com a suspensão da demolição
da casa de Campo de Ourique em que o Poeta viveu.
Tentando tirar qualquer coisa dos versos escolhidos,
sempre direi que, mais do que concluir que a extrema e
sólida irredutibiliddade também tem um preço, se deve
notar que, levantando a guarda, qualquer um se vê atreito
à quebra da coerência.
Ou como, entre as Altas Aspirações e as agradáveis tentações,
não se pode ter tudo na vida:
AS MINHAS ASAS
Eu tinha umas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Que, em me eu cansando da Terra,
Batia-as, voava ao céu.
- Eram brancas, brancas, brancas,
Como as do anjo que mas deu:
Eu inocente como elas,
Por isso voava ao céu.
Veio a cobiça da Terra,
Vinha para me tentar;
Por seus montes de tesouros
Minhas asas não quis dar.
- Veio a ambição, coas grandezas,
Vinham para mas cortar,
Davam-me poder e glória;
Por nenhum preço as quis dar.
Porque as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Em me eu cansando da Terra,
Batia-as, voava ao céu.
Mas uma noite sem Lua
Que eu contemplava as estrelas,
E já suspenso da Terra
Ia voar para elas,
- Deixei descair os olhos
Do céu alto e das estrelas...
Vi, entre a névoa da Terra,
Outra luz mais bela que elas.
E as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Para a Terra me pesavam,
já não se erguiam ao céu.
Cegou-me essa luz funesta
De enfeitiçados amores...
Fatal amor, negra hora
Foi aquela hora de dores!
- Tudo perdi nessa hora
Que provei nos seus amores
O doce fel do deleite,
O acre prazer das dores.
E as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Pena a pena, me caíram...
Nunca mais voei ao céu.
um poema de Autor que não aprecio. Refiro-me a
Almeida Garrett e esta transigência fica a dever-se
ao facto de, apesar de tudo, no interesse cultural do
País, me congratular com a suspensão da demolição
da casa de Campo de Ourique em que o Poeta viveu.
Tentando tirar qualquer coisa dos versos escolhidos,
sempre direi que, mais do que concluir que a extrema e
sólida irredutibiliddade também tem um preço, se deve
notar que, levantando a guarda, qualquer um se vê atreito
à quebra da coerência.
Ou como, entre as Altas Aspirações e as agradáveis tentações,
não se pode ter tudo na vida:
AS MINHAS ASAS
Eu tinha umas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Que, em me eu cansando da Terra,
Batia-as, voava ao céu.
- Eram brancas, brancas, brancas,
Como as do anjo que mas deu:
Eu inocente como elas,
Por isso voava ao céu.
Veio a cobiça da Terra,
Vinha para me tentar;
Por seus montes de tesouros
Minhas asas não quis dar.
- Veio a ambição, coas grandezas,
Vinham para mas cortar,
Davam-me poder e glória;
Por nenhum preço as quis dar.
Porque as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Em me eu cansando da Terra,
Batia-as, voava ao céu.
Mas uma noite sem Lua
Que eu contemplava as estrelas,
E já suspenso da Terra
Ia voar para elas,
- Deixei descair os olhos
Do céu alto e das estrelas...
Vi, entre a névoa da Terra,
Outra luz mais bela que elas.
E as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Para a Terra me pesavam,
já não se erguiam ao céu.
Cegou-me essa luz funesta
De enfeitiçados amores...
Fatal amor, negra hora
Foi aquela hora de dores!
- Tudo perdi nessa hora
Que provei nos seus amores
O doce fel do deleite,
O acre prazer das dores.
E as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Pena a pena, me caíram...
Nunca mais voei ao céu.
Wednesday, June 29, 2005
Uma Biografia Única
Corre nos bastidores de Washington que um dos nove
vitalícios Juízes do Supremo Tribunal Federal pode
anunciar, nesta semana, a retirada. Dois nomes são
mais referenciados, como agora se diz: o da primeira
mulher a sentar-se naquela Alta Instância - Sandra
Day O´Connor e o do próprio presidente dela, o Chief
Justice Rehnquist, que sofre de cancro na tiróide.
É este último, o único dos actuais ocupantes que não
tinha experiência prévia como juiz, que se impõe pela
biografia ímpar que ostenta. Presidiu ao julgamento de
um Presidente - Clinton -, apenas o segundo na história
nacional, e formulou o sufrágio decisivo na tangencial
votação de 5-4 que acabou por terminar a disputa eleitoral
e judiciária entre Bush e Gore.
Para além das razões habituais de solidariedade com um ser
humano atacado pela doença, aqui fica o voto de que tenha
tempo de escrever umas memórias que versariam sobre um incrível
conjunto de eventos históricos.
vitalícios Juízes do Supremo Tribunal Federal pode
anunciar, nesta semana, a retirada. Dois nomes são
mais referenciados, como agora se diz: o da primeira
mulher a sentar-se naquela Alta Instância - Sandra
Day O´Connor e o do próprio presidente dela, o Chief
Justice Rehnquist, que sofre de cancro na tiróide.
É este último, o único dos actuais ocupantes que não
tinha experiência prévia como juiz, que se impõe pela
biografia ímpar que ostenta. Presidiu ao julgamento de
um Presidente - Clinton -, apenas o segundo na história
nacional, e formulou o sufrágio decisivo na tangencial
votação de 5-4 que acabou por terminar a disputa eleitoral
e judiciária entre Bush e Gore.
Para além das razões habituais de solidariedade com um ser
humano atacado pela doença, aqui fica o voto de que tenha
tempo de escrever umas memórias que versariam sobre um incrível
conjunto de eventos históricos.
O Monopólio da (im)Parcialidade
Veio mais um advogado do Sr. Carlos Cruz na lamentável saga
«Casa Pia» produzir mais uma declaração desastrosa. Desta vez
foi o Dr. Ricardo Sá Fernandes que resolveu defender, «para
permitir uma cobertura mais isenta e imparcial» do julgamento,
a nomeação de um jornalista profissional que fosse assegurando
o noticiário do juízo, enquanto durasse a inquirição das testemunhas.
Não entende o ilustre causídico que, nesta questão de coberturas
judiciais, tem o ponto de partida de assentar numa regra de todos ou
nada. Ou está aberta aos vários orgãos de comunicação social ou a
nenhum. Não pode haver favorecimentos ou conceber, artificialmente,
um jornalista de angélica independência.
E a posição do advogado referido pode, nos espíritos mais cépticos,
gerar uma subreptícia suspeita: a de que ele já teria pensado num
nome para a função. E isso mata! A justiça, até na autorização das
reportagens e acompanhamentos afins, tem de ser como a Mulher de
César.
«Casa Pia» produzir mais uma declaração desastrosa. Desta vez
foi o Dr. Ricardo Sá Fernandes que resolveu defender, «para
permitir uma cobertura mais isenta e imparcial» do julgamento,
a nomeação de um jornalista profissional que fosse assegurando
o noticiário do juízo, enquanto durasse a inquirição das testemunhas.
Não entende o ilustre causídico que, nesta questão de coberturas
judiciais, tem o ponto de partida de assentar numa regra de todos ou
nada. Ou está aberta aos vários orgãos de comunicação social ou a
nenhum. Não pode haver favorecimentos ou conceber, artificialmente,
um jornalista de angélica independência.
E a posição do advogado referido pode, nos espíritos mais cépticos,
gerar uma subreptícia suspeita: a de que ele já teria pensado num
nome para a função. E isso mata! A justiça, até na autorização das
reportagens e acompanhamentos afins, tem de ser como a Mulher de
César.
Dos Assessores de Imagem Celestiais
Lê-se no Abrupto de hoje: «...Deus, que tem o melhor gabinete de
relações públicas do universo...». É possível; mas essa considerável
vantagem é muito contrabalançada pela pésssima imprensa que, hoje
em dia, vai tendo, talvez porque não dê muitas conferências em que
apaparique os jornalistas...
relações públicas do universo...». É possível; mas essa considerável
vantagem é muito contrabalançada pela pésssima imprensa que, hoje
em dia, vai tendo, talvez porque não dê muitas conferências em que
apaparique os jornalistas...
Leitura Matinal -41
Dante Gabriel Rossetti sabia-a toda.
Ora vejam:
VAIN VIRTUES
What is the sorriest thing that enters Hell?
None of the sins,-but this and that fair deed
Which a soul sin at lenght could supersede.
These yet are virgins, whom death´s timely knell
Might once have sainted; whom the fiends compel
Together now, in snake-bound shuddering sheaves
Of anguish, while the scorching bridegroom leaves
Their refuse maidenhood abominable.
Night sucks them down, the garbage of the pit,
Whose names, half entered in the book of Life,
Were God's desire at noon. And their hair
And eyes sink last, the Torturer designs no whit
To gaze, but, yearning, waits his worthier wife,
The Sin still blithe on earth that sent them there.
Ora vejam:
VAIN VIRTUES
What is the sorriest thing that enters Hell?
None of the sins,-but this and that fair deed
Which a soul sin at lenght could supersede.
These yet are virgins, whom death´s timely knell
Might once have sainted; whom the fiends compel
Together now, in snake-bound shuddering sheaves
Of anguish, while the scorching bridegroom leaves
Their refuse maidenhood abominable.
Night sucks them down, the garbage of the pit,
Whose names, half entered in the book of Life,
Were God's desire at noon. And their hair
And eyes sink last, the Torturer designs no whit
To gaze, but, yearning, waits his worthier wife,
The Sin still blithe on earth that sent them there.
Tuesday, June 28, 2005
A ONU Fez 60 Anos
Não se pode dizer que tenha envelhecido bem. Lembro-me
de, uns anos atrás, ter assistido a uma conferência do
Prof. Adriano Moreira em que o orador disse ter sempre
defendido, mesmo noutros tempos, a existência das Nações
Unidas, pois, funcionando como instância de acreditação,
consistia na única forma que algumas nações possuíam de
promover regularmente contactos junto de países com quem
não tivessem relações diplomáticas estabelecidas.
Pode ser. Mas tendo sido o seu principal objectivo a efectivação
de um sistema de segurança nas relações internacionais,
justo é reconhecer um lamentável falhanço. Não recordando já
a ficção de aceitar como membros estados na altura não-soberanos,
como algumas repúblicas soviéticas federadas, os fortes sempre
passaram muito bem ao lado das condenações onuescas, ou agiram à
sua revelia, como inda há pouco se viu no Iraque. O cúmulo que
ilustra a asserção ocorreu no começo da invasão do Líbano por
Israel, nos anos 80´s, em que os capacetes azuis da força de
paz das Nações Unidas não acharam melhor para fazer do que anotar
os números das matrículas dos carros militares israelitas que,
calmamente, atravessavam a fronteira.
Durante muito tempo a coroa de glória da intervenção da ONU foi
a actuação no Katanga. Quem se quiser desenganar acerca do mérito
dela pode ler a parte correspondente de «Mr. Brown», autobiografia
do aviador mercenário Jean Zumbach.
De resto, enquanto o mundo foi bipolar, o veto dos membros
permanentes do Conselho de Segurança paralisava tudo. E era difícil
encontrar uma pulga que se não fizesse a um amigo poderoso
para abichar o radical voto contra.
Por fim, a integração das potências vencidas: Ainda não foi dada ao
Japão e à Alemanha a alforria do reconhecimento como membros
permanentes do Conselho. Os próprios também se não mostravam
interessados em obter esse estatuto, no que a consequências práticas
concerne. Só recentemente, muito a custo e limitadamente, modificaram
as respectivas legislações nacionais, de modo a permitirem a deslocação
de tropas suas para outros territórios em missões internacionais.
Que diferença para a Santa Aliança do genial Metternich, onde o vencido
da véspera, a França, graças à maleabilidade diplomática de Talleyrand,
foi logo aceite, tendo prontamente protagonizado a primeira intervenção
difícil do sistema, em Espanha.
Por essas e outras nada de parabéns, a propósito desta efeméride.
de, uns anos atrás, ter assistido a uma conferência do
Prof. Adriano Moreira em que o orador disse ter sempre
defendido, mesmo noutros tempos, a existência das Nações
Unidas, pois, funcionando como instância de acreditação,
consistia na única forma que algumas nações possuíam de
promover regularmente contactos junto de países com quem
não tivessem relações diplomáticas estabelecidas.
Pode ser. Mas tendo sido o seu principal objectivo a efectivação
de um sistema de segurança nas relações internacionais,
justo é reconhecer um lamentável falhanço. Não recordando já
a ficção de aceitar como membros estados na altura não-soberanos,
como algumas repúblicas soviéticas federadas, os fortes sempre
passaram muito bem ao lado das condenações onuescas, ou agiram à
sua revelia, como inda há pouco se viu no Iraque. O cúmulo que
ilustra a asserção ocorreu no começo da invasão do Líbano por
Israel, nos anos 80´s, em que os capacetes azuis da força de
paz das Nações Unidas não acharam melhor para fazer do que anotar
os números das matrículas dos carros militares israelitas que,
calmamente, atravessavam a fronteira.
Durante muito tempo a coroa de glória da intervenção da ONU foi
a actuação no Katanga. Quem se quiser desenganar acerca do mérito
dela pode ler a parte correspondente de «Mr. Brown», autobiografia
do aviador mercenário Jean Zumbach.
De resto, enquanto o mundo foi bipolar, o veto dos membros
permanentes do Conselho de Segurança paralisava tudo. E era difícil
encontrar uma pulga que se não fizesse a um amigo poderoso
para abichar o radical voto contra.
Por fim, a integração das potências vencidas: Ainda não foi dada ao
Japão e à Alemanha a alforria do reconhecimento como membros
permanentes do Conselho. Os próprios também se não mostravam
interessados em obter esse estatuto, no que a consequências práticas
concerne. Só recentemente, muito a custo e limitadamente, modificaram
as respectivas legislações nacionais, de modo a permitirem a deslocação
de tropas suas para outros territórios em missões internacionais.
Que diferença para a Santa Aliança do genial Metternich, onde o vencido
da véspera, a França, graças à maleabilidade diplomática de Talleyrand,
foi logo aceite, tendo prontamente protagonizado a primeira intervenção
difícil do sistema, em Espanha.
Por essas e outras nada de parabéns, a propósito desta efeméride.
Leitura Matinal -40
Muito mais revoltado que o Misantropo, decerto
menos pessimista que ele, na medida em que chegou
à desilusão e, de alguma forma, inculca a noção do Fim
como alívio, escrevia, no final da Idade Média, Jorge
Manrique:
OH, MUNDO! PUES QUE NOS MATAS...
1
Oh, mundo! Pues que nos matas,
fuera la vida que diste
toda vida;
mas segun acá nos tratas,
lo mejor y menos triste
es la partida
de tu vida, tan cobierta
de tristezas y dolores,
despoblada;
de los bienes tan desierta,
de plazeres y dulzores
despojada.
2
Es tu comienzo lloroso,
tu salida siempre amarga
y nunca buena,
lo de en medio trabajoso,
y a quien das vida más larga
le das pena.
Asi los bienes - muriendo
y con sudor - se procuran
y los das;
los males vienen coriendo;
después de venidos, duran
mucho más.
menos pessimista que ele, na medida em que chegou
à desilusão e, de alguma forma, inculca a noção do Fim
como alívio, escrevia, no final da Idade Média, Jorge
Manrique:
OH, MUNDO! PUES QUE NOS MATAS...
1
Oh, mundo! Pues que nos matas,
fuera la vida que diste
toda vida;
mas segun acá nos tratas,
lo mejor y menos triste
es la partida
de tu vida, tan cobierta
de tristezas y dolores,
despoblada;
de los bienes tan desierta,
de plazeres y dulzores
despojada.
2
Es tu comienzo lloroso,
tu salida siempre amarga
y nunca buena,
lo de en medio trabajoso,
y a quien das vida más larga
le das pena.
Asi los bienes - muriendo
y con sudor - se procuran
y los das;
los males vienen coriendo;
después de venidos, duran
mucho más.
Downgrading
A imagem anteriormente dada aos vossos olhos é-o em homenagem
ao Leitor que, no comentário feito no dia 23 do corrente,
se insurgiu contra a reprodução da obra de Arcimboldo então
publicada. Como vê, pode-se sempre descer mais...
Na mira de não afastar as Leitoras, tinha na ideia assumir o
compromisso de não colocar a fotografia aqui ao lado. Um
telefonema acaba de mo proibir. Paciência!
ao Leitor que, no comentário feito no dia 23 do corrente,
se insurgiu contra a reprodução da obra de Arcimboldo então
publicada. Como vê, pode-se sempre descer mais...
Na mira de não afastar as Leitoras, tinha na ideia assumir o
compromisso de não colocar a fotografia aqui ao lado. Um
telefonema acaba de mo proibir. Paciência!
Monday, June 27, 2005
Pause
Garantiu o Coordenador da campanha autárquica do P. S.,
Jorge Coelho, que a pausa que o Prof. Carrilho decidiu
imprimir à sua propria actividade de propaganda não iria
levantar qualquer problema ou controvérsia. Descansados
com esta certeza de a atitude referida não desagradar a
quem quer que seja, ousamos propor, por motivos de higiene
cívica, que essa paragem adquira, sem retrocesso, o carácter
permanente.
Jorge Coelho, que a pausa que o Prof. Carrilho decidiu
imprimir à sua propria actividade de propaganda não iria
levantar qualquer problema ou controvérsia. Descansados
com esta certeza de a atitude referida não desagradar a
quem quer que seja, ousamos propor, por motivos de higiene
cívica, que essa paragem adquira, sem retrocesso, o carácter
permanente.
Impróprio Para Consumo
A organização de agricultores finlandeses MTK decidiu
apelar ao boicote às importações italianas no campo da
alimentação, na sequência das declarações de Berlusconi,
ao festejar a escolha de Parma como sede da Autoridade
Europeia para a Segurança nos Alimentos, em prejuízo de
uma cidade finlandesa. Disse o dono do A. C. Milan ao seu
amigalhaço José Barroso que, com esta opção, «ele estava a
degustar o belo presunto italiano em lugar da rena fumada»
que os nórdicos poderiam oferecer. E prosseguiu, acrescentando
que tivera de usar os seus charmes de Ladies´ man junto da
Presidente da Finlândia para alcançar aquele (e)feito.
O que vale é que o Primeiro-Ministro italiano, intragável como
é, constitui, de longe, o pior dos produtos daquele belo país
provenientes.
apelar ao boicote às importações italianas no campo da
alimentação, na sequência das declarações de Berlusconi,
ao festejar a escolha de Parma como sede da Autoridade
Europeia para a Segurança nos Alimentos, em prejuízo de
uma cidade finlandesa. Disse o dono do A. C. Milan ao seu
amigalhaço José Barroso que, com esta opção, «ele estava a
degustar o belo presunto italiano em lugar da rena fumada»
que os nórdicos poderiam oferecer. E prosseguiu, acrescentando
que tivera de usar os seus charmes de Ladies´ man junto da
Presidente da Finlândia para alcançar aquele (e)feito.
