O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Saturday, December 31, 2005

2006 À Vista

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A todos os Leitores e Confrades:

ATÉ PARA O ANO.

Não se Passem

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A culpa é deste senhor, aqui ao lado. A ele se deve, por ter um olhar posto no Futuro e outro no Passado a celebração da passagem do ano a 31 de Janeiro, a partir do calendário promulgado por Júlio César, que retirou o nome do primeiro mês do seu: Janus. Na Idade Média períodos houve em que a transposição dessa fronteira se celebrou no Dia de Natal e outros a 25 de Março, o dia da Anunciação. Mas com a Reforma do calendário Juliano, empreendida pelo Papa Gregório XIII, a data ficou assente, até hoje.
Já o costume da ingestão apressada das doze passas, durante as badaladas, para trazer felicidade, é devido à nossa Vizinha Espanha. Num ano de extraordinária colheita de uvas, um Rei espanhol ordenou a distribuição ao Povo dos excedentes, para que fossem consumidos na véspera do novo ano. Os Peruanos é que não estiveram pelos ajustes e, mantendo, no essencial, a tradição do Colonizador, resolveram brincar com o fogo e modificar para treze o número das bagas que chamam a sorte. Mas demos graças por não viver na Noruega. Com a frieza nórdica que mata as ilusões, os nossos Amigos Daquele País sabem que a sorte não é para todos. E a tradição deles é conforme ao realismo que os anima: fazem um pudim de arroz em que introduzem uma amêndoa. e só ao felizardo a quem ela calhe é que estará garantida a natureza auspiciosa do ano nascente.

Prazer de Pensar

Se não Vos rendesteis a ingerir o espumante pelos copos altos, preferindo-lhes a bela largura da taça que permite maior elegância nos actos de brindar e beber,
deveis ficar a saber a que a Mitologia nos conta a origem desse adorável recipiente. Estava em grande festança um trio de peso, Dionísio, Afrodite e Apolo, quando se lembraram de que a mais bela Mulher do mundo, Helena, depois conhecida como de Tróia, deveria ficar associada ao evento. Chamaram-na e logo se maravilharam com a beleza dos seios dela, identificando os mamilos com morangos e usando o conjunto como molde para um objecto que seria a avó primordial das nossas taças.
Como estou, no entanto, certo de ter Leitores que não têm paciência para os embustes mitológicos, dou-Lhes a História, em seu lugar. Precedendo a moda da Revolução de imitar as vestes e alguns hábitos que se pensavam da Antiguidade, a infeliz Rainha Maria Antonieta teve a fraqueza de se querer uma nova Helena. E assim, ordenou, realmente, que fossem feitas algumas taças moldadas a partir do seu peito. Espero que logo às minhas Leitoras e aos meus Leitores saiba muito melhor o líquido festivo, ou porque tenham presente uma homenagem aos encantos que também são Seus, ou por associações mais, como direi, (ab)sorventes...
As ilustrações são «O Rapto de Helena», de Pierre Puget e «Maria Antonieta, de Martin Il Meytens.

Pensar o Prazer

Muitos de Vós ireis alegremente deliciar-Vos com o Champagne, por volta da meia-noite, que é maneira prática e ortodoxa de deixar para trás as agruras dum 2005 pouco motivador.
E aposto que serão poucos os que pararão um momento para pensar, por um instante, no Criador dessa maravilha. D. Perignon, é o Homem. Foi ele que inventou o Champagne de borbulhas, como o conhecemos. Quer uma lenda que já anteriormente havia sido descoberto, em Inglaterra, mas não está esse facto documentado. O mais provável é ter essa versão nascido de algum súbdito britânico mais patriota, pois a biografia vínica mais aceite quer que as Ilhas apenas tenham descoberto as delícias do vinho louco, como era originariamente chamado, por acção do Senhor de Saint-Evremont, um emigrado do período pós-revolucionário. A designação "Champagne" surgiu em 1600, mas aplicava-se a vinhos normalíssimos, parecidos com os de Borgonha. Quase no fim do reinado de Luís XIV foi presente ao Rei uma das primeiras versões do néctar gaseificado, mas este e a sua mais-que-tudo Mme. de Maintenon recusaram-no, por temerem ser obra diabólica e estarem, passadas as pujanças, em período de arrependimento e penitência. Voltando ao grande monge beniditino, foi ao longo do século XVII que, da Abadia de Hautvillers, modificou o vinho tradicional da região, submetendo-o a uma segunda fermentação, em garrafa, obtendo, dessa forma, o líquido precioso com que, habitualmente, celebramos os bons momentos. Partilhava o genial descobridor com Homero e outros sábios, no final da vida, a sugestiva característica da cegueira física, que mais lhe estimulava as qualidades naturais de provador, sendo mestre na identificação dos componentes da assemblage. Foi também ele, tsoureiro e responsável pela adega conventual durante 47 anos, que "inventou" o tipo de garrafa, a introdução das rolhas de cortiça, por si conhecidas durante uma peregrinação a Santiago de Compostela, bem como dos arames com que são presas.
A fortuna do Champagne viria com a regência de Filipe de Orleães, que era homem que sabia dar uma festa. A grande difusão dele, entretanto, deve-se a Eduardo VII de Inglaterra, como muitos dos hábitos de lazer que ainda hoje adoptamos. O Rei adorava aquela bebida e, quando caçava, era sempre acompanhado por um rapaz com várias garrafas dela, prontas a servir. Imediatamente a moda pegou na aristocracia. Logo a burguesia a seguiu, para se elevar. E daí passou às classes médias, em dias de festa. Do que ainda somos tributários.