O que vale é que o Primeiro-Ministro italiano, intragável como
é, constitui, de longe, o pior dos produtos daquele belo país
provenientes.
Bóia de Salvamento Furada
O ainda Chanceler Schroeder, patentemente incapaz quer
na política interna, quer na comunitária, virou-se uma
vez mais para as relações com os Estados Unidos, na mira
de reencontrar a tábua a que se agarre e que, como há três
anos, lhe faculte a reeleição. Nessa altura lançou-se de
cabeça no compromisso de oposição à guerra do Iraque e
salvou-de in extremis. Desta, resolveu pleitear a causa
da reforma da ONU, com o alargamento do Conselho de Segurança
e a promoção da Alemanha a membro permanente.
O azar é estar do outro lado do Atlântico uma administração
que já demonstrou ter memória de quem são os seus amigos e,
como Roma, não perdoar aos traidores. Que o diga o Sr. Zapatero,
que conheceu a humilhação de meses e meses à espera de que fosse
atendida uma qualquer chamada telefónica da sua parte.
E como quem não quer coisa, o Departamento de Estado americano
já foi dizendo que se opõe às mudanças, apoiando unicamente
a ascensão do Japão à condição pretendida pelos alemães. Como
o Império do Sol Nascente também foi vencido na 2ª Guerra Mundial,
nem pode ser essa a desculpa...
na política interna, quer na comunitária, virou-se uma
vez mais para as relações com os Estados Unidos, na mira
de reencontrar a tábua a que se agarre e que, como há três
anos, lhe faculte a reeleição. Nessa altura lançou-se de
cabeça no compromisso de oposição à guerra do Iraque e
salvou-de in extremis. Desta, resolveu pleitear a causa
da reforma da ONU, com o alargamento do Conselho de Segurança
e a promoção da Alemanha a membro permanente.
O azar é estar do outro lado do Atlântico uma administração
que já demonstrou ter memória de quem são os seus amigos e,
como Roma, não perdoar aos traidores. Que o diga o Sr. Zapatero,
que conheceu a humilhação de meses e meses à espera de que fosse
atendida uma qualquer chamada telefónica da sua parte.
E como quem não quer coisa, o Departamento de Estado americano
já foi dizendo que se opõe às mudanças, apoiando unicamente
a ascensão do Japão à condição pretendida pelos alemães. Como
o Império do Sol Nascente também foi vencido na 2ª Guerra Mundial,
nem pode ser essa a desculpa...
Leitura Matinal -39
Numa feirazita de velharias que costumo frequentar aos Domingos
encontrei ontem um exemplar do «Anel de Sete Pedras», de Natércia
Freire. Passando por lá os olhos, detive-me num poema que pode bem
constituir mais uma achega na ilustração das relações entre o Sujeito
e o Mundo, bem assim como das suas restrições, físicas ou emotivas.
Os versos são bons:
O SILÊNCIO DO MUNDO
Entorno os olhos numa luz sem estrada
e resgato de névoas o meu espanto.
O silêncio do Mundo cresce em asas
e o momento de agora não tem som.
É transparente a esfera em que flutuo
e leve e azul como a paixão da lua.
Contorno os montes altos no perfil
da claridade azul que me flutua.
Não sou de luz e queixo-me da Terra.
De mim e em mim, a queixa ganha altura.
Cantigas de ontem! Era o rio, o vento,
e as águas me enlevam de verdura.
Canto de cega pela noite fora
e sei ouvir as vozes dos romeiros.
A casa é mesmo à beira do caminho
e os ecos dobram sons dias inteiros.
Quando encosto o ouvido ao pó do chão
o rumor cresce. - Eh remos! Eh nortadas!
Rasguem de longe os vossos nevoeiros!
Saibam todos que as portas estão fechadas!
Fechadas, sim! Que as fechei eu, sincera,
com dedos nús de pó e solidão.
Por isso este silêncio! Esta lonjura
ao espaço aberto! Este ruir assim!
Por isso, estrêlas: basta de promessas
aos quatro pontos cardeais de mim!
encontrei ontem um exemplar do «Anel de Sete Pedras», de Natércia
Freire. Passando por lá os olhos, detive-me num poema que pode bem
constituir mais uma achega na ilustração das relações entre o Sujeito
e o Mundo, bem assim como das suas restrições, físicas ou emotivas.
Os versos são bons:
O SILÊNCIO DO MUNDO
Entorno os olhos numa luz sem estrada
e resgato de névoas o meu espanto.
O silêncio do Mundo cresce em asas
e o momento de agora não tem som.
É transparente a esfera em que flutuo
e leve e azul como a paixão da lua.
Contorno os montes altos no perfil
da claridade azul que me flutua.
Não sou de luz e queixo-me da Terra.
De mim e em mim, a queixa ganha altura.
Cantigas de ontem! Era o rio, o vento,
e as águas me enlevam de verdura.
Canto de cega pela noite fora
e sei ouvir as vozes dos romeiros.
A casa é mesmo à beira do caminho
e os ecos dobram sons dias inteiros.
Quando encosto o ouvido ao pó do chão
o rumor cresce. - Eh remos! Eh nortadas!
Rasguem de longe os vossos nevoeiros!
Saibam todos que as portas estão fechadas!
Fechadas, sim! Que as fechei eu, sincera,
com dedos nús de pó e solidão.
Por isso este silêncio! Esta lonjura
ao espaço aberto! Este ruir assim!
Por isso, estrêlas: basta de promessas
aos quatro pontos cardeais de mim!
Sunday, June 26, 2005
Ai, Este Vocabulário!
Entrevistada perante o olhar embevecido da parceira, uma
das desfilantes que poclamavam o seu orgulho, na manifestação
homo, declarou que a família da outra «era muito evoluída e, por
isso, acabara por compreender e aprovar a relação» de ambas.
Evoluída, Aprovar? Compreender?
Quero alistar-me imediatamente nas fileiras da involução! E com um
dicionário ao lado.
das desfilantes que poclamavam o seu orgulho, na manifestação
homo, declarou que a família da outra «era muito evoluída e, por
isso, acabara por compreender e aprovar a relação» de ambas.
Evoluída, Aprovar? Compreender?
Quero alistar-me imediatamente nas fileiras da involução! E com um
dicionário ao lado.
Revelação
Recorda o leitor o meu post de ontem, onde dava
conta da nudificação dos nus estatuários da Procuradoria-
-Geral dos E. U. A.? Bem, conhecendo há muito os contornos
gerais do triste episódio que acabou de conhecer o seu termo,
só hoje fiquei a par do que simbolizavam as ditas esculturas
(des)cobertas: O «Espírito de Justiça» e a «Majestade da Lei».
Como nos poderemos admirar dos tratos de polé que estes valores
têm sofrido às mãos dessa ex-colónia inglesa?
conta da nudificação dos nus estatuários da Procuradoria-
-Geral dos E. U. A.? Bem, conhecendo há muito os contornos
gerais do triste episódio que acabou de conhecer o seu termo,
só hoje fiquei a par do que simbolizavam as ditas esculturas
(des)cobertas: O «Espírito de Justiça» e a «Majestade da Lei».
Como nos poderemos admirar dos tratos de polé que estes valores
têm sofrido às mãos dessa ex-colónia inglesa?
Leitura (pouco) Matinal -38
Quer o Misantropo continuar na senda da celebração
do Passado, já que aprendeu com Borges que ele é a
única coisa indestrutível. Claro que o grande poeta
argentino abstraiu de certos historiadores que a gente
sabe... e daí... talvez não. Ao campo do sucedido eles não
conseguem chegar, ficam-se pela tentativa de baralhar
o conhecido. Não se veja o gosto por esta evocação do
Pretérito como o vício que Maurras apontava ao romântico
Chateaubriand - de o prezar como os turistas gostam das
ruínas que visitam.
Leiamos, pois, de Mário Beirão:
A UM PERGAMINHO
-Oh velho pergaminho, em um recanto
De êrmo salão, onde saudades falam;
Das tuas letras góticas se exalam
Auroras, lendas, um perfume santo...
E o teu silêncio é belo como um canto
E o som das cordas que, ébrias de ais, estalam;
Ah, nem estrêlas, sóes, sequer, igualam
Do teu grave cismar o aceso espanto!
Na sala imensa, brilhas, esbraseado,
Por entre mudas sombras que te fitam,
Como chama votiva do Passado:
E, ao teu influxo, um mundo de lembranças
Levanta-se de Além... e, no ar, palpitam
Vozes de tubas, um tinir de lanças!
do Passado, já que aprendeu com Borges que ele é a
única coisa indestrutível. Claro que o grande poeta
argentino abstraiu de certos historiadores que a gente
sabe... e daí... talvez não. Ao campo do sucedido eles não
conseguem chegar, ficam-se pela tentativa de baralhar
o conhecido. Não se veja o gosto por esta evocação do
Pretérito como o vício que Maurras apontava ao romântico
Chateaubriand - de o prezar como os turistas gostam das
ruínas que visitam.
Leiamos, pois, de Mário Beirão:
A UM PERGAMINHO
-Oh velho pergaminho, em um recanto
De êrmo salão, onde saudades falam;
Das tuas letras góticas se exalam
Auroras, lendas, um perfume santo...
E o teu silêncio é belo como um canto
E o som das cordas que, ébrias de ais, estalam;
Ah, nem estrêlas, sóes, sequer, igualam
Do teu grave cismar o aceso espanto!
Na sala imensa, brilhas, esbraseado,
Por entre mudas sombras que te fitam,
Como chama votiva do Passado:
E, ao teu influxo, um mundo de lembranças
Levanta-se de Além... e, no ar, palpitam
Vozes de tubas, um tinir de lanças!
Saturday, June 25, 2005
Ultrabreves
* Notícia: «O Conselho de Ministros aprovou ontem o decreto
que extingue a Comissão Nacional de Luta Contra a Sida, que
será substituída pelo Alto Comissariado da Saúde». Claro que
o que importa é a eficácia da luta, todavia pergunto-me se
alguns activistas desta conviverão bem com a diluição num mais
abrangente anonimato. E, sem dados, cheira-me a muito desperdício
de dinheirinho.
* Notícia: «Os ginecologistas e os obstretas do sexo
masculino entre os 45 e os 65 anos são os médicos mais
acusados de assédio sexual no Brasil». Onde está a dúvida?
Se eles é que estão sempre com a mão na massa...
* Notícia: «O primeiro-ministro britânico, Tony Blair,
afirmou-se ontem em Bruxelas, Bélgica, um "europeísta apaixonado».
Cuidado, o seu ex-colega Guterres também confessou sentimento
igualmente elevado quanto à educação e, depois viu-se que
o que tinha em mente era puro gozo.
* Um passo para a perfeição - Notícia: «Elle McPherson acabou com o
namorado». Ainda há esperança!
que extingue a Comissão Nacional de Luta Contra a Sida, que
será substituída pelo Alto Comissariado da Saúde». Claro que
o que importa é a eficácia da luta, todavia pergunto-me se
alguns activistas desta conviverão bem com a diluição num mais
abrangente anonimato. E, sem dados, cheira-me a muito desperdício
de dinheirinho.
* Notícia: «Os ginecologistas e os obstretas do sexo
masculino entre os 45 e os 65 anos são os médicos mais
acusados de assédio sexual no Brasil». Onde está a dúvida?
Se eles é que estão sempre com a mão na massa...
* Notícia: «O primeiro-ministro britânico, Tony Blair,
afirmou-se ontem em Bruxelas, Bélgica, um "europeísta apaixonado».
Cuidado, o seu ex-colega Guterres também confessou sentimento
igualmente elevado quanto à educação e, depois viu-se que
o que tinha em mente era puro gozo.
* Um passo para a perfeição - Notícia: «Elle McPherson acabou com o
namorado». Ainda há esperança!
Toda a Diferença
Tanto Prometeu como Cristo se sacrificaram pelo
Homem, com o intuito de o elevar à proximidade
do nível dos Deuses. Um fê-lo graças a um roubo,
o Outro, pela Pregação Evangélica do Amor.
Como o Fim não justifica os meios, está tudo dito!
Homem, com o intuito de o elevar à proximidade
do nível dos Deuses. Um fê-lo graças a um roubo,
o Outro, pela Pregação Evangélica do Amor.
Como o Fim não justifica os meios, está tudo dito!
Itália Mia
Quer este pobre teclador, confortavelmente
cioso da sua ancestralidade italiana expressa numa Avó
de Turim, dar conta de que a Justiça, na Pátria de Dante -
- ou na que dela herdou o título -, se revelou, nos últimos
dias, verdadeiramente salomónica. Os magistrados daquele
País emitiram, quase em simultâneo, mandados de captura
contra um imã acusado de terrorismo e contra 13(!) agentes
da C.I.A. que, alegadamente, o raptaram.
Pergunta ingénua: qual pensa o Leitor ser a decisão judicial
com alguma probabilidade de ser cumprida? Pista importante - dizem
que o treze é o número do azar...
cioso da sua ancestralidade italiana expressa numa Avó
de Turim, dar conta de que a Justiça, na Pátria de Dante -
- ou na que dela herdou o título -, se revelou, nos últimos
dias, verdadeiramente salomónica. Os magistrados daquele
País emitiram, quase em simultâneo, mandados de captura
contra um imã acusado de terrorismo e contra 13(!) agentes
da C.I.A. que, alegadamente, o raptaram.
Pergunta ingénua: qual pensa o Leitor ser a decisão judicial
com alguma probabilidade de ser cumprida? Pista importante - dizem
que o treze é o número do azar...
Recuperação da Sanidade Mental
Findo o consulado de John Ashcroft como Procurador-
-Geral dos E.U.A., parece finalmente ter sido arquivado
o puritanismo serôdio que ele havia imposto na decoração
do Departamento de Justiça: o novo titular do cargo mandou
remover os panos que o seu antecessor mandara colocar, com
o objectivo de cobrir as estátuas de nus que ornamentavam
a sede daquele orgão governamental.
Viver na América é mau, por haver iniciativas como a que deu
agora o último suspiro. Mas imaginem que tinha sucedido no
Afeganistão dos taliban: a avaliar pelo triste destino
dos Budas históricos, não haveria boa vontade epigonal capaz de
fazer cair o pano da vergonha.
-Geral dos E.U.A., parece finalmente ter sido arquivado
o puritanismo serôdio que ele havia imposto na decoração
do Departamento de Justiça: o novo titular do cargo mandou
remover os panos que o seu antecessor mandara colocar, com
o objectivo de cobrir as estátuas de nus que ornamentavam
a sede daquele orgão governamental.
Viver na América é mau, por haver iniciativas como a que deu
agora o último suspiro. Mas imaginem que tinha sucedido no
Afeganistão dos taliban: a avaliar pelo triste destino
dos Budas históricos, não haveria boa vontade epigonal capaz de
fazer cair o pano da vergonha.
Leitura Matinal -37
Por todas as razões e mais alguma. Por ser Sábado.
Por ser uma estrada para a serenidade. Por sublinhar
a pequenez humana. Por constituir um tributo justo e
irrecusável. Por afinidades com o que adiante se verá.
De Hoelderlin, segundo Paulo Quintela, célebre e
celebrante:
OS DEUSES
Ó Éter calmo! sempre bela me conservas
A alma no meio da dor; e entre os teus raios,
Hélios! se enobrece em valentia
Muitas vezes o peito revoltado.
Ó bons Deuses! pobre é quem vos não conhece;
No peito rude nunca o dissídio se lhe acalma,
E o mundo pra ele é noite, e nenhuma
Alegria lhe medra nem canção nenhuma.
Vós só com vossa juventude eterna mantendes
Nos corações que vos amam a candura infantil,
E não deixais que em cuidados e erros
Jamais lhe morra no luto o Génio.
Por ser uma estrada para a serenidade. Por sublinhar
a pequenez humana. Por constituir um tributo justo e
irrecusável. Por afinidades com o que adiante se verá.
De Hoelderlin, segundo Paulo Quintela, célebre e
celebrante:
OS DEUSES
Ó Éter calmo! sempre bela me conservas
A alma no meio da dor; e entre os teus raios,
Hélios! se enobrece em valentia
Muitas vezes o peito revoltado.
Ó bons Deuses! pobre é quem vos não conhece;
No peito rude nunca o dissídio se lhe acalma,
E o mundo pra ele é noite, e nenhuma
Alegria lhe medra nem canção nenhuma.
Vós só com vossa juventude eterna mantendes
Nos corações que vos amam a candura infantil,
E não deixais que em cuidados e erros
Jamais lhe morra no luto o Génio.
Friday, June 24, 2005
O Segundo Pecado Mortal
Rezam as crónicas, desde o vetusto Orígenes, que
o Orgulho foi a causa da queda de Lúcifer, o mais
belo dos anjos. Isso não demoveu alguns homens de
proclamá-lo.
Alguns racialistas, conforme se denominam, falam em
«Orgulho Branco». Devo dizer que convivo perfeitamente
com o meu tom de pele, faço profissão de nunca, com fins
convergentes, imitar os transplantes do Sr. Michael Jackson,
mas não sinto nessa tonalidade qualquer orgulho especial. A
minha fraqueza nesse campo limita-se à minha Família, aos
meus Amigos, a alguns livros que li e à minha gata. Também
ao passado do meu País, já que o presente não fornece pano
para tais mangas.
O auge desta triste atitude alcança-se, entretanto, no momento
em que se ousa marcar uma marcha horripilantemente baptizada
«do Orgulho Gay». Não é homofobia. Fizessem os participantes
as habilidades de que gostam, ou aquelas de que são capazes,
no remanso dos seus lares, ou em quarto de hotel para o efeito
vocacionado, e esta boca não se abriria. Até celebraria a parte
relativa ao aparente género masculino, desde que acarretasse menor
concorrência na corrida ao Belo Sexo. Quando passam a apregoá-
-las é que o caso muda de figura.
Ora, se eu me passar completamente - do que já estive mais longe
- e resolver desfilar na rua com uma t-shirt e um cartaz que digam
«GOSTO DE MULHERES», o Leitor que tenha o azar de topar comigo
dirá, possivelmente, entre apiedado a aborrecido: «Muitos parabéns,
ainda bem para si, e o que é que eu tenho a ver com isso?»
Por que é que há-de ser diferente com a comunidade cor-de-rosa?
o Orgulho foi a causa da queda de Lúcifer, o mais
belo dos anjos. Isso não demoveu alguns homens de
proclamá-lo.
Alguns racialistas, conforme se denominam, falam em
«Orgulho Branco». Devo dizer que convivo perfeitamente
com o meu tom de pele, faço profissão de nunca, com fins
convergentes, imitar os transplantes do Sr. Michael Jackson,
mas não sinto nessa tonalidade qualquer orgulho especial. A
minha fraqueza nesse campo limita-se à minha Família, aos
meus Amigos, a alguns livros que li e à minha gata. Também
ao passado do meu País, já que o presente não fornece pano
para tais mangas.
O auge desta triste atitude alcança-se, entretanto, no momento
em que se ousa marcar uma marcha horripilantemente baptizada
«do Orgulho Gay». Não é homofobia. Fizessem os participantes
as habilidades de que gostam, ou aquelas de que são capazes,
no remanso dos seus lares, ou em quarto de hotel para o efeito
vocacionado, e esta boca não se abriria. Até celebraria a parte
relativa ao aparente género masculino, desde que acarretasse menor
concorrência na corrida ao Belo Sexo. Quando passam a apregoá-
-las é que o caso muda de figura.
Ora, se eu me passar completamente - do que já estive mais longe
- e resolver desfilar na rua com uma t-shirt e um cartaz que digam
«GOSTO DE MULHERES», o Leitor que tenha o azar de topar comigo
dirá, possivelmente, entre apiedado a aborrecido: «Muitos parabéns,
ainda bem para si, e o que é que eu tenho a ver com isso?»
Por que é que há-de ser diferente com a comunidade cor-de-rosa?
O Fundo e a Forma
Devo dizer que concordo com a substância da luta
dos membros das polícias no sentido de não verem
os seus direitos reduzidos. A sua função na sociedade
é suficientemente perigosa e essencial para não serem
abrangidos pelos sacrifícios que o Prof. Cunha a todos
nós pede.
Tempos houve e lugares há em que o funcionalismo público
goza, entre os seus concidadãos, de uma estima e reputação
que o transformam no escol da sociedade. Foi assim no Império
Bizantino, é-o ainda, um pouco o Civil Service do Reino Unido.
Por cá é para esquecer; demasiado grande, é incompatível com
a ideia de élite. E não há português que não tenha, ou
não conheça quem tenha razões de queixa da competência de membros
seus. A polícia poderia ocupar esse lugar vago do respeito.
Mas não ao protestar como o fez. Os apupos ao Ministro em forma
te cânticos do público futebolístico, as cabotinices de uma
improvisada acção teatral e, para cúmulo, uma mascarada, fizeram
com que, de todo, perdessem a razão que detinham.
E tão perto de tristes acontecimentos em que, por culpas próprias
ou, mais provavelmente, alheias, as forças policiais são acusadas
de não ter actuado, julgam que é por este caminho que terão sucesso
em segurar a autoridade que lhes resta?
dos membros das polícias no sentido de não verem
os seus direitos reduzidos. A sua função na sociedade
é suficientemente perigosa e essencial para não serem
abrangidos pelos sacrifícios que o Prof. Cunha a todos
nós pede.
Tempos houve e lugares há em que o funcionalismo público
goza, entre os seus concidadãos, de uma estima e reputação
que o transformam no escol da sociedade. Foi assim no Império
Bizantino, é-o ainda, um pouco o Civil Service do Reino Unido.
Por cá é para esquecer; demasiado grande, é incompatível com
a ideia de élite. E não há português que não tenha, ou
não conheça quem tenha razões de queixa da competência de membros
seus. A polícia poderia ocupar esse lugar vago do respeito.
Mas não ao protestar como o fez. Os apupos ao Ministro em forma
te cânticos do público futebolístico, as cabotinices de uma
improvisada acção teatral e, para cúmulo, uma mascarada, fizeram
com que, de todo, perdessem a razão que detinham.
E tão perto de tristes acontecimentos em que, por culpas próprias
ou, mais provavelmente, alheias, as forças policiais são acusadas
de não ter actuado, julgam que é por este caminho que terão sucesso
em segurar a autoridade que lhes resta?
O Soneto e a Emenda
Anda mais que escalpelizada e confessada a falha
da Ministra da Educação. As reacções calmas e
certeiramente assassinas de dois representantes
profissionais com um nível claramente superior à
média, Paulo Sucena e o dirigente da Associação
Profissional dos Magistrados Judiciais acentuaram
a escorregadela e fizeram a Senhora passar por
completa tolinha, o que, devo dizer, nem corresponde
à minha impressão.
Gostaria de deslindar uma pequena questão: em que sentido
usou a Ilustre Governante a palavra «República», à qual se não
estenderia a decisão judicial? Era, como parece, o nome
oficial do país? Seria no sentido de comunidade? Ou, ao
estabelecer a distinção, quereria dizer que esta forma
do estado não se havia estendido às ilhas? Se assim fosse,
eu estaria comprador do primeiro bilhete de avião para os
Açores e passaria, alegremente, a blogar de lá.
As desculpas apresentadas pela acossada é que não
têm pés na cabeça. Primeira: «que estava a falar só para
os professores», como se a estes se pudesse dizer não
importa o quê! Segunda: «que os ministros são pessoas
como as outras». AAAAAAhhhhhh, aí é que bate o ponto,
não deveriam ser melhorzinhos?
da Ministra da Educação. As reacções calmas e
certeiramente assassinas de dois representantes
profissionais com um nível claramente superior à
média, Paulo Sucena e o dirigente da Associação
Profissional dos Magistrados Judiciais acentuaram
a escorregadela e fizeram a Senhora passar por
completa tolinha, o que, devo dizer, nem corresponde
à minha impressão.
Gostaria de deslindar uma pequena questão: em que sentido
usou a Ilustre Governante a palavra «República», à qual se não
estenderia a decisão judicial? Era, como parece, o nome
oficial do país? Seria no sentido de comunidade? Ou, ao
estabelecer a distinção, quereria dizer que esta forma
do estado não se havia estendido às ilhas? Se assim fosse,
eu estaria comprador do primeiro bilhete de avião para os
Açores e passaria, alegremente, a blogar de lá.
As desculpas apresentadas pela acossada é que não
têm pés na cabeça. Primeira: «que estava a falar só para
os professores», como se a estes se pudesse dizer não
importa o quê! Segunda: «que os ministros são pessoas
como as outras». AAAAAAhhhhhh, aí é que bate o ponto,
não deveriam ser melhorzinhos?
Leitura Matinal -36
Uma das mais contundentes críticas que conheço
à hostilidade rotineira e recíproca gerada pelos
habitantes das grandes cidades contemporâneas,
encerrados no seu egoísmo, foi dada à luz pelo
grande estadista judaico-britânico Benjamin
Disraeli. Comentando o Preceito Evangélico «Ama
o teu Próximo como a ti mesmo», o futuro Lord
Beaconsfield deixou cair: «Porém, nas metrópoles
de hoje ninguém sabe quem é o seu próximo».
Esta queda abrupta das solidariedades pessoais sem
o fatal artificialismo das campanhas, só terá conhecido,
no Século XX, uma relevante excepção - a camaradagem
dos combatentes na frente. Sabe-se como um romance
pacifista como «A Oeste Nada de novo», de Remarke, teve
o efeito contrário ao pretendido, "militarizando" os
sentimentos da juventude alemã de entre as duas guerras,
ao oferecer-lhe um quadro de afectos retribuídos que
lhes era desconhecido na vida civil. E, por vezes, o
respeito mútuo de antigos inimigos que se tinham
combatido esteve na génese de amizades autênticas, como
E. Juenger e Drieu, que chegaram nos anos 40´s à amistosa
conclusão de que, em 1916-17, poderiam ter trocado uns
tiros, dado o posicionamento das respectivas unidades,
uma frente à outra.
Também nos nossos veteranos da Guerra de África, por muito
integrados que se encontrem, tenho observado a força dos laços
que os prendem a antigos camaradas de guerra, muito superiores
aos dos ex-colegas de escola, salvo aqueles que as escolhas
individuais guindam à esfera amical.
Bela ilustração de como as comunhões no campo de batalha afastam
as perspectivas de exclusão é, de Rodrigo Emílio:
IRMÃO D´ARMAS
1.
O negro, aqui a meu lado,
À flor deste chão sagrado,
Arma aperrada na mão,
Coroado,
Orvalhado (como eu) de imensidão,
E tão a mim aferrado
Em solidária
Solidão
- Não é negro negregado
mas soldado, meu irmão.
2.
Morrermos no mesmo dia
Irmos por ermos irmão
Que onde antes havia
Onde sempre amanhecia
Sol no céu da solidão
Já só álgida nostalgia
Voa virada ao Verão
A apontar toda a apatia
Em que as estátuas estão.
Morrermos no mesmo dia
Pedras do mesmo padrão
Todo o condão e a magia
Toda a magia da acção
Gerando a interior geografia
De mapas sem dimensão.
Morrermos no mesmo dia
Noivos do mesmo nevão
Solidão por companhia
Manhã d`armas meu irmão!
à hostilidade rotineira e recíproca gerada pelos
habitantes das grandes cidades contemporâneas,
encerrados no seu egoísmo, foi dada à luz pelo
grande estadista judaico-britânico Benjamin
Disraeli. Comentando o Preceito Evangélico «Ama
o teu Próximo como a ti mesmo», o futuro Lord
Beaconsfield deixou cair: «Porém, nas metrópoles
de hoje ninguém sabe quem é o seu próximo».
Esta queda abrupta das solidariedades pessoais sem
o fatal artificialismo das campanhas, só terá conhecido,
no Século XX, uma relevante excepção - a camaradagem
dos combatentes na frente. Sabe-se como um romance
pacifista como «A Oeste Nada de novo», de Remarke, teve
o efeito contrário ao pretendido, "militarizando" os
sentimentos da juventude alemã de entre as duas guerras,
ao oferecer-lhe um quadro de afectos retribuídos que
lhes era desconhecido na vida civil. E, por vezes, o
respeito mútuo de antigos inimigos que se tinham
combatido esteve na génese de amizades autênticas, como
E. Juenger e Drieu, que chegaram nos anos 40´s à amistosa
conclusão de que, em 1916-17, poderiam ter trocado uns
tiros, dado o posicionamento das respectivas unidades,
uma frente à outra.
Também nos nossos veteranos da Guerra de África, por muito
integrados que se encontrem, tenho observado a força dos laços
que os prendem a antigos camaradas de guerra, muito superiores
aos dos ex-colegas de escola, salvo aqueles que as escolhas
individuais guindam à esfera amical.
Bela ilustração de como as comunhões no campo de batalha afastam
as perspectivas de exclusão é, de Rodrigo Emílio:
IRMÃO D´ARMAS
1.
O negro, aqui a meu lado,
À flor deste chão sagrado,
Arma aperrada na mão,
Coroado,
Orvalhado (como eu) de imensidão,
E tão a mim aferrado
Em solidária
Solidão
- Não é negro negregado
mas soldado, meu irmão.
2.
Morrermos no mesmo dia
Irmos por ermos irmão
Que onde antes havia
Onde sempre amanhecia
Sol no céu da solidão
Já só álgida nostalgia
Voa virada ao Verão
A apontar toda a apatia
Em que as estátuas estão.
Morrermos no mesmo dia
Pedras do mesmo padrão
Todo o condão e a magia
Toda a magia da acção
Gerando a interior geografia
De mapas sem dimensão.
Morrermos no mesmo dia
Noivos do mesmo nevão
Solidão por companhia
Manhã d`armas meu irmão!
Thursday, June 23, 2005
Uma Questão de Estatuto
Iniciou o ex-presidente iraquiano Sadam Hussein
uma nova carreira, que só não se revela promissora
porque um previsível encontro com o carrasco ou o
pelotão de fuzilaento não deixam margem para tanto.
Refiro-me à de Conselheiro Matrimonial. Com efeito,
ele tem, repetidamente, exortado os guardas a casarem
com «mulheres nem muito novas nem muito velhas, nem
muito espertas nem muito burras, que façam a lida da
casa».
Lembra-se o Leitor do pé-de-vento que se levantou, a
propósito dumas declarações inocentes do anterior
Ministro da Saúde, culminando nos protestos de feministas
várias & da Dr.ª Ferreira Leite contra a imagem da "Mulher
ao Fogão". Agora, porém, o zero absoluto.
Já sabíamos que quem tenha as características dos Srs. O. J.
Simpson e Althusser é livre da matar a respectiva Mulher. Se
estiver nas circunstâncias vitais de Michael Jackson pode
levar miúdos pobres para a cama. Ficamos a saber o segredo
para passar impunemente opiniões que às feministas desagradem:
assemelhar-se a Sadam.
uma nova carreira, que só não se revela promissora
porque um previsível encontro com o carrasco ou o
pelotão de fuzilaento não deixam margem para tanto.
Refiro-me à de Conselheiro Matrimonial. Com efeito,
ele tem, repetidamente, exortado os guardas a casarem
com «mulheres nem muito novas nem muito velhas, nem
muito espertas nem muito burras, que façam a lida da
casa».
Lembra-se o Leitor do pé-de-vento que se levantou, a
propósito dumas declarações inocentes do anterior
Ministro da Saúde, culminando nos protestos de feministas
várias & da Dr.ª Ferreira Leite contra a imagem da "Mulher
ao Fogão". Agora, porém, o zero absoluto.
Já sabíamos que quem tenha as características dos Srs. O. J.
Simpson e Althusser é livre da matar a respectiva Mulher. Se
estiver nas circunstâncias vitais de Michael Jackson pode
levar miúdos pobres para a cama. Ficamos a saber o segredo
para passar impunemente opiniões que às feministas desagradem:
assemelhar-se a Sadam.
Desde que se Não Torne Obrigatório...
A inefável organização que escolheu o trocadilhístico
nome de "Opus Gay" veio exigir - que a coisa não fica
por menos - ao Poder Público a criação de "gabinetes
contra a discriminação". Atentai bem no que vos diz o
pobre misantropo, qual Profeta Jeremias, menos chorão
apenas porque menos clarividente: o próximo passo desta
gente vai ser gritar palavras de ordem em prol do
estabelecimento de quotas.
nome de "Opus Gay" veio exigir - que a coisa não fica
por menos - ao Poder Público a criação de "gabinetes
contra a discriminação". Atentai bem no que vos diz o
pobre misantropo, qual Profeta Jeremias, menos chorão
apenas porque menos clarividente: o próximo passo desta
gente vai ser gritar palavras de ordem em prol do
estabelecimento de quotas.
A Notícia Falsa
Titula uma folha diária, simpática e gratuita que, dando
pelo nome de «METRO», é distribuída nos transportes
públicos:
«Orgasmos fingidos têm dias contados». Pensei que
estaríamos perante um desenvolvimento da técnica erótica,
ou, na pior das hipóteses, da descoberta de algum sucedâneo
químico que contribuísse para a prossecução desse desiderato.
Qual quê! Trata-se apenas da revelação, por parte duma
equipa de cientistas holandeses, através do uso do TAC,
de que no fingimento do prazer partes do cérebro feminino
continuam activas, sendo em contrapartida desligadas aquando
da presença real daquele.
Onde está a falácia disto? Ora, que casal é que vai ter ao lado
a maquinaria e os operadores que certifiquem a total veracidade
neste campo? Mesmo que isso fosse possível, o efeito seria, com
toda a probabilidade, uma diminuição psicológica dos caminhos
do êxtase, tão eficaz como as bem físicas excisão e cauterização que
certas culturas ainda hoje fomentam.
pelo nome de «METRO», é distribuída nos transportes
públicos:
«Orgasmos fingidos têm dias contados». Pensei que
estaríamos perante um desenvolvimento da técnica erótica,
ou, na pior das hipóteses, da descoberta de algum sucedâneo
químico que contribuísse para a prossecução desse desiderato.
Qual quê! Trata-se apenas da revelação, por parte duma
equipa de cientistas holandeses, através do uso do TAC,
de que no fingimento do prazer partes do cérebro feminino
continuam activas, sendo em contrapartida desligadas aquando
da presença real daquele.
Onde está a falácia disto? Ora, que casal é que vai ter ao lado
a maquinaria e os operadores que certifiquem a total veracidade
neste campo? Mesmo que isso fosse possível, o efeito seria, com
toda a probabilidade, uma diminuição psicológica dos caminhos
do êxtase, tão eficaz como as bem físicas excisão e cauterização que
certas culturas ainda hoje fomentam.
Leitura Matinal -35
Trago hoje à vossa lembrança o soneto final do díptico
L´Aveugle, da autoria de Charles Péguy. Depois de haver,
no poema que é a primeira parte, nomeado Homero, na
dupla condição de cego e de poeta, vem agora aludir
à capacidade oracular, com o que acarreta de dupla visão,
e ao dom celebrativo do que, no nosso Mundo, é permanente
e verdadeiramente fundamental.
Este post-citação é dedicado à memória de Barrilaro Ruas,
extraordinário Tradutor de Péguy, bem como ao meu Amigo
Manuel Vieira da Cruz, seu editor em português.
L´AVEUGLE
II
D´innombrables rayons de toutes les lumières
Ont baigné vingt mille ans ces périssables yeux;
D´innombrables regards vers la terre et les cieux
Sont montés vingt mille ans de toutes les chaumiéres.
D´innombrables reflets des ténèbres premières
Ont roulé vigt mille ans leurs flots silencieux;
D´innombrables regrets vers le monde et les dieux
Ont pleuret vigt mille ans sous l´arceau des paupières.
Dans le double parvis des deux faces de l´être,
Que d´autres soient Césars de tout ce qui se fait;
Que témoins du paraître et greffiers du connaitre,
Que d´autres soient savants de tout ce qui se sait:
L ´aveugle vagabond sera toujours le maitre,
Sous tout ce qui se dit, de tout ce qui se tait.
L´Aveugle, da autoria de Charles Péguy. Depois de haver,
no poema que é a primeira parte, nomeado Homero, na
dupla condição de cego e de poeta, vem agora aludir
à capacidade oracular, com o que acarreta de dupla visão,
e ao dom celebrativo do que, no nosso Mundo, é permanente
e verdadeiramente fundamental.
Este post-citação é dedicado à memória de Barrilaro Ruas,
extraordinário Tradutor de Péguy, bem como ao meu Amigo
Manuel Vieira da Cruz, seu editor em português.
L´AVEUGLE
II
D´innombrables rayons de toutes les lumières
Ont baigné vingt mille ans ces périssables yeux;
D´innombrables regards vers la terre et les cieux
Sont montés vingt mille ans de toutes les chaumiéres.