A Obra Humana

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Kerstiaen de Keuninck pintou: «As Calamidades da Humanidade».

Leitura Matinal -225

Último dia do ano. Após o balanço de mim, desvio os olhos para a contabilidade do Mundo. E, pondo num lado as Amizades que tenho e as que fiz, muitas delas aqui, caio
na melancolia mais imperante ao avaliar em que estado anda a humanidade. É hoje e agora o tempo de o dizer, que não quero estragar a festa de logo; e amanhã devemos tentar crer que algo melhorará e enviar uma mensagem de esperança. Ao ver para onde vai caminhando a humanidade lamento-a. Vendo o mal entranhado nos homens, a começar por mim, penso na imensa melancolia de Deus, que já sabia, desde o inicio o que a casa iria gastar quando a liberdade chegasse, por maçã ou caroço, aos humanos.
As calamidades previstas para a entrada no segundo milénio, ou saída do primeiro, como se queira, eram afinal velhos hábitos, agigantados por menores defesas e técnicas mais apuradas. O Fim do Mundo, que alguns se obstinaram em prever estava para a espécie como um tiro misericordioso para o condenado que tem como alternativa a submissão aos piores tormentos. E revelou-se a infantil fantasia que se viu. A Maldade de hoje só encontra rival na nossa desresponsabilização.
De Martin Guia, para essa época, com
redobrada actualidade em 2006:

NÃO FUI EU, FOI O DIABO

Deus, já mais gestor
que criador,

ao inventariar
na terra,
para efeitos de balanço,
as existências
locais
de paz e de guerra
e ao equacionar
os principais
teores de avanço
nas diversas ciências,

em Janeiro de 2.ooo
concluiu num instante

que o diabo era redundante,

porque ao fim e ao cabo
o homem, sua criação,
ultrapassara com distinção
o pobre diabo do Diabo.


Ajudam: «A Maldade», (Levi Cords) e
«Batalha de Homens Nus» de Antonio Pollaiuolo.

A Firma

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Um pacto desnecessário: «O Contrato com o Diabo», de Louis Icart.

Friday, December 30, 2005

O Voto Mais Feliz

Para os homens não posso encontrar maior felicidade na expressão
de um voto para o próximo ano do que a que o Biolante consagrou.
As Senhoras não vão lá. Olhem que a curiosidade matou o gato...

Ano Velho, Ano Novo

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Como amanhã devemos andar demasiado atarefados e acabar por demais toldados para reflectir sobre estas coisas, gostaria que Vos detivésseis por uns segundos na tentativa de dar resposta a uma pequena pergunta. A nossa artificial alegria de 31 de Dezembro para 1 de Janeiro bebe na esperança que aplicamos ao ver um nascimento, ou na repugnância com que, vezes sem conta, afastamos os nossos velhos, não valorizando o que nos deram? Chateiem-se hoje com esta, que no dia seguinte, com a ajuda do espumante, será tempo de felicidade obrigatória.

Monopólio Partidário

Estou farto de política. Amanhã prometo só em caso de força maior
falar dela. Mas, tendo chegado a casa tarde e a más horas, já tomada
a decisão de me abster do habitual repasto das Sextas à noite, para
salvaguardar o fígado para amanhã, verifiquei com surpresa que não
havia grandes reflexões sobre a decisão do Tribunal Constitucional
de rejeitar as sete candidaturas provenientes da sociedade civil,
aceitando, em contrapartida, unicamente, as que tinham apoios
partidários. Longe de mim insinuar que tão alta Instituição foi
menos imparcial do que devia. Mas mesmo que haja cumprido
integralmente os seus deveres, ou especialmente por isso mesmo,
demonstra-se à saciedade que a independência das candidaturas
é mito maior do que o do Pai Natal. Com a lei que temos é sempre
necessária uma máquina partidária. Nem que seja para resolver
atempadamente questões de forma. Eis o sistema!

No Espírito do Dia

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Esta enganou-me mesmo bem. Pensei-a uma fotografia e trata-se de uma combinação de acrílico e tinta sobre tela, de série intitulada «Reversal». Imagem que se adequa àquilo a que um penúltimo dia do ano incita: a devolução virtual de uma imagem, a que falta o elemento central que se faça reflectir. Mas a própria orla é um reflexo das preocupações do Autor. E as vias que escolhemos para as perceber multiplicam as hipóteses, em prejuízo de uma certeza preenchida que sonhamos, mas sugerindo a casa de espelhos, entre os quais somos contados, aguardando pelo visitante que traga a vida ao estabelecimento. Neste ano não foi. Será no próximo?

Pudor Ausente

Não comentarei a acusação feita ao Presidente do
Conselho italiano, Silvio Berlusconi, de ter subornado,com
ajudas de contas bancárias na Suíça, um súbdito britânico,
comprando-lhe assim o testemunho em processos por fraude
fiscal. As alegações encontram-se pouco pormenorizadas e
parece-me demasiado tosco o procedimento imputado.
Sabe-se, porém, como não ponho as mãos no fogo pela
honestidade do dono do A. C. Milan. E mesmo que esteja
inocentíssimo de todas as desonestidades que lhe atribuem,
o que receio fortemente não ser o caso, deveria ter
suficiente dignidade para não se pôr na situação de
candidato ao governo de um País, como expediente que confere
imunidades para ir adiando julgamentos. Com todas as
diferenças de pormenor, é uma fuga à justiça, como qualquer
outra. Um caso Felgueiras em ponto grande.

O Desrespeito Desapercebido

Promovida pelo «EXPRESSO», uma sondagem que conclui,
gritando