D´innombrables reflets des ténèbres premières
Ont roulé vigt mille ans leurs flots silencieux;
D´innombrables regrets vers le monde et les dieux
Ont pleuret vigt mille ans sous l´arceau des paupières.
Dans le double parvis des deux faces de l´être,
Que d´autres soient Césars de tout ce qui se fait;
Que témoins du paraître et greffiers du connaitre,
Que d´autres soient savants de tout ce qui se sait:
L ´aveugle vagabond sera toujours le maitre,
Sous tout ce qui se dit, de tout ce qui se tait.
Wednesday, June 22, 2005
O Jeitinho Britânico
Aqueles ingleses têm, efectivamente, um toque
especial na maneira como fazem as coisas. Depois
de ter alegremente afundado o Orçamento Comunitário,
vem o Sr. Blair «mostrar-se convencido de que, sob
a sua presidência, será capaz de desbloquear a questão».
Mais disse, «o cheque britânico é uma anomalia que
poderá desaparecer quando acabar o contexto anormal que
o fez surgir». Maneira extremamente simpática de adiar
a coisa para Dia de S. Nunca à tarde; e não creio que
seja para o 1º de Novembro.
especial na maneira como fazem as coisas. Depois
de ter alegremente afundado o Orçamento Comunitário,
vem o Sr. Blair «mostrar-se convencido de que, sob
a sua presidência, será capaz de desbloquear a questão».
Mais disse, «o cheque britânico é uma anomalia que
poderá desaparecer quando acabar o contexto anormal que
o fez surgir». Maneira extremamente simpática de adiar
a coisa para Dia de S. Nunca à tarde; e não creio que
seja para o 1º de Novembro.
Contradições no Tio Sam?
Continua o vai-não vai da nomeação do Sr. Bolton
para embaixador dos E.U.A. nas Nações Unidas. Devo
dizer, desgostando talvez alguns amigos, entusiastas
das americanices, que, se fosse senador federal norte-
-americano - o que Deus, na Sua Infinita Misericórdia,
permitiu que não acontecesse -, votaria contra a
confirmação do candidato. É um desbocado, tem um historial
de deslealdade para com pessoas que consigo trabalharam.
Last but not the least, criticou o papel da ONU, com o
que concordo grandemente, só que eu não sou candidato
a ser nela representante nacional.
Mas este tipo de antinomias é habitual no país do Sr. Bush.
O anterior Secretário da Energia, Spencer Abraham, enquanto
senador, propôs a extinção do departamento que, pouco depois,
viria a chefiar!
para embaixador dos E.U.A. nas Nações Unidas. Devo
dizer, desgostando talvez alguns amigos, entusiastas
das americanices, que, se fosse senador federal norte-
-americano - o que Deus, na Sua Infinita Misericórdia,
permitiu que não acontecesse -, votaria contra a
confirmação do candidato. É um desbocado, tem um historial
de deslealdade para com pessoas que consigo trabalharam.
Last but not the least, criticou o papel da ONU, com o
que concordo grandemente, só que eu não sou candidato
a ser nela representante nacional.
Mas este tipo de antinomias é habitual no país do Sr. Bush.
O anterior Secretário da Energia, Spencer Abraham, enquanto
senador, propôs a extinção do departamento que, pouco depois,
viria a chefiar!
Leitura Matinal -34
Forte, hoje, a tentação de publicar algum poema que
zurza o calor, o traço infernal mais saliente destes
dois últimos dias. Mas há melhor, vai, de R. M. Rilke,
versão de Paulo Quintela, a melancólica resignação
perante o decurso do tempo que, ao menos, tem a
incontornável vantagem de nos tranquilizar, sugerindo
o fatal advento do frescor...
CADUCIDADE
Areia movediça das horas. Silente e contínuo escoar-se
mesmo do edifício felizmente sagrado.
A vida sopra sempre. Já sem ligação ressaltam
as colunas ociosas, sem carga.
Mas o decair: é ele mais triste que o regresso
da fonte ao espelho que ela de brilho empoa?
Mantenhamo-nos entre os dentes do mutável,
que de todo nos tome na fronte contemplativa.
zurza o calor, o traço infernal mais saliente destes
dois últimos dias. Mas há melhor, vai, de R. M. Rilke,
versão de Paulo Quintela, a melancólica resignação
perante o decurso do tempo que, ao menos, tem a
incontornável vantagem de nos tranquilizar, sugerindo
o fatal advento do frescor...
CADUCIDADE
Areia movediça das horas. Silente e contínuo escoar-se
mesmo do edifício felizmente sagrado.
A vida sopra sempre. Já sem ligação ressaltam
as colunas ociosas, sem carga.
Mas o decair: é ele mais triste que o regresso
da fonte ao espelho que ela de brilho empoa?
Mantenhamo-nos entre os dentes do mutável,
que de todo nos tome na fronte contemplativa.
Tuesday, June 21, 2005
Quem Diz e Desdiz...
Eu sei que as circunstâncias eram difíceis e que
nem toda a gente pode ter a resistência e o orgulho
para, raptado pelos insurgentes no Iraque, se recusar
a debitar a cassette contra os seus governos
que os raptores intimam a repetir. Mas, ainda assim,
fez-me impressão o pedido de desculpas e a palinódia
do engenheiro australiano que agora foi libertado. Por
um lado admirei a coragem de, desta feita sem estar
coacto, voluntariamente descer ao nível desta retractação;
mas também fiquei um tanto incomodado com a tranquilidade
enformadora e o escasso valor dado à palavra proferida!
nem toda a gente pode ter a resistência e o orgulho
para, raptado pelos insurgentes no Iraque, se recusar
a debitar a cassette contra os seus governos
que os raptores intimam a repetir. Mas, ainda assim,
fez-me impressão o pedido de desculpas e a palinódia
do engenheiro australiano que agora foi libertado. Por
um lado admirei a coragem de, desta feita sem estar
coacto, voluntariamente descer ao nível desta retractação;
mas também fiquei um tanto incomodado com a tranquilidade
enformadora e o escasso valor dado à palavra proferida!
Gargalhada
No mundo sui generis da política norte-americana
é costume começar os discursos e o período de resposta nas
conferências de imprensa com uma piada. Mas o Presidente
Bush acha-se disso dispensado, no tocante ao encontro com
o actual presidente da C. E., José Barroso. Tudo porque o
nosso estimado compatriota resolveu antecipar-se e falar
do êxito que se tem revelado a participação europeia no
trabalho diplomático em conjunto com os Estados Unidos.
Querem saber porquê? Porque a esse esforço se teria ficado
a dever a instauração da «democracia na Ucrãnia e no Líbano»!
Lastimável espectáculo do porteiro que se põe em bicos dos
pés junto ao patrão para, na fotografia passar por sócio
da empresa...
é costume começar os discursos e o período de resposta nas
conferências de imprensa com uma piada. Mas o Presidente
Bush acha-se disso dispensado, no tocante ao encontro com
o actual presidente da C. E., José Barroso. Tudo porque o
nosso estimado compatriota resolveu antecipar-se e falar
do êxito que se tem revelado a participação europeia no
trabalho diplomático em conjunto com os Estados Unidos.
Querem saber porquê? Porque a esse esforço se teria ficado
a dever a instauração da «democracia na Ucrãnia e no Líbano»!
Lastimável espectáculo do porteiro que se põe em bicos dos
pés junto ao patrão para, na fotografia passar por sócio
da empresa...
Preso por ter cão...
Não quero, não posso e não vou falar de l´affaire Casa
Pia. Mas um detalhe lateral há que merece referência: a
pobre imagem da - e de - classe que os advogados dos arguidos
vão dando, por meio das declarações que prestam à saída do
Tribunal. A última é do Dr. Serra Lopes, que, corroborando
um padrão já visto, começou por dizer que «não comentava»,
acabando porém por não resistir a marcar um pontinho, ao
desvalorizar a «linguagem intelectualizada» de uma testemunha
contrária. Porquê? Evidentemente, porque falou em «pénis» e
essa não é a palavra que, para o efeito, «se usa na Casa Pia».
Tudo isto é tão pequenino e tão ridículo que não mereceria
comentário, não fosse a irreprimível sensação deixada de que,
tivesse sido usada uma linguagem mais brejeira, estaria ali
o mesmíssimo senhor a contestar a credibilidade da testemunha,
desta feita por empregar uma linguagem indigna do Tribunal.
Pia. Mas um detalhe lateral há que merece referência: a
pobre imagem da - e de - classe que os advogados dos arguidos
vão dando, por meio das declarações que prestam à saída do
Tribunal. A última é do Dr. Serra Lopes, que, corroborando
um padrão já visto, começou por dizer que «não comentava»,
acabando porém por não resistir a marcar um pontinho, ao
desvalorizar a «linguagem intelectualizada» de uma testemunha
contrária. Porquê? Evidentemente, porque falou em «pénis» e
essa não é a palavra que, para o efeito, «se usa na Casa Pia».
Tudo isto é tão pequenino e tão ridículo que não mereceria
comentário, não fosse a irreprimível sensação deixada de que,
tivesse sido usada uma linguagem mais brejeira, estaria ali
o mesmíssimo senhor a contestar a credibilidade da testemunha,
desta feita por empregar uma linguagem indigna do Tribunal.
Qualquer Semelhança é Impura Coincidência
Diz-me, gentilmente, um velho Amigo: «O teu Misantropo anda muito
próximo do Anarca de Ernst Juenger». Grafo desta forma porque
não sei usar o teclado para colocar o trema.
Não é bem assim. O Misantropo admira o Anarca, mas, coitado,
sabe bem que, nem quando for mais crescidinho, conseguirá ser
como ele. O Anarca nada espera, isola-se para melhor observar. O
isolamento do Misantropo é um truque para, esperando sempre o pior,
só vir a ter surpresas agradáveis. O Anarca é frio e disseca, sem
emoção, as baixezas que constata. O Misantropo chegou às perfeições
da observação depois de genuinamente desgostoso com as indigências da
humanidade, com letra pequena, já que não merece a maiúscula.
O Anarca é um aristocrata. O Misantropo não passa de um sacristão
que lê à sorrelfa os livros do Padre. Só não rouba a caixa das esmolas
da igreja, embora esteja irrevogavelmente convencido de que qualquer
fiel é capaz de o fazer.
E, já se sabe, não é Juenger quem quer...
próximo do Anarca de Ernst Juenger». Grafo desta forma porque
não sei usar o teclado para colocar o trema.
Não é bem assim. O Misantropo admira o Anarca, mas, coitado,
sabe bem que, nem quando for mais crescidinho, conseguirá ser
como ele. O Anarca nada espera, isola-se para melhor observar. O
isolamento do Misantropo é um truque para, esperando sempre o pior,
só vir a ter surpresas agradáveis. O Anarca é frio e disseca, sem
emoção, as baixezas que constata. O Misantropo chegou às perfeições
da observação depois de genuinamente desgostoso com as indigências da
humanidade, com letra pequena, já que não merece a maiúscula.
O Anarca é um aristocrata. O Misantropo não passa de um sacristão
que lê à sorrelfa os livros do Padre. Só não rouba a caixa das esmolas
da igreja, embora esteja irrevogavelmente convencido de que qualquer
fiel é capaz de o fazer.
E, já se sabe, não é Juenger quem quer...
Leitura Matinal -33
É sempre de afastar a despromoção do eu, de observador
a objecto virtual de observação. Não tarda, cai-se, ou nas
amarguras originadas por expectativas igualmente medíocres,
ou, no extremo oposto, na injecção de ânimos ligeirinhos e
despropositados. É a situação do poema de Antero de Quental
que se segue, o qual pretende refutar, verso a verso, uma lacrimosa
e ostensivamente desalentada poesia de Alberto Teles. Puro estímulo,
invenção do sujeito como sage, apoiada numa vaga "percepção" cíclica
dos solavancos da sorte, promoção tanto mais desacreditada quão
conhecido é o fim que teve o Autor.
CONFORTO
(Paráfrase)
A sorte só para o fraco é dura às vezes!
Prò forte, que a virtude e crença alenta,
Pra esse não há sortes nem revezes...
Porque após a bonança vem tormenta,
Porque a noite sucede ao claro dia,
É força definhar em mágoa lenta?
Não! Que aos males, que gera a fantasia,
O sábio opõe as íntimas venturas
Da virtude e da fé que em si sentia.
Não chores mais, poeta, as amarguras
Que só os bens da terra vão comendo:
A consciência é jardim onde as verduras
Mil perfumes prò céu vão rescendendo.
a objecto virtual de observação. Não tarda, cai-se, ou nas
amarguras originadas por expectativas igualmente medíocres,
ou, no extremo oposto, na injecção de ânimos ligeirinhos e
despropositados. É a situação do poema de Antero de Quental
que se segue, o qual pretende refutar, verso a verso, uma lacrimosa
e ostensivamente desalentada poesia de Alberto Teles. Puro estímulo,
invenção do sujeito como sage, apoiada numa vaga "percepção" cíclica
dos solavancos da sorte, promoção tanto mais desacreditada quão
conhecido é o fim que teve o Autor.
CONFORTO
(Paráfrase)
A sorte só para o fraco é dura às vezes!
Prò forte, que a virtude e crença alenta,
Pra esse não há sortes nem revezes...
Porque após a bonança vem tormenta,
Porque a noite sucede ao claro dia,
É força definhar em mágoa lenta?
Não! Que aos males, que gera a fantasia,
O sábio opõe as íntimas venturas
Da virtude e da fé que em si sentia.
Não chores mais, poeta, as amarguras
Que só os bens da terra vão comendo:
A consciência é jardim onde as verduras
Mil perfumes prò céu vão rescendendo.
Monday, June 20, 2005
Os Antolhos
Sempre achei - e a realidade envolvente vai reforçando este
ponto de vista - que a maneira mais cega de apreciar a actualidade
é considerar os contemporâneos sempre pela inclusão nas categorias
colectivas em que o observador os situe, em vez de os aquilatar
individualmente. É o espírito de claque implantado na vi(d)a pública.
Vem tão melancólica observação a propósito dos últimos dias da
"net", onde tudo o que é cão gato ou qualquer bicharoco à escolha,
analisa os acontecimentos recentes em função das suas preferências
por grupos, sejam eles os imigrantes ou os manifestantes nacionalistas,
abstraindo do ajuizar dos casos concretos.
Dir-se-á que é um extremo da cegueira. Mas ele radica, antes de mais
na propalada e fedorenta atitude que se traduz na abstenção do julgamento
do indivíduo.
O preceito bíblico «não julgues para não seres julgado» pretende
simplesmente significar, ensina-o a St.ª Madre Igreja, que se não deve
adoptar um duplo critério, dois pesos e duas medidas, consoante o julgado
seja eu ou Outro.
Mas a multidão ignara, com magotes de manifestos não crentes à cabeça,
leva-o para a malandrice, sugerindo que não devemos julgar ninguém.
Foi um espírito semelhante que, em devido tempo, J. Huizinga condenou,
como gerador de apatia face ao crescimento hitleriano e diminuindo as
defesas perante as derrocadas humanas que se prenunciavam.
Mais do que a tolerância zero, cumulativamente recomendável, importa
recriar uma cultura de prémio e sanção que avalie publicamente as
prestações individuais e venha a destroçar as igualdades artificialmente
encorajadas.
Uma nota final: o gesto mental proposto não deve, em situação alguma,
fazer apelo à concorrência, mas estimular a superação de si. E só olhará
para o outro, com intuito competitivo, a pior escória do sistema.
ponto de vista - que a maneira mais cega de apreciar a actualidade
é considerar os contemporâneos sempre pela inclusão nas categorias
colectivas em que o observador os situe, em vez de os aquilatar
individualmente. É o espírito de claque implantado na vi(d)a pública.
Vem tão melancólica observação a propósito dos últimos dias da
"net", onde tudo o que é cão gato ou qualquer bicharoco à escolha,
analisa os acontecimentos recentes em função das suas preferências
por grupos, sejam eles os imigrantes ou os manifestantes nacionalistas,
abstraindo do ajuizar dos casos concretos.
Dir-se-á que é um extremo da cegueira. Mas ele radica, antes de mais
na propalada e fedorenta atitude que se traduz na abstenção do julgamento
do indivíduo.
O preceito bíblico «não julgues para não seres julgado» pretende
simplesmente significar, ensina-o a St.ª Madre Igreja, que se não deve
adoptar um duplo critério, dois pesos e duas medidas, consoante o julgado
seja eu ou Outro.
Mas a multidão ignara, com magotes de manifestos não crentes à cabeça,
leva-o para a malandrice, sugerindo que não devemos julgar ninguém.
Foi um espírito semelhante que, em devido tempo, J. Huizinga condenou,
como gerador de apatia face ao crescimento hitleriano e diminuindo as
defesas perante as derrocadas humanas que se prenunciavam.
Mais do que a tolerância zero, cumulativamente recomendável, importa
recriar uma cultura de prémio e sanção que avalie publicamente as
prestações individuais e venha a destroçar as igualdades artificialmente
encorajadas.
Uma nota final: o gesto mental proposto não deve, em situação alguma,
fazer apelo à concorrência, mas estimular a superação de si. E só olhará
para o outro, com intuito competitivo, a pior escória do sistema.
Viagem de Finalistas
Lá foi, para além-Atlântico, a parelha que preside, formalmente,
aos destinos da Europa. Espero que, começando pelo Canadá, onde
por agora se encontram, o Dr. Barroso e o Sr. Juncker consigam ir
arranjando uma forma hábil de explicar aos estranhos a trapalhada
do adiamento referendário e a inusitada situação daquela ruína curiosa
que deu pelo nome de Projecto de Constituição Europeia. Mas penso
ser tarefa acima das forças de qualquer um. Felizmente para eles a
diplomacia aconselha a ouvir, com cortesia.
aos destinos da Europa. Espero que, começando pelo Canadá, onde
por agora se encontram, o Dr. Barroso e o Sr. Juncker consigam ir
arranjando uma forma hábil de explicar aos estranhos a trapalhada
do adiamento referendário e a inusitada situação daquela ruína curiosa
que deu pelo nome de Projecto de Constituição Europeia. Mas penso
ser tarefa acima das forças de qualquer um. Felizmente para eles a
diplomacia aconselha a ouvir, com cortesia.
Leitura Matinal -32
Que melhor ilustração se poderia desejar para
a afirmação individual, embora enriquecida e
condimentada por múltiplas conexões, que,
espera-se, caracteriza o misantropo?
De António Gedeão,
AMOSTRA SEM VALOR
Eu sei que o meu desespero não interessa a ninguém.
Cada um tem o seu, pessoal e intransmissível;
com ele se entretém
e se julga intangível.
Eu sei que a Humanidade é mais gente do que eu,
sei que o Mundo é maior do que o bairro onde habito,
que o respirar de um só, mesmo que seja o meu,
não pesa num total que tende para o infinito.
Eu sei que as dimensões impiedosas da Vida
ignoram todo o homem, dissolvem-no, e, contudo,
nesta insignificãncia, gratuita e desvalida,
Universo sou eu, com nebulosas e tudo.
a afirmação individual, embora enriquecida e
condimentada por múltiplas conexões, que,
espera-se, caracteriza o misantropo?
De António Gedeão,
AMOSTRA SEM VALOR
Eu sei que o meu desespero não interessa a ninguém.
Cada um tem o seu, pessoal e intransmissível;
com ele se entretém
e se julga intangível.
Eu sei que a Humanidade é mais gente do que eu,
sei que o Mundo é maior do que o bairro onde habito,
que o respirar de um só, mesmo que seja o meu,
não pesa num total que tende para o infinito.
Eu sei que as dimensões impiedosas da Vida
ignoram todo o homem, dissolvem-no, e, contudo,
nesta insignificãncia, gratuita e desvalida,
Universo sou eu, com nebulosas e tudo.
Sunday, June 19, 2005
Frustração dum Peditório Auspicioso
Veio o Eng.º Sócrates choramingar amargamente, lamentando
que, no momento em que parecia haver uma disposição de
espírito no sentido de o nossos parceiros não cortarem muito
na esmola de Bruxelas, uns quantos malfeitores, encabeçados
pela nossa velha aliada, tivessem impedido a dádiva acalentada.
Uma cena igualzinha à do pedinte que, vendo entrar na Igreja
algumas damas que conhece como generosas, é enxotado do
átrio por um guarda da P.S.P. pouco piedoso!
que, no momento em que parecia haver uma disposição de
espírito no sentido de o nossos parceiros não cortarem muito
na esmola de Bruxelas, uns quantos malfeitores, encabeçados
pela nossa velha aliada, tivessem impedido a dádiva acalentada.
Uma cena igualzinha à do pedinte que, vendo entrar na Igreja
algumas damas que conhece como generosas, é enxotado do
átrio por um guarda da P.S.P. pouco piedoso!
Pena de Sampaio
Escudado num dispositivo de segurança e num manancial
de contactos interditos ao comum dos mortais, arriscou-se
o Chefe de Estado pelo Bairro da Cova da Moura, obtendo
tanto êxito na promoção do mesmo que, ao que consta, ele
passará a encabeçar os destinos turísticos das principais
agências mundiais ligadas à oferta de rumos exóticos para o
lazer.
Talvez embriagado com o retumbante êxito do périplo, o Dr.
Sampaio foi afirmando que a resolução de muitos dos problemas
que nos afligem teria como mágica solução a alteração legislativa
que viesse a facilitar a concessão da nacionalidade portuguesa
aos filhos dos imigrantes.
Tenho mantido alguma reserva sobre os acontecimentos que integram
o rescaldo dos crimes do fim de semana prolongado. Nomeadamente,
não toquei sequer a questão racial, por não pretender misturar as
aspirações ideológicas de alguns compatriotas nossos com o que
penso dever ser a preocupação imediata de todos: Que nenhum
inocente seja perseguido, mas que todos os culpados,
sejam brancos, pretos, amarelos, ou verdes com pintinhas azuis,
venham a ser punidos.
E é estritamente neste contexto que tomo a liberdade de lembrar ao
Supremo Magistrado da Nação que o alastramento a Lagardère do
estatuto de nacional acarretaria, como seguimento, a
impossibilidade de aplicar aos abrangidos condenados criminalmente
a pena acessória de expulsão. Queremos isso?
de contactos interditos ao comum dos mortais, arriscou-se
o Chefe de Estado pelo Bairro da Cova da Moura, obtendo
tanto êxito na promoção do mesmo que, ao que consta, ele
passará a encabeçar os destinos turísticos das principais
agências mundiais ligadas à oferta de rumos exóticos para o
lazer.
Talvez embriagado com o retumbante êxito do périplo, o Dr.
Sampaio foi afirmando que a resolução de muitos dos problemas
que nos afligem teria como mágica solução a alteração legislativa
que viesse a facilitar a concessão da nacionalidade portuguesa
aos filhos dos imigrantes.
Tenho mantido alguma reserva sobre os acontecimentos que integram
o rescaldo dos crimes do fim de semana prolongado. Nomeadamente,
não toquei sequer a questão racial, por não pretender misturar as
aspirações ideológicas de alguns compatriotas nossos com o que
penso dever ser a preocupação imediata de todos: Que nenhum
inocente seja perseguido, mas que todos os culpados,
sejam brancos, pretos, amarelos, ou verdes com pintinhas azuis,
venham a ser punidos.
E é estritamente neste contexto que tomo a liberdade de lembrar ao
Supremo Magistrado da Nação que o alastramento a Lagardère do
estatuto de nacional acarretaria, como seguimento, a
impossibilidade de aplicar aos abrangidos condenados criminalmente
a pena acessória de expulsão. Queremos isso?
Um Mês Tem Trinta Dias,
mas neste caso até são trinta e um. E será,
de igual forma, um trinta e um explicar
ao prezado Leitor que esta repelente banalidade
se não deve à absoluta falta de assunto, devendo
ser, com mais acerto, imputada ao orgulho paternal.
Foi a 19 de Maio do corrente que nasceu este blog
e, havendo sido um filho desejado, ninguém levará
a mal que um pobre pai babado aqui, convosco, comemore
o primeiro mês de vida da criança. Mil agradecimentos
a todos os que por cá se dignaram passar.
de igual forma, um trinta e um explicar
ao prezado Leitor que esta repelente banalidade
se não deve à absoluta falta de assunto, devendo
ser, com mais acerto, imputada ao orgulho paternal.
Foi a 19 de Maio do corrente que nasceu este blog
e, havendo sido um filho desejado, ninguém levará
a mal que um pobre pai babado aqui, convosco, comemore
o primeiro mês de vida da criança. Mil agradecimentos
a todos os que por cá se dignaram passar.
Leitura Matinal -31
A independência de juízo é difícil de alcançar.
Não me canso de lembrar que demandá-la pelo
solipsismo sistemático só pode ser frutuoso se
quem a busca consegue manter a atenção cordata
e o sentido de humor, não se deixando cair numa
oposição por princípio à totalidade dominante.
Cada caso é um caso e como tal deve ser pensado,
sem conformações abstractas prévias que tolham o
julgamento. A solidão não deve ser o ponto de
partida para olhar o Mundo, é, ao invés, natural
que desse acto seja uma consequência. Há que encará-la
sem susto.
Sobre as grandezas e misérias do isolamento,
as sempre dignas de nota palavras de Quevedo:
A UN AMIGO QUE RETIRADO DE LA CORTE PASÓ SU EDAD
Dichoso tú que alegre en tu cabaña
mozo y viejo aspiraste la aura pura;
y te sirven de cuna y sepultura
de paja el techo, el suelo de espadaña.
En esa soledad, que libre baña
callado sol con lumbre mas segura,
la vida al dia mas espacio dura,
y la hora sin voz te desengaña.
No cuentas por los Cónsules los años:
hacen tu calendario tus cosechas:
pisas todo tu mundo con engaños.
De todo lo que ignoras te aprovechas;
ni anhelas premios ni padeces daños,
y te dilatas cuanto mas te estrechas.
Não me canso de lembrar que demandá-la pelo
solipsismo sistemático só pode ser frutuoso se
quem a busca consegue manter a atenção cordata
e o sentido de humor, não se deixando cair numa
oposição por princípio à totalidade dominante.
Cada caso é um caso e como tal deve ser pensado,
sem conformações abstractas prévias que tolham o
julgamento. A solidão não deve ser o ponto de
partida para olhar o Mundo, é, ao invés, natural
que desse acto seja uma consequência. Há que encará-la
sem susto.
Sobre as grandezas e misérias do isolamento,
as sempre dignas de nota palavras de Quevedo:
A UN AMIGO QUE RETIRADO DE LA CORTE PASÓ SU EDAD
Dichoso tú que alegre en tu cabaña
mozo y viejo aspiraste la aura pura;
y te sirven de cuna y sepultura
de paja el techo, el suelo de espadaña.
En esa soledad, que libre baña
callado sol con lumbre mas segura,
la vida al dia mas espacio dura,
y la hora sin voz te desengaña.
No cuentas por los Cónsules los años:
hacen tu calendario tus cosechas:
pisas todo tu mundo con engaños.
De todo lo que ignoras te aprovechas;
ni anhelas premios ni padeces daños,
y te dilatas cuanto mas te estrechas.
Saturday, June 18, 2005
Querida Injustiça!
Certa vez, sentenciou o grande Henry de Montherlant: «Prefiro a
justiça ao amor». Sempre admirei esta divisa terrível, mas nunca
consegui fazê-la minha, porque nunca tive uma opinião tão elevada
acerca da minha própria pessoa; absolutamente capacitado das minhas
imensas limitações, reverenciando muito a frase, noutros, achei sempre
aliciante usufruir da mais benévola das injustiças. O misantropo é
assim; detestando naturalmente a humanidade como um todo, acha-se,
frequentemente, na disposição de abrir excepções. E de excepção em
excepção se cria uma nova regra. Acreditem-me, o amor, enquanto dura,
a du bon.
justiça ao amor». Sempre admirei esta divisa terrível, mas nunca
consegui fazê-la minha, porque nunca tive uma opinião tão elevada
acerca da minha própria pessoa; absolutamente capacitado das minhas
imensas limitações, reverenciando muito a frase, noutros, achei sempre
aliciante usufruir da mais benévola das injustiças. O misantropo é
assim; detestando naturalmente a humanidade como um todo, acha-se,
frequentemente, na disposição de abrir excepções. E de excepção em
excepção se cria uma nova regra. Acreditem-me, o amor, enquanto dura,
a du bon.
Preferência Nacional - Doutros?
Espraiando-me ontem por uma lisboa semi-desertificada, talvez em
decorrência da greve da Função Pública, deparo, na Rua de Santa
Marta, ali por alturas do Conde Redondo, com uma loja que ostentava
o seguinte letreiro:
PRECISA-SE EMPREGADA
(BRASILEIRA)
Alguém me sabe explicar a razão do dístico?
Fantasia pessoal, logo desculpável, do dono?
Ou novo rumo, mais geral, dos empregadores?
decorrência da greve da Função Pública, deparo, na Rua de Santa
Marta, ali por alturas do Conde Redondo, com uma loja que ostentava
o seguinte letreiro:
PRECISA-SE EMPREGADA
(BRASILEIRA)
Alguém me sabe explicar a razão do dístico?
Fantasia pessoal, logo desculpável, do dono?
Ou novo rumo, mais geral, dos empregadores?
Leitura Matinal -30
Foi o inevitável Cioran quem escreveu: «Só um optimista se
suicidaria». Com efeito, quem o não seja espera sempre ir
desta para pior. Para o misantropo, se a morte tem a vantagem
aparente, e não mais que eventual, de o libertar de certas companhias,
nada garante que as que lhe saltem ao caminho o façam ganhar
com a troca. Por conseguinte, é sempre aconselhável a espera
tranquila sem temor, estímulo ou bravatas. Exactamente o oposto
do que escreveu Robert Browning, em versos formalmente mais
do que recomendáveis, que ora publico, na tradução de João
Almeida Flor:
PROSPICE
Temer a morte? Sentir na garganta cerração
e névoas no meu rosto,
quando começam os gelos e estertores anunciam
que me vou avizinhando
do reino das trevas, da tempestade sufocante
e do ponto onde o inimigo espreita.
Ao lugar onde mora o Medo visível e supremo
tem de chegar o homem destemido;
cessou a demanda, atingiu-se o cimo
e desmoronam-se as barreiras
embora falte uma batalha para o galardão
que tudo recompensa.
Toda a minha vida foi combate, por isso uma batalha mais.
A melhor e derradeira!
Não quero morrer de olhos vendados, prisioneiro
forçado a passar pela morte rastejando.
Não. Deixem-me saborear por inteiro este momento, viajar
com meus iguais, heróis de outrora,
resistir à investida e num momento pagar os dividendos da ventura
com esta dor, este negrume e frio.
De súbito minha coragem verá que tudo suaviza;
o minuto de treva em breve expira
e a fúria dos elementos, as demoníacas vozes em delírio
hão-de acalmar e confundir-se;
hão-de mudar tornando-se uma paz da dor nascida,
depois uma luz, depois o teu regaço
ó alma da minha alma! De novo hei-de abraçar-te
e o resto será a paz divina.
Deve o poema ser lido da única maneira que vale a pena, no
domínio da leitura da poesia: a apreciação estética. Não
deve, no entanto, enjeitar-se a profilaxia do medo da morte
que ele possa propiciar, equilibrando os pratos da balança
num ponto médio desprovido de exageração sentimental. Que
ao menos para isso sirva a excessiva nota final de esperança.
suicidaria». Com efeito, quem o não seja espera sempre ir
desta para pior. Para o misantropo, se a morte tem a vantagem
aparente, e não mais que eventual, de o libertar de certas companhias,
nada garante que as que lhe saltem ao caminho o façam ganhar
com a troca. Por conseguinte, é sempre aconselhável a espera
tranquila sem temor, estímulo ou bravatas. Exactamente o oposto
do que escreveu Robert Browning, em versos formalmente mais
do que recomendáveis, que ora publico, na tradução de João
Almeida Flor:
PROSPICE
Temer a morte? Sentir na garganta cerração
e névoas no meu rosto,
quando começam os gelos e estertores anunciam
que me vou avizinhando
do reino das trevas, da tempestade sufocante
e do ponto onde o inimigo espreita.
Ao lugar onde mora o Medo visível e supremo
tem de chegar o homem destemido;
cessou a demanda, atingiu-se o cimo
e desmoronam-se as barreiras
embora falte uma batalha para o galardão
que tudo recompensa.
Toda a minha vida foi combate, por isso uma batalha mais.
A melhor e derradeira!
Não quero morrer de olhos vendados, prisioneiro
forçado a passar pela morte rastejando.
Não. Deixem-me saborear por inteiro este momento, viajar
com meus iguais, heróis de outrora,
resistir à investida e num momento pagar os dividendos da ventura
com esta dor, este negrume e frio.
De súbito minha coragem verá que tudo suaviza;
o minuto de treva em breve expira
e a fúria dos elementos, as demoníacas vozes em delírio
hão-de acalmar e confundir-se;
hão-de mudar tornando-se uma paz da dor nascida,
depois uma luz, depois o teu regaço
ó alma da minha alma! De novo hei-de abraçar-te
e o resto será a paz divina.
Deve o poema ser lido da única maneira que vale a pena, no
domínio da leitura da poesia: a apreciação estética. Não
deve, no entanto, enjeitar-se a profilaxia do medo da morte
que ele possa propiciar, equilibrando os pratos da balança
num ponto médio desprovido de exageração sentimental. Que
ao menos para isso sirva a excessiva nota final de esperança.
Friday, June 17, 2005
Qué Viva México!
A indignada população de um lugarejo mexicano
invadiu, em fúria, as instalações municipais
ocupadas nos últimos tempos por um autarca acusado
de corrupção e ilegalidades. Exactamente como as
reacções dos nossos compatriotas em casos similares.
Pergunta: não se pode remeter os arguidos nesse
âmbito para a terra da tequilla?
invadiu, em fúria, as instalações municipais
ocupadas nos últimos tempos por um autarca acusado
de corrupção e ilegalidades. Exactamente como as
reacções dos nossos compatriotas em casos similares.
Pergunta: não se pode remeter os arguidos nesse
âmbito para a terra da tequilla?
De Espanha...
E querem os defensores do homomatrimónio, em Espanha, que
os homosexuais passem «a poder fazer tudo o que os outros
fazem». Começaria essa equalização padronizante pelas beijocas
em cafés, logo arremeteria casamento adentro, culminando na
adopção de crianças por casais alegres.
Espantoso, não acham, que pessoas que estribam toda a sua
reivindicação no Direito à Diferença passem a vida a clamar
pelo Direito à Igualdade. Mas, como se sabe, a lógica é uma
batata.
Por mim, podem lambuzar-se quanto queiram. Mas o resto fia
mais fino. Vai o Estado perder dinheiro, com a extensão dos
benefícios dos casados àqueles que o não deveriam ser em
momento algum. E, no que toca às crianças por eles adoptadas,
já antevejo todos os traumas resultantes da revelação da identidade
dos "pais". Sidney Lumet realizou, em tempos, um filme, «Running
on Empty-Fuga sem Fim», sobre os problemas que afligem o filho
de um casal de radicais dos anos 60´s fugidos à justiça durante muitos
anos, quando opta por uma vida diferente da dos progenitores. Marcas
muito mais indeléveis causará a alteração pretendida.
os homosexuais passem «a poder fazer tudo o que os outros
fazem». Começaria essa equalização padronizante pelas beijocas
em cafés, logo arremeteria casamento adentro, culminando na
adopção de crianças por casais alegres.
Espantoso, não acham, que pessoas que estribam toda a sua
reivindicação no Direito à Diferença passem a vida a clamar
pelo Direito à Igualdade. Mas, como se sabe, a lógica é uma
batata.
Por mim, podem lambuzar-se quanto queiram. Mas o resto fia
mais fino. Vai o Estado perder dinheiro, com a extensão dos
benefícios dos casados àqueles que o não deveriam ser em
momento algum. E, no que toca às crianças por eles adoptadas,
já antevejo todos os traumas resultantes da revelação da identidade
dos "pais". Sidney Lumet realizou, em tempos, um filme, «Running
on Empty-Fuga sem Fim», sobre os problemas que afligem o filho
de um casal de radicais dos anos 60´s fugidos à justiça durante muitos
anos, quando opta por uma vida diferente da dos progenitores. Marcas
muito mais indeléveis causará a alteração pretendida.
O Prazo da Reflexão
Decidiram os governantes dos países membros da União Europeia
que tinham calendarizado referendos sobre a defunta Constituição,
salvo a Polónia, pelo adiamento desses por um ano, «para reflexão».
Está provado à saciedade - e, já agora, também à sociedade - que
os ditos responsáveis são lentos a pensar. Tanto que, para benefício
dos próprios e de todos nós, proponho uma alteração no prazo. Em
vez de um ano, ele passaria a ser vitalício, renovável, salvo indicação
em contrário, quando cada um deles falecesse. Como desejo ao
Eng.º Sócrates mais uns 50 anos de vida, apesar de saber que ele não
permanecerá no poder tanto tempo, no que me diz respeito, poderia
dormir descansado.
que tinham calendarizado referendos sobre a defunta Constituição,
salvo a Polónia, pelo adiamento desses por um ano, «para reflexão».
Está provado à saciedade - e, já agora, também à sociedade - que
os ditos responsáveis são lentos a pensar. Tanto que, para benefício
dos próprios e de todos nós, proponho uma alteração no prazo. Em
vez de um ano, ele passaria a ser vitalício, renovável, salvo indicação
em contrário, quando cada um deles falecesse. Como desejo ao
Eng.º Sócrates mais uns 50 anos de vida, apesar de saber que ele não
permanecerá no poder tanto tempo, no que me diz respeito, poderia
dormir descansado.
Leitura Matinal -29
A lucidez advém do reconhecimento da medida real
de todas as coisas. E a mais difícil parte dessa
clarividência reside em conter o conceito que se
faz da espécie humana nos justos limites que são
os seus. Não peço já que se chegue ao requinte de
lhe considerar como superior a sua congénere felina,
cinjo-me a exortar o meu semelhante a não deificar
o grupo biológico em que calhou pertencer.
Já os gregos antigos proscreviam o orgulho do homem
que se queria igual aos Deuses. E o «conhece-te a ti
mesmo», quer na originária formulação de Quilon de
Esparta, quer na sua trasladação para lema do oráculo
de Delfos, ia nesse sentido. Só com a subversão socrática-
- do antigo, do mestre de Platão - é que ganhou uma
valência de alguma forma inversa, passando a consistir
num passo impulsionador de autosuficiência.
Sobre o tema, escreveu Goethe, com o ziguezagueio habitual
servido por uma forma límpida e estimável; na versão de
Paulo Quintela:
LIMITES DA HUMANIDADE
Quando o antiquíssimo
Pai sagrado
Com mão impassível
De nuvens troantes
Semeia sobre a Terra
Relâmpagos de bênção,
Beijo eu a última
Fímbria da sua túnica,
Temor filial
Fiel no peito.
Pois com Deuses
Não deve medir-se
Homem nenhum!
Ergue-se ele ao alto
Até tocar
Co´a cabeça os astros,
Nenhures se prendem
Os pés incertos,
E com ele brincam
Nuvens e ventos.
E se está com ossos
De rijo tutano
Sobre a Terra Firme,
Inabalável,
Nem sequer chega
A poder comparar-se
Com o carvalho
Ou com a vide.
O que é que distingue
Os Deuses dos homens?
Que muitas vagas
Ante aqueles vagueiam,
Eterna torrente:
A nós ergue-nos a vaga,
Traga-nos a vaga,
E vamos para o fundo.
Um estreito anel
Nos limita a vida,
E muitas gerações
Se alinham constantes
À cadeia infinda
Do seu existir.
de todas as coisas. E a mais difícil parte dessa
clarividência reside em conter o conceito que se
faz da espécie humana nos justos limites que são
os seus. Não peço já que se chegue ao requinte de
lhe considerar como superior a sua congénere felina,
cinjo-me a exortar o meu semelhante a não deificar
o grupo biológico em que calhou pertencer.
Já os gregos antigos proscreviam o orgulho do homem
que se queria igual aos Deuses. E o «conhece-te a ti
mesmo», quer na originária formulação de Quilon de
Esparta, quer na sua trasladação para lema do oráculo
de Delfos, ia nesse sentido. Só com a subversão socrática-
- do antigo, do mestre de Platão - é que ganhou uma
valência de alguma forma inversa, passando a consistir
num passo impulsionador de autosuficiência.
Sobre o tema, escreveu Goethe, com o ziguezagueio habitual
servido por uma forma límpida e estimável; na versão de
Paulo Quintela:
LIMITES DA HUMANIDADE
Quando o antiquíssimo
Pai sagrado
Com mão impassível
De nuvens troantes
Semeia sobre a Terra
Relâmpagos de bênção,
Beijo eu a última
Fímbria da sua túnica,
Temor filial
Fiel no peito.
Pois com Deuses
Não deve medir-se
Homem nenhum!
Ergue-se ele ao alto
Até tocar
Co´a cabeça os astros,
Nenhures se prendem
Os pés incertos,
E com ele brincam
Nuvens e ventos.
E se está com ossos
De rijo tutano
Sobre a Terra Firme,
Inabalável,
Nem sequer chega
A poder comparar-se
Com o carvalho
Ou com a vide.
O que é que distingue
Os Deuses dos homens?
Que muitas vagas
Ante aqueles vagueiam,
Eterna torrente:
A nós ergue-nos a vaga,
Traga-nos a vaga,
E vamos para o fundo.
Um estreito anel
Nos limita a vida,
E muitas gerações
Se alinham constantes
À cadeia infinda
Do seu existir.
Thursday, June 16, 2005
O Hussardo da Morte Prematura
Publicou Pedro Guedes aqui um texto
acerca de um dos meus Mestres, Roger Nimier, que,
conjuntamente com os outros hussardos, Déon, Blondin
e Laurent, bem como com um amigo deles, Kléber Haedens, fazem
parte dos meus "monstros sagrados". Se, pessoalmente, os eternos
exílios de Déon - interiores ou não - e a pura qualidade estilística
de Blondin me são ainda mais caros, também sou (e como!) sensível à
narratividade, por vezes torrencial, noutras demolidora, porém
sempre coerentemente apologética da individualidade sem individualismo
material, de Nimier. Isto sim, é Serviço Público!
acerca de um dos meus Mestres, Roger Nimier, que,
conjuntamente com os outros hussardos, Déon, Blondin
e Laurent, bem como com um amigo deles, Kléber Haedens, fazem
parte dos meus "monstros sagrados". Se, pessoalmente, os eternos
exílios de Déon - interiores ou não - e a pura qualidade estilística
de Blondin me são ainda mais caros, também sou (e como!) sensível à
narratividade, por vezes torrencial, noutras demolidora, porém
sempre coerentemente apologética da individualidade sem individualismo
material, de Nimier. Isto sim, é Serviço Público!
Há Políticos COM Mais Privilégios que os Nossos
Repararam que naquele oceano de País, muito propositadamente
regido pelo Sr. Lula, os parlamentares usufruem de uma regalia
que não consta no naipe das dos nossos deputados? O governo
federal desatou a prestar uns razoáveis mas sureptícios subsídios
por cada voto positivo que certos representantes do Povo debitassem.
No Vizinho americano, mais ao Norte, a venda das almas ainda vai
sendo camuflada. A última de que se deu conta passou-se entre
colegas, quando alguns ilustres congressistas republicanos
propuseram ao ex-representante Nick Smith, do Michigan, o apoio
ao seu filho, que pretendia herdar o assento paterno, em troca
duma certa orientaçãozita de voto. Na terra de Vera Cruz não! A
administração estende logo o numerário. Isto é que é qualidade
de vida!
regido pelo Sr. Lula, os parlamentares usufruem de uma regalia
que não consta no naipe das dos nossos deputados? O governo
federal desatou a prestar uns razoáveis mas sureptícios subsídios
por cada voto positivo que certos representantes do Povo debitassem.
No Vizinho americano, mais ao Norte, a venda das almas ainda vai
sendo camuflada. A última de que se deu conta passou-se entre
colegas, quando alguns ilustres congressistas republicanos
propuseram ao ex-representante Nick Smith, do Michigan, o apoio
ao seu filho, que pretendia herdar o assento paterno, em troca
duma certa orientaçãozita de voto. Na terra de Vera Cruz não! A
administração estende logo o numerário. Isto é que é qualidade
de vida!
Cadê a Certidão?
É de espantar tanta dúvida acerca de a coisa se encontrar
viva ou morta. Cá para nós, que ninguém nos ouve, o que
se deve estar a passar é haver consciência de que, no grupo
do Dr. Barroso e dos 25 outros senhores, é impossível
vislumbrar um médico com competência para distinguir um vivente
de um mero cadáver, certificando, em acto contínuo, o óbito.
Mas não discuto com os iludidos que, cegos pelo afecto, pretendem
ver sinais de vida nuns restos em vias de decomposição. Direi
por uma única vez:
SE AINDA VIVE, ENTERREM-NA VIVA!
viva ou morta. Cá para nós, que ninguém nos ouve, o que
se deve estar a passar é haver consciência de que, no grupo
do Dr. Barroso e dos 25 outros senhores, é impossível
vislumbrar um médico com competência para distinguir um vivente
de um mero cadáver, certificando, em acto contínuo, o óbito.
Mas não discuto com os iludidos que, cegos pelo afecto, pretendem
ver sinais de vida nuns restos em vias de decomposição. Direi
por uma única vez:
SE AINDA VIVE, ENTERREM-NA VIVA!
Leitura Matinal -28
A indescritível ameaça de adiar os referendos europeus vai
fazendo recordar-me o suplício de Tântalo, onde, no instante
em que o sentenciado procurava aplacar a sua desmesurada sede,
a água se sumia e, igualmente, ao tentar alcançar os manjares que
pairavam perto de si, via, como resultado, eles retirarem-se. O caso
paralelo é este: quando o pessoal se preparava para botar, seguindo
a sua consciência, atiram-lhe o sufrágio para as calendas gregas,
ou, quiçá, turcas.
Que tivessem cancelado, por desnecessárias, as votações,
compreendia-se. Adiá-las é que é ou tolice ou perversão; quem nos
garante que daqui a uns mesitos não voltamos ao mesmo?
Teve esta pouca vergonha o condão de me impelir a uma busca aos
alfarrábios cá da casa e reencontrar uma poesia em que romantismo
e humor andam de mão dada. Fruam, de Thomaz Ribeiro, com grafia
antiga nas vezes de tempero
TANTALO
Sabeis quem era Tantalo? o coitado
por mais que fez, não poude entrar no ceu:
foi ás penas eternas codemnado!
e tão grave castigo mereceu...
não sei por que pecado...
por glotão? que sei eu?
Tanto comeu, tanto bebeu, que o eterno
Jove, cançado ao serio com tal méco,
o condemnou, com todo o amor paterno,
a perpetua abstinencia. E magro, e pêco,
lá vive no inferno
a engulir em secco.
Vê pomos junto aos labios, mas não come
vive mettido n`agua, e o seu frescor
não lhe mitiga a sede que o consome:
foge-lhe o fruto e a fonte; e n´este horror
morre de sede de de fome
.......................................
Ha Tantalos d´amor!
Apetece acrescentar: e, muitos mais, de política europeia...
fazendo recordar-me o suplício de Tântalo, onde, no instante
em que o sentenciado procurava aplacar a sua desmesurada sede,
a água se sumia e, igualmente, ao tentar alcançar os manjares que
pairavam perto de si, via, como resultado, eles retirarem-se. O caso
paralelo é este: quando o pessoal se preparava para botar, seguindo
a sua consciência, atiram-lhe o sufrágio para as calendas gregas,
ou, quiçá, turcas.
Que tivessem cancelado, por desnecessárias, as votações,
compreendia-se. Adiá-las é que é ou tolice ou perversão; quem nos
garante que daqui a uns mesitos não voltamos ao mesmo?
Teve esta pouca vergonha o condão de me impelir a uma busca aos
alfarrábios cá da casa e reencontrar uma poesia em que romantismo
e humor andam de mão dada. Fruam, de Thomaz Ribeiro, com grafia
antiga nas vezes de tempero
TANTALO
Sabeis quem era Tantalo? o coitado
por mais que fez, não poude entrar no ceu:
foi ás penas eternas codemnado!
e tão grave castigo mereceu...
não sei por que pecado...
por glotão? que sei eu?
Tanto comeu, tanto bebeu, que o eterno
Jove, cançado ao serio com tal méco,
o condemnou, com todo o amor paterno,
a perpetua abstinencia. E magro, e pêco,
lá vive no inferno
a engulir em secco.
Vê pomos junto aos labios, mas não come
vive mettido n`agua, e o seu frescor
não lhe mitiga a sede que o consome:
foge-lhe o fruto e a fonte; e n´este horror
morre de sede de de fome
.......................................
Ha Tantalos d´amor!
Apetece acrescentar: e, muitos mais, de política europeia...
Wednesday, June 15, 2005
Núvens Negras
Não são auspiciosas as perspectivas para o Conselho
Europeu que se avizinha. Com as reivindicações
francesas, a «margem de manobra limitada da Alemanha»
e o cheque inglês, o impasse espreita, lambareiro.
Já não conheci gigantes como Adenauer, Monnet
e Schuman, mas, considerando políticos com gritantes
insuficiências pessoais como Mitterand e Kohl, tenho
de reconhecer que ainda tinham uma noção do interesse
nacional e do ritmo real suportado pelo processo de
integração.
Com os governantes de hoje, nicles. Chirac é um obcecado
pela manutenção do poder, sem qualquer escrúpulo em aplicar
golpes baixos. E tem que vingar a "perda da face" do non. Shroeder?
Trata-se de um bon-vivant, desprovido de coesão doutrinal, que cedeu,
sem luta, ao inimigo ultraliberal a razão ideológica e aplicou no seu País
as piores receitas daí derivadas. Agravante: está com eleições à porta.
Ao pé deste dueto da corda o Sr. Blair até faz figura de estadista; só
que os ingleses estão tão interessados no aprofundamento do europeísmo
institucional, como um activista palestiniano em desatar aos beijinhos
a uma família de colonos israelitas...
Europeu que se avizinha. Com as reivindicações
francesas, a «margem de manobra limitada da Alemanha»
e o cheque inglês, o impasse espreita, lambareiro.
Já não conheci gigantes como Adenauer, Monnet
e Schuman, mas, considerando políticos com gritantes
insuficiências pessoais como Mitterand e Kohl, tenho
de reconhecer que ainda tinham uma noção do interesse
nacional e do ritmo real suportado pelo processo de
integração.
Com os governantes de hoje, nicles. Chirac é um obcecado
pela manutenção do poder, sem qualquer escrúpulo em aplicar
golpes baixos. E tem que vingar a "perda da face" do non. Shroeder?
Trata-se de um bon-vivant, desprovido de coesão doutrinal, que cedeu,
sem luta, ao inimigo ultraliberal a razão ideológica e aplicou no seu País
as piores receitas daí derivadas. Agravante: está com eleições à porta.
Ao pé deste dueto da corda o Sr. Blair até faz figura de estadista; só
que os ingleses estão tão interessados no aprofundamento do europeísmo
institucional, como um activista palestiniano em desatar aos beijinhos
a uma família de colonos israelitas...
Por Cima, a Cimeira, Passe a Redundância
Mas nem tudo são espinhos. O nosso Primeiro portou-se
bem melhor, ao lado do chanceler Schroeder, quando lhe
devolveu, na mesma moeda, a desculpa de ocasião da «margem
de manobra limitada» para chegar a consenso sobre o
problema português, dizendo-lhe, na cara, que a margem
de manobra portuguesa também era limitada para solucionar
o problema alemão.
Claro está, todos sabemos que quem tem o livro de cheques é
a pátria de Goethe.
O caso trouxe-me á lembrança outro, muito mais antigo, narrado
e comentado por Hermann Von Keyserling. No tempo de Felipe II
de Espanha, o poderoso exército que ele cá mandou, sob a chefia
do Duque de Alba, deteve a marcha ao passar em frente de um campónio
português; ao que o nosso patrício, interpelando o comandante,
teria dito: «Homem, passe, que eu não lhe faço mal». O conde
Keyserling, que era um apaixonado da força, espumou e invectivou
a arrogãncia do que ele descreveu como o «anão». Nem se apercebeu,
o pobre sábio germânico, de que a grandeza do desafio residia,
justamente na falta de poder do seu autor.
Mas acha o Primeiro-Ministro que poderia fazer este brilharete se
a Contituição Europeia fosse avante, com as consabidas modificações
no processo decisório?
bem melhor, ao lado do chanceler Schroeder, quando lhe
devolveu, na mesma moeda, a desculpa de ocasião da «margem
de manobra limitada» para chegar a consenso sobre o
problema português, dizendo-lhe, na cara, que a margem
de manobra portuguesa também era limitada para solucionar
o problema alemão.
Claro está, todos sabemos que quem tem o livro de cheques é
a pátria de Goethe.
O caso trouxe-me á lembrança outro, muito mais antigo, narrado
e comentado por Hermann Von Keyserling. No tempo de Felipe II
de Espanha, o poderoso exército que ele cá mandou, sob a chefia
do Duque de Alba, deteve a marcha ao passar em frente de um campónio
português; ao que o nosso patrício, interpelando o comandante,
teria dito: «Homem, passe, que eu não lhe faço mal». O conde
Keyserling, que era um apaixonado da força, espumou e invectivou
a arrogãncia do que ele descreveu como o «anão». Nem se apercebeu,
o pobre sábio germânico, de que a grandeza do desafio residia,
justamente na falta de poder do seu autor.
Mas acha o Primeiro-Ministro que poderia fazer este brilharete se
a Contituição Europeia fosse avante, com as consabidas modificações
no processo decisório?
Por Baixo, o "Gaguejanço"
Quando confrontado pela Imprensa com as 13.000
nomeações para cargos que já leva o seu governo, o
Eng.º Sócrates meteu os pés pelas mãos, negou o número,
pôs os olhos em alvo, reconheceu-o afinal verdadeiro,
e esclareceu, manifestamente incomodado, que
- a maior parte delas eram nomeações de gabinetes, funções
de exclusiva confiança política. Sem querer contraditá-lo,
não era justamente essa uma das categorias que se pretendia
ver reduzidas?
- as restantes tinham colocado pessoas de «manifesta e
reconhecida competência», o que se deve por certo referir ao
Dr. Fernando Gomes.
Tanta atrapalhação não é própria de um político apto. Ao
contrário, é característica de um político áptero.
nomeações para cargos que já leva o seu governo, o
Eng.º Sócrates meteu os pés pelas mãos, negou o número,
pôs os olhos em alvo, reconheceu-o afinal verdadeiro,
e esclareceu, manifestamente incomodado, que
- a maior parte delas eram nomeações de gabinetes, funções
de exclusiva confiança política. Sem querer contraditá-lo,
não era justamente essa uma das categorias que se pretendia
ver reduzidas?
- as restantes tinham colocado pessoas de «manifesta e
reconhecida competência», o que se deve por certo referir ao
Dr. Fernando Gomes.
Tanta atrapalhação não é própria de um político apto. Ao
contrário, é característica de um político áptero.
Leitura Matinal -27
Incompatíveis com a postura de reflexão individual
que tenho vindo a recomendar, quer o diletantismo,
quer a inconstância com origem em qualquer outra
fonte, mormente no desejo impensado e fugaz do que,
por enquanto se não tem. Para ilustrar esta maleita
a proscrever, pesquei poema dum Autor que
viveu entre os séculos XVI e XVII, Jean-Baptiste
Chassignet, a última parte do tríptico
LE MÉPRIS DE LA VIE ET CONSOLATION CONTRE
LA MORT
J´ai voulu voyager, à la fin le voyage
M´a fait en ma maison mal content retirer.
En mon étude seul j´ai voulu demeurer,
Enfin la solitude a causé mon dommage.
J´ai voulu naviguer, enfin le navigage
Entre vie et trépas m´a fait desesperer.
J´ai voulu pour plaisir la terre labourer,
Enfin j´ai méprisé l´état du labourage.
J´ai voulu pratiquer la science et les arts,
Enfin je n´ai rien su; j´ai couru le hasard
Des combats carnassiers, la guerre ore m´offense:
O imbecillité de l´esprit curieux
Qui mécontent de tout de tout est désireux,
Et douteux n´a de rien parfaite connaissance.
que tenho vindo a recomendar, quer o diletantismo,
quer a inconstância com origem em qualquer outra
fonte, mormente no desejo impensado e fugaz do que,
por enquanto se não tem. Para ilustrar esta maleita
a proscrever, pesquei poema dum Autor que
viveu entre os séculos XVI e XVII, Jean-Baptiste
Chassignet, a última parte do tríptico
LE MÉPRIS DE LA VIE ET CONSOLATION CONTRE
LA MORT
J´ai voulu voyager, à la fin le voyage
M´a fait en ma maison mal content retirer.
En mon étude seul j´ai voulu demeurer,
Enfin la solitude a causé mon dommage.
J´ai voulu naviguer, enfin le navigage
Entre vie et trépas m´a fait desesperer.
J´ai voulu pour plaisir la terre labourer,
Enfin j´ai méprisé l´état du labourage.
J´ai voulu pratiquer la science et les arts,
Enfin je n´ai rien su; j´ai couru le hasard
Des combats carnassiers, la guerre ore m´offense:
O imbecillité de l´esprit curieux
Qui mécontent de tout de tout est désireux,
Et douteux n´a de rien parfaite connaissance.
Tuesday, June 14, 2005
Michael Pan
Os jurados deram Michael Jackson como inocente das
dez acusações que lhe eram feitas no processo penal
em que era arguido, por pedofilia. Os doze cidadãos
engoliram como boa a versão apresentada pelo arguido,
segundo a qual tinha confessadamente levado para a cama
um miúdo, mas que não tinha querido fazer sexo com ele,
pese embora este sustentar o contrário. O distinto júri
ignorou o facto de, por cinco vezes, anteriormente e com
outras crianças, o réu haver sido acusado do mesmo, só tendo
três delas sido desmentidas pelas vítimas, depois de
celebrados acordos vultuosos com as famílias, camuflados de
presentes.
Mas há um facto que explica tudo: o Sr. Jackson habita um
rancho denominado «Neverland»-Terra do Nunca. Pobre Sir
James Barrie, às voltas na tumba!
dez acusações que lhe eram feitas no processo penal
em que era arguido, por pedofilia. Os doze cidadãos
engoliram como boa a versão apresentada pelo arguido,
segundo a qual tinha confessadamente levado para a cama
um miúdo, mas que não tinha querido fazer sexo com ele,
pese embora este sustentar o contrário. O distinto júri
ignorou o facto de, por cinco vezes, anteriormente e com
outras crianças, o réu haver sido acusado do mesmo, só tendo
três delas sido desmentidas pelas vítimas, depois de
celebrados acordos vultuosos com as famílias, camuflados de
presentes.
Mas há um facto que explica tudo: o Sr. Jackson habita um
rancho denominado «Neverland»-Terra do Nunca. Pobre Sir
James Barrie, às voltas na tumba!
Como é Diferente a "Justiça" nos E.U.A.!
-Um cortejo automóvel de, pelo menos, 4 carros pretos.
-Escolta policial de batedores, motociclistas da polícia, a partir
de certo ponto.
-Transmissão televisiva em directo, desde um helicóptero e no
local de chegada.
-Multidão de apoiantes, aguardando, com cartazes e t-shirts.
-Autorização inédita dada pelo magistrado de parte da cerimónia
oficial ser transmitida radiofonicamente, em directo, do interior do
tribunal.
É uma visita do Presidente? Não; é uma sessão em memória de
mortos em combate? Não, é Michael Jackson que se encaminha
para ouvir um veredicto, num processo criminal!!!!!
-Escolta policial de batedores, motociclistas da polícia, a partir
de certo ponto.
-Transmissão televisiva em directo, desde um helicóptero e no
local de chegada.
-Multidão de apoiantes, aguardando, com cartazes e t-shirts.
-Autorização inédita dada pelo magistrado de parte da cerimónia
oficial ser transmitida radiofonicamente, em directo, do interior do
tribunal.
É uma visita do Presidente? Não; é uma sessão em memória de
mortos em combate? Não, é Michael Jackson que se encaminha
para ouvir um veredicto, num processo criminal!!!!!
Uma Incerteza Paralisante
E, logo a seguir, numa ligação à Feira do livro de
Lisboa, uma repórter aborda um cavalheiro que, no
stand das Edições Avante - ou talvez no da Editorial
Caminho, já nem sei -, comprava obras do Falecido. Após
dizer algumas generalidades agradáveis sobre o Autor
recém-adquirido, uma vez interpelado a respeito, lá
confessou desconhecer o óbito de que todo mundo falava.
Verdade? Mentira? Expediente engenhoso para se livrar
de mais perguntas? Vá lá saber-se. Mas a jornalista
ficou sem pio!
Lisboa, uma repórter aborda um cavalheiro que, no
stand das Edições Avante - ou talvez no da Editorial
Caminho, já nem sei -, comprava obras do Falecido. Após
dizer algumas generalidades agradáveis sobre o Autor
recém-adquirido, uma vez interpelado a respeito, lá
confessou desconhecer o óbito de que todo mundo falava.
Verdade? Mentira? Expediente engenhoso para se livrar
de mais perguntas? Vá lá saber-se. Mas a jornalista
ficou sem pio!
Descubra as Diferenças,...
...o que não é difícil. Na evocação biográfica de Álvaro Cunhal
que a RTP1 nos deu ontem, ao fim da tarde, passou, de novo, um
momento televisivo ímpar: a parte da entrevista em que, num gesto
obviamente estudado, Cunhal acede a desvelar algo da sua vida
familiar, tirando da carteira as fotografias da Filha e dos Netos.
Mesmo num acto planeado, quanta contenção e... sim, finura. Tal
qual o Prof. Carrilho, na semana transacta! É a velha história do
jacaré e da lagartixa...
que a RTP1 nos deu ontem, ao fim da tarde, passou, de novo, um
momento televisivo ímpar: a parte da entrevista em que, num gesto
obviamente estudado, Cunhal acede a desvelar algo da sua vida
familiar, tirando da carteira as fotografias da Filha e dos Netos.
Mesmo num acto planeado, quanta contenção e... sim, finura. Tal
qual o Prof. Carrilho, na semana transacta! É a velha história do
jacaré e da lagartixa...
Leitura Matinal -26
O decurso do tempo é factor crucial para
atingir as metas do distanciamento e da
impermeabilização às pressões que aqui
tenho vindo a pregar. É, ademais, claro
que também permite ou força outras menos
programáticas situações, como lembra
David Mourão-Ferreira em
HISTORICAL SENSE
Adormeci em Roma E despertam-me em Cuba
Houve no meio disto a bomba em Hiroxima
Tudo está afinal gravado nesta ruga
que tu ontem à tarde inda não descobriras
Aprendo agora a ler a História no meu rosto
Descubro num sinal a queda de Paris
E há também um jornal na pele da tua coxa
Já não é o desejo o melhor alibi
atingir as metas do distanciamento e da
impermeabilização às pressões que aqui
tenho vindo a pregar. É, ademais, claro
que também permite ou força outras menos
programáticas situações, como lembra
David Mourão-Ferreira em
HISTORICAL SENSE
Adormeci em Roma E despertam-me em Cuba
Houve no meio disto a bomba em Hiroxima
Tudo está afinal gravado nesta ruga
que tu ontem à tarde inda não descobriras
Aprendo agora a ler a História no meu rosto
Descubro num sinal a queda de Paris
E há também um jornal na pele da tua coxa
Já não é o desejo o melhor alibi
Monday, June 13, 2005
Reconhecimento na net
Quero expressar a minha gratidão a Rui Paula de Matos, que,
em «Culturanálise», cujo link se encontra na coluna ao lado,
publicou palavras mais que amáveis sobre as reles linhas que
por aqui vou alinhavando. Tudo de bom!
em «Culturanálise», cujo link se encontra na coluna ao lado,
publicou palavras mais que amáveis sobre as reles linhas que
por aqui vou alinhavando. Tudo de bom!
O Crack Bolsista das Liberdades
O Demoliberalismo, como mais não tem que possa apregoar,
finca bem os pés na oferta do ilusório conceito das
Liberdades para se legitimar. Ilusório a vários títulos,
já que, no modelo continental europeu, a decisão política,
ainda que restrita à escolha, é usurpada pelas cúpulas
partidárias, remetendo o eleitor para o estatuto de espoliado.
Mas não é esse o lado que mais oprime. São as limitações às
liberdades (con)vivenciais que são sentidas mais agudamente
pelo comum dos mortais, na medida em que cada um só pode
parecer livre até onde se baliza a liberdade do Outro. Conclusão
forçosa é constatar que, ao despovoar as cidades e vilas da
Província, rumo aos gigantescos centros urbanos, grande parte da
população abdicou do policiamento moral das terras pequenas, na
mira de que maior anonimato lhe permitisse uma amplidão acrescida
das escolhas de actuação. Pura inocência, confinados aos
cubículos das metrópoles e da rotina, acham-se invariavelmente
vulneráveis aos ataques de duas forças cuja liberdade de actuação
lhes suga a sua: as injunções comportamentais da televisão e a
ameaça dos delinquentes.
Longe dos tempos revoltos da 1ª República, é para aí que caminhamos,
nesta já significativa soma de criminalidade, que dando um salto
de gravidade com os assassinatos de polícias, vem a tornar-se
universalmente notada com os acontecimentos de Carcavelos. Está
tudo dito por um transeunte interrogado na rua, durante o Telejornal
de ontem, na RTP1:
«-liberdade para quê? Para acontecer como em Carcavelos?
Vou guardar o meu cartão de eleitor numa carteira e dar-lhe
o nome "Memórias do Meu Passado"». Foi um estado de espírito
semelhante que, em 1926, decidiu à acção os Tenentes de Maio.
finca bem os pés na oferta do ilusório conceito das
Liberdades para se legitimar. Ilusório a vários títulos,
já que, no modelo continental europeu, a decisão política,
ainda que restrita à escolha, é usurpada pelas cúpulas
partidárias, remetendo o eleitor para o estatuto de espoliado.
Mas não é esse o lado que mais oprime. São as limitações às
liberdades (con)vivenciais que são sentidas mais agudamente
pelo comum dos mortais, na medida em que cada um só pode
parecer livre até onde se baliza a liberdade do Outro. Conclusão
forçosa é constatar que, ao despovoar as cidades e vilas da
Província, rumo aos gigantescos centros urbanos, grande parte da
população abdicou do policiamento moral das terras pequenas, na
mira de que maior anonimato lhe permitisse uma amplidão acrescida
das escolhas de actuação. Pura inocência, confinados aos
cubículos das metrópoles e da rotina, acham-se invariavelmente
vulneráveis aos ataques de duas forças cuja liberdade de actuação
lhes suga a sua: as injunções comportamentais da televisão e a
ameaça dos delinquentes.
Longe dos tempos revoltos da 1ª República, é para aí que caminhamos,
nesta já significativa soma de criminalidade, que dando um salto
de gravidade com os assassinatos de polícias, vem a tornar-se
universalmente notada com os acontecimentos de Carcavelos. Está
tudo dito por um transeunte interrogado na rua, durante o Telejornal
de ontem, na RTP1:
«-liberdade para quê? Para acontecer como em Carcavelos?
Vou guardar o meu cartão de eleitor numa carteira e dar-lhe
o nome "Memórias do Meu Passado"». Foi um estado de espírito
semelhante que, em 1926, decidiu à acção os Tenentes de Maio.
Leitura Matinal -25
Em que medida uma vida interior rica propiciará
a hipersensibilidade que amplia a dor, apesar de,
fequentemente, a observação imparcial, eivada por um
cepticismo suave, apurar que bem pouco motivo existe
para tal? Não há necessidade de recordar a catarse
da Antiga Grécia em ordem à valorização da poesia
como "vacina" para tão imprecisos sofrimentos; e
desta forma, com Rodrigues Lobo e onirismo à mistura:
Que amor sigo? Que busco? Que desejo?
Que enleo é este vão da fantasia?
Que tive? Que perdi? Quem me queria?
Quem me faz guerra? Contra quem pelejo?
Foi por encantamento o meu desejo,
e por sombra passou minha alegria;
mostrou-me Amor, dormindo, o que não via,
e eu ceguei do que vi, pois já não vejo.
Fez à sua medida o pensamento
aquela estranha e nova fermosura
e aquele parecer quase divino.
Ou imaginação, sombra ou figura,
é certo e verdadeiro meu tormento:
Eu morro do que vi, do que imagino.
a hipersensibilidade que amplia a dor, apesar de,
fequentemente, a observação imparcial, eivada por um
cepticismo suave, apurar que bem pouco motivo existe
para tal? Não há necessidade de recordar a catarse
da Antiga Grécia em ordem à valorização da poesia
como "vacina" para tão imprecisos sofrimentos; e
desta forma, com Rodrigues Lobo e onirismo à mistura:
Que amor sigo? Que busco? Que desejo?
Que enleo é este vão da fantasia?
Que tive? Que perdi? Quem me queria?
Quem me faz guerra? Contra quem pelejo?
Foi por encantamento o meu desejo,
e por sombra passou minha alegria;
mostrou-me Amor, dormindo, o que não via,
e eu ceguei do que vi, pois já não vejo.
Fez à sua medida o pensamento
aquela estranha e nova fermosura
e aquele parecer quase divino.
Ou imaginação, sombra ou figura,
é certo e verdadeiro meu tormento:
Eu morro do que vi, do que imagino.
Sunday, June 12, 2005
Justificação Supérflua
Ao longo da última semana fui acrescentando a
este pobre diário, uma a uma, oito belezas
femininas que tornaram melhor a minha vida.
Assim, foram sendo publicadas, por ordem
cronológica, imagens de Gene Tierney, Bappée,
Sharon Stone, Grace Kelly, Olivia de Havilland,
Donna Reed, Cybill Shepherd e Teresa Wright.
Este procedimento é dedicado aos meus Amigos
Vítor Morais - que o pediu - e Ricardo António
Alves - que o foi encorajando -, conforme atestam
os respectivos comentários, ao longo da página
apostos.
No caso do Ricardo, há ainda outro ponto a salientar:
o seu contributo, a propósito do retrato de Grace Kelly,
vale para mim como um «encore!». Por isso, e
porque hoje é dia grande, segue-se um extra.
este pobre diário, uma a uma, oito belezas
femininas que tornaram melhor a minha vida.
Assim, foram sendo publicadas, por ordem
cronológica, imagens de Gene Tierney, Bappée,
Sharon Stone, Grace Kelly, Olivia de Havilland,
Donna Reed, Cybill Shepherd e Teresa Wright.
Este procedimento é dedicado aos meus Amigos
Vítor Morais - que o pediu - e Ricardo António
Alves - que o foi encorajando -, conforme atestam
os respectivos comentários, ao longo da página
apostos.
No caso do Ricardo, há ainda outro ponto a salientar:
o seu contributo, a propósito do retrato de Grace Kelly,
vale para mim como um «encore!». Por isso, e
porque hoje é dia grande, segue-se um extra.
Olé! Eis o Ciclotráfego Pelado
Um número indeterminado, embora significativo,
de velonudistas invadiu as ruas históricas
de Madrid, tal como Deus os pôs no Mundo, no
que a rouparia toca. Segundo os manifestantes,
ficou esta acção a dever-se à preocupação de
demonstrar como cada um dos participantes se
sentia nu, em face do trânsito.
Não consigo acompanhar a sequência lógica do
protesto: se eles já se viam nus, porque carga
de água houve a necessidade de colocar de lado
os trapinhos?
Mas quanto à essência da coisa, nada a objectar.
Proponho até melhorá-la, restringindo o acesso ao
estatuto de manifestante a metade da espécie humana,
o género feminino, por exemplo, e, dentro desta
categoria, às portadoras de medidas que obedecessem
a critérios meus...
Move-me unicamente a intenção de conferir eficácia ao
gesto público em questão. Nunca se dirá que não sou
desinteressado!
de velonudistas invadiu as ruas históricas
de Madrid, tal como Deus os pôs no Mundo, no
que a rouparia toca. Segundo os manifestantes,
ficou esta acção a dever-se à preocupação de
demonstrar como cada um dos participantes se
sentia nu, em face do trânsito.
Não consigo acompanhar a sequência lógica do
protesto: se eles já se viam nus, porque carga
de água houve a necessidade de colocar de lado
os trapinhos?
Mas quanto à essência da coisa, nada a objectar.
Proponho até melhorá-la, restringindo o acesso ao
estatuto de manifestante a metade da espécie humana,
o género feminino, por exemplo, e, dentro desta
categoria, às portadoras de medidas que obedecessem
a critérios meus...
Move-me unicamente a intenção de conferir eficácia ao
gesto público em questão. Nunca se dirá que não sou
desinteressado!
Leitura Matinal -24
Domingo é dia do Tributo, Mas nada impede que
ele se expresse através de meios partícipes da
individualidade estética. Se, na celebérrima
sentença de São Boaventura, todos os caminhos
são bons para se chegar a Deus, porque não ir
tentando fazê-lo por via da interrogação poética,
com Fernanda de Castro, em jeito de prospectivo
balanço?:
OS ANOS SÃO DEGRAUS
Os anos são degraus; a vida, a escada.
Longa ou curta, só Deus pode medi-la.
E a Porta, a grande Porta desejada,
Só Deus pode fechá-la,
Pode abri-la.
São vários os degraus: alguns sombrios,
Outros ao sol, na plena luz dos astros,
Com asas de anjos, harpas celestiais;
Alguns, quilhas e mastros
Nas mãos dos vendavais.
Mas tudo são degraus; tudo é fugir
À humana condição.
Degrau após degrau,
Tudo é lenta ascensão.
Senhor, como é possível a descrença,
Imaginar, sequer, que no fim da estrada,
Se encontre após esta ansiedade imensa
Uma porta fechada
- E mais nada?
ele se expresse através de meios partícipes da
individualidade estética. Se, na celebérrima
sentença de São Boaventura, todos os caminhos
são bons para se chegar a Deus, porque não ir
tentando fazê-lo por via da interrogação poética,
com Fernanda de Castro, em jeito de prospectivo
balanço?:
OS ANOS SÃO DEGRAUS
Os anos são degraus; a vida, a escada.
Longa ou curta, só Deus pode medi-la.
E a Porta, a grande Porta desejada,
Só Deus pode fechá-la,
Pode abri-la.
São vários os degraus: alguns sombrios,
Outros ao sol, na plena luz dos astros,
Com asas de anjos, harpas celestiais;
Alguns, quilhas e mastros
Nas mãos dos vendavais.
Mas tudo são degraus; tudo é fugir
À humana condição.
Degrau após degrau,
Tudo é lenta ascensão.
Senhor, como é possível a descrença,
Imaginar, sequer, que no fim da estrada,
Se encontre após esta ansiedade imensa
Uma porta fechada
- E mais nada?
Saturday, June 11, 2005
Tsunami à Moda da Linha
Que o maremoto do Índico tenha surpreendido tanta
gente é fácil de compreender, a vaga gigantesca
formou-se num pequeníssimo lapso de tempo. Agora,
que o vagalhão de Carcavelos tenha sortido é coisa
que não se entende. Para mais, parece que muitos dos
seus componentes brotaram de fora do concelho e foram
de comboio, durante uns bons vinte minutos, até àquela
concorrida praia. Mais, dizem várias testemunhas que,
antecedendo o assalto generalizado, dentro das carruagens,
já se tinham verificado distúrbios.
Porque é que a Polícia não actuou? Provavelmente porque
lhe não foi dada ordem para tal. E porquê? Ah, isso
também eu gostaria de saber.
O arrastão, como se pratica no Rio de Janeiro, é mais
organizado, mais desculpável e mais... temperado.
Organizado porque ocorre uma vez por semestre, em terreno
de caça de cada favela, reconhecido aliás como tal; porque
os autores da proeza se dão ao luxo de avisar, com dias de
avanço, os comerciantes amigos que lhes foram dando uns
sorvetes ou chocolates.
Desculpável porque aquela gente toda vai a pé, direitinha ao
objectivo; não se podendo impedir as pessoas de andar na rua,
a coisa acaba quando para tanto é dado sinal, ou seja, ao
aparecer um helicóptero da Polícia Militar, disparando rajadas
de metralhadora como aviso de que a festa acabou, sem visar
ferir quem quer que seja.
Temperado porque é raro haver agressões. Vai tudo à frente, mas
são sobretudo os bens das lojas que se eclipsam.
Enfim as ondas da Praia de Carcavelos deixaram de ser paraíso
para os surfistas. A de ontem, se algum encontrou, começou logo
por lhes anexar a prancha...
gente é fácil de compreender, a vaga gigantesca
formou-se num pequeníssimo lapso de tempo. Agora,
que o vagalhão de Carcavelos tenha sortido é coisa
que não se entende. Para mais, parece que muitos dos
seus componentes brotaram de fora do concelho e foram
de comboio, durante uns bons vinte minutos, até àquela
concorrida praia. Mais, dizem várias testemunhas que,
antecedendo o assalto generalizado, dentro das carruagens,
já se tinham verificado distúrbios.
Porque é que a Polícia não actuou? Provavelmente porque
lhe não foi dada ordem para tal. E porquê? Ah, isso
também eu gostaria de saber.
O arrastão, como se pratica no Rio de Janeiro, é mais
organizado, mais desculpável e mais... temperado.
Organizado porque ocorre uma vez por semestre, em terreno
de caça de cada favela, reconhecido aliás como tal; porque
os autores da proeza se dão ao luxo de avisar, com dias de
avanço, os comerciantes amigos que lhes foram dando uns
sorvetes ou chocolates.
Desculpável porque aquela gente toda vai a pé, direitinha ao
objectivo; não se podendo impedir as pessoas de andar na rua,
a coisa acaba quando para tanto é dado sinal, ou seja, ao
aparecer um helicóptero da Polícia Militar, disparando rajadas
de metralhadora como aviso de que a festa acabou, sem visar
ferir quem quer que seja.
Temperado porque é raro haver agressões. Vai tudo à frente, mas
são sobretudo os bens das lojas que se eclipsam.
Enfim as ondas da Praia de Carcavelos deixaram de ser paraíso
para os surfistas. A de ontem, se algum encontrou, começou logo
por lhes anexar a prancha...
Leitura Matinal -23
Nesta manhã, sem prosa excedentária, publica-se
um poema da Mãe daquele que para Vós escreve.
O SONHO FICOU VAZIO
O sonho ficou vazio...
E já nem choro, nem rio,
Nem mesmo já sei falar.
E vivo assim absorta:
A minha ilusão morta
Sufoco no meu calar.
Ó oásis do meu sonho...
Ó meu ideal risonho!
Ruíste, Grande e Belo.
um poema da Mãe daquele que para Vós escreve.
O SONHO FICOU VAZIO
O sonho ficou vazio...
E já nem choro, nem rio,
Nem mesmo já sei falar.
E vivo assim absorta:
A minha ilusão morta
Sufoco no meu calar.
Ó oásis do meu sonho...
Ó meu ideal risonho!
Ruíste, Grande e Belo.
Friday, June 10, 2005
Perspectiva Casual
O Dia do País parece ser a altura ideal para
reflectir, ainda que com ligeireza, sobre alguma
vertente do carácter nacional. Na semana que
está a findar, insurgia-se, ao almoço, o meu Amigo
Alcino Gonçalves, contra os abusos, mais do que
contra os usos, da expressão "por acaso". Dizia
ele «Por acaso o bolo ficou muito bom. É um
disparate, ficou bom porque alguém o soube fazer.
Por acaso ele jogou muito bem. O acaso nada
tem a ver com isto, jogou bem porque tem jeito e terá
treinado para isso».
É interessante pensarmos com detença estes bordões do
nosso linguajar quotidiano. Miguel de Unamuno ficou nos
anais ao qualificar - ou desqualificar, o que, para o
caso, dá no mesmo - o povo espanhol como «um povo de
invejosos», reservando para nós, aqui mesmo ao lado, o
epíteto de «povo de suicidas». Sobre a designação que
nos legou, espero falar um dia. O que importa à
questão em apreço é verificar em que medida a apontada
recorrência linguística que, aparentemente, retira o
reconhecimento ao mérito, nos poderia fazer participar,
de alguma forma, num carácter hispânico, segundo a mordaz
elaboração unamuniana.
Não parece que se deva reconduzir esse hábito de conversa
à inveja. Julgo que ele radica, ao invés, no medo de passar
por ingénuo, que assombra grande parte do mundo masculino
português urbano. Exactamente o mesmo quadro mental que leva
à exclusão de formulações que exprimam admiração por qualquer
figura viva. Em qualquer roda de conhecidos, muitos dos que
estariam predispostos a tais juízos deixam-nos cair, face ao
inelutável receio de que um dos interlocutores saiba ou finja
saber alguma coisa sobre o indivíduo a louvar, que fizesse o
seu confessado admirador cair no ridículo. A admiração por um
contemporâneo está, assim, condenada, como prática de rústicos
com vistas curtas.
A única admiração por outrem bem vista e unânime passa, portanto,
a ser a tributada aos falecidos. E a consequência destes truques
e automatsmos de convivência é perversa: porque onde se dilui o
reconhecimento do mérito, esbate-se igualmente a visão clara das
responsabilidades...
reflectir, ainda que com ligeireza, sobre alguma
vertente do carácter nacional. Na semana que
está a findar, insurgia-se, ao almoço, o meu Amigo
Alcino Gonçalves, contra os abusos, mais do que
contra os usos, da expressão "por acaso". Dizia
ele «Por acaso o bolo ficou muito bom. É um
disparate, ficou bom porque alguém o soube fazer.
Por acaso ele jogou muito bem. O acaso nada
tem a ver com isto, jogou bem porque tem jeito e terá
treinado para isso».
É interessante pensarmos com detença estes bordões do
nosso linguajar quotidiano. Miguel de Unamuno ficou nos
anais ao qualificar - ou desqualificar, o que, para o
caso, dá no mesmo - o povo espanhol como «um povo de
invejosos», reservando para nós, aqui mesmo ao lado, o
epíteto de «povo de suicidas». Sobre a designação que
nos legou, espero falar um dia. O que importa à
questão em apreço é verificar em que medida a apontada
recorrência linguística que, aparentemente, retira o
reconhecimento ao mérito, nos poderia fazer participar,
de alguma forma, num carácter hispânico, segundo a mordaz
elaboração unamuniana.
Não parece que se deva reconduzir esse hábito de conversa
à inveja. Julgo que ele radica, ao invés, no medo de passar
por ingénuo, que assombra grande parte do mundo masculino
português urbano. Exactamente o mesmo quadro mental que leva
à exclusão de formulações que exprimam admiração por qualquer
figura viva. Em qualquer roda de conhecidos, muitos dos que
estariam predispostos a tais juízos deixam-nos cair, face ao
inelutável receio de que um dos interlocutores saiba ou finja
saber alguma coisa sobre o indivíduo a louvar, que fizesse o
seu confessado admirador cair no ridículo. A admiração por um
contemporâneo está, assim, condenada, como prática de rústicos
com vistas curtas.
A única admiração por outrem bem vista e unânime passa, portanto,
a ser a tributada aos falecidos. E a consequência destes truques
e automatsmos de convivência é perversa: porque onde se dilui o
reconhecimento do mérito, esbate-se igualmente a visão clara das
responsabilidades...
Deficit Obscuro, Bruscamente Iluminado
Constituiu motivo de troça e de espanto, nos noticiários
televisivos de ontem, o facto de muitas figuras da nossa
classe política se declararem há longo tempo cientes da
dimensão do buraco, sendo a notória excepção o Eng.º
Sócrates. Não admira, nestas coisas, o Primeiro-Ministro
- como o marido, noutras - é sempre o último a saber. E só
espero que não recomecem lengalengas do género «eu
sei que o Senhor sabe que eu sei que...». Já enjoa!
televisivos de ontem, o facto de muitas figuras da nossa
classe política se declararem há longo tempo cientes da
dimensão do buraco, sendo a notória excepção o Eng.º
Sócrates. Não admira, nestas coisas, o Primeiro-Ministro
- como o marido, noutras - é sempre o último a saber. E só
espero que não recomecem lengalengas do género «eu
sei que o Senhor sabe que eu sei que...». Já enjoa!
Leitura Matinal -22
Hoje celebra-se o Dia de Camões, de Portugal
e das Comunidades. Outrora chamavam-lhe Dia
da Raça; todavia, esta é um conceito que, quer
sob o ponto de vista étnico, quer psíquico, já
conheceu melhores dias. Sem qualquer conexão
com a presente data, antes simples perplexidade
existencial aplicável a qualquer anónimo ponto do
ano, lá vai, de Marcelino Vespeira
HOJE
O dia não foi meu
e tantos outros que o não são
erro no calendário
ou voluntária distracção
E os dias que foram meus
gestos de outros são
que se dão a quem os quer
nos dias que o não são
E da pressa de os perder
do cansaço de os contar
ganho vícios da noite
que me sabem perdurar
e das Comunidades. Outrora chamavam-lhe Dia
da Raça; todavia, esta é um conceito que, quer
sob o ponto de vista étnico, quer psíquico, já
conheceu melhores dias. Sem qualquer conexão
com a presente data, antes simples perplexidade
existencial aplicável a qualquer anónimo ponto do
ano, lá vai, de Marcelino Vespeira
HOJE
O dia não foi meu
e tantos outros que o não são
erro no calendário
ou voluntária distracção
E os dias que foram meus
gestos de outros são
que se dão a quem os quer
nos dias que o não são
E da pressa de os perder
do cansaço de os contar
ganho vícios da noite
que me sabem perdurar
Thursday, June 09, 2005
Leitura Matinal - 21
Pairam ameaças várias sobre todo aquele que pretende seguir
os caminhos do misantropismo. Mesmo que, umas face às
outras, tenham sinal contrário.
Um perigo grave é cair na viciação,ou seja, num ensimesmamento
acéfalo que abstraia do Mundo, conducente à insensibilidade rude e
abjecta, que resulta do indigente estado de espírito em que se deixa
de prestar atenção ao que nos rodeia.
Outro, no polo oposto, é a tentação de desistir, o estado de fraqueza
a que a solidão do raciocínio e das escolhas impopulares pode levar,
com a concomitante ânsia de arrepiar caminho e a possibilidade de
redundar num desespero fragilizante, à beira das mais radicais das
desistências, similar ao pintado por José Régio em
SOLUÇO NA NOITE
Piedade, vento! Cala essa canção soturna
Uivando ao longo dessa interminável furna...
Cala-te! eu fico a ouvir-te e a ouvir-me em teu lamento,
E vou contigo, atrás do meu fadário, vento!
Mas sobre a grande, velha e rude casa, rouco,
O vento sarabanda o seu bailado louco,
E o casarão, que estala em plena escuridade,
Lembra uma velha nau entregue à tempestade...
Piedade, vento! Em vão me encolho neste leito!
Levas atrás de ti meu pobre ser desfeito...
E em trapos, já sou eu, já não és tu quem chora
Por esses becos ruins, por essa noite fora...
Mas a janela treme, o sonho geme, e a chuva
Contra as vidraças bate os negros véus de viúva,
Estorce a cabeleira, ergue caudais de lágrimas,
E quantas aflições eu tento arredar, abre-mas...
Piedade, chuva! Eu sei que não resistiria
A um não sei quê de imenso, e informe, que me espia,
(O medo da loucura ou o simples Medo!) só
No meu palácio em ruína alcatifado a pó...
Mas sobre a grande, velha e rude casa, crescem
As bátegas dum mar que os ventos enfurecem,
E, de roldão, em mim, do abismo das idades,
Vêm à tona avós gritar nas tempestades...
Piedade, chuva! Inerme ao fundo deste quarto,
Eu já nem sou senão o mal que herdei de parto:
Sangue de santos, vis, aflitos, doidos...,-côro
Que se me evoca, chuva, em teu medonho choro...
Mas pelos muros nus escorre a chuva, alaga
O quarto em que agonizo, e a pouco e pouco, vaga,
A Sombra que me espreita e me persegue-avança
A imensa espectral mão na noite sem esperança...
Piedade, noite! Abrindo a imensa espectral mão
Que me sufoca como a tampa dum caixão,
Aquela Sombra agarra a tua sombra e vem
Sugar-me em seu feroz tentáculo de além...
Mas sobre a grande, velha e rude casa, a noite
Só solidão me dá por seio a que me acoite,
E eu luto sem saber com quê, com quem, eu morro
Sabendo que ninguém me há-de vir dar socorro...
Ora que mal!, que mal fiz eu à vida, aos céus,
Aos homens meus irmãos, à natureza, a Deus,
Para que lute assim a vida inteira, só
No meu palácio em ruína alcatifado a pó?
os caminhos do misantropismo. Mesmo que, umas face às
outras, tenham sinal contrário.
Um perigo grave é cair na viciação,ou seja, num ensimesmamento
acéfalo que abstraia do Mundo, conducente à insensibilidade rude e
abjecta, que resulta do indigente estado de espírito em que se deixa
de prestar atenção ao que nos rodeia.
Outro, no polo oposto, é a tentação de desistir, o estado de fraqueza
a que a solidão do raciocínio e das escolhas impopulares pode levar,
com a concomitante ânsia de arrepiar caminho e a possibilidade de
redundar num desespero fragilizante, à beira das mais radicais das
desistências, similar ao pintado por José Régio em
SOLUÇO NA NOITE
Piedade, vento! Cala essa canção soturna
Uivando ao longo dessa interminável furna...
Cala-te! eu fico a ouvir-te e a ouvir-me em teu lamento,
E vou contigo, atrás do meu fadário, vento!
Mas sobre a grande, velha e rude casa, rouco,
O vento sarabanda o seu bailado louco,
E o casarão, que estala em plena escuridade,
Lembra uma velha nau entregue à tempestade...
Piedade, vento! Em vão me encolho neste leito!
Levas atrás de ti meu pobre ser desfeito...
E em trapos, já sou eu, já não és tu quem chora
Por esses becos ruins, por essa noite fora...
Mas a janela treme, o sonho geme, e a chuva
Contra as vidraças bate os negros véus de viúva,
Estorce a cabeleira, ergue caudais de lágrimas,
E quantas aflições eu tento arredar, abre-mas...
Piedade, chuva! Eu sei que não resistiria
A um não sei quê de imenso, e informe, que me espia,
(O medo da loucura ou o simples Medo!) só
No meu palácio em ruína alcatifado a pó...
Mas sobre a grande, velha e rude casa, crescem
As bátegas dum mar que os ventos enfurecem,
E, de roldão, em mim, do abismo das idades,
Vêm à tona avós gritar nas tempestades...
Piedade, chuva! Inerme ao fundo deste quarto,
Eu já nem sou senão o mal que herdei de parto:
Sangue de santos, vis, aflitos, doidos...,-côro
Que se me evoca, chuva, em teu medonho choro...
Mas pelos muros nus escorre a chuva, alaga
O quarto em que agonizo, e a pouco e pouco, vaga,
A Sombra que me espreita e me persegue-avança
A imensa espectral mão na noite sem esperança...
Piedade, noite! Abrindo a imensa espectral mão
Que me sufoca como a tampa dum caixão,
Aquela Sombra agarra a tua sombra e vem
Sugar-me em seu feroz tentáculo de além...
Mas sobre a grande, velha e rude casa, a noite
Só solidão me dá por seio a que me acoite,
E eu luto sem saber com quê, com quem, eu morro
Sabendo que ninguém me há-de vir dar socorro...
Ora que mal!, que mal fiz eu à vida, aos céus,
Aos homens meus irmãos, à natureza, a Deus,
Para que lute assim a vida inteira, só
No meu palácio em ruína alcatifado a pó?
Upgrading
Hoje é dia de benfeitorias, úteis certamente, mas
julgo, também, necessárias, por esta palhota.
Uma Alma Boa, num gesto de piedade, acedeu, por
fim, a pôr cobro a parte da minha vera iliteracia
bloguística, ensinando-me a listar os "links" mais
activados. Aqui está, então, mesmo ao lado, a leva
inicial deles. Deliciem-se!
julgo, também, necessárias, por esta palhota.
Uma Alma Boa, num gesto de piedade, acedeu, por
fim, a pôr cobro a parte da minha vera iliteracia
bloguística, ensinando-me a listar os "links" mais
activados. Aqui está, então, mesmo ao lado, a leva
inicial deles. Deliciem-se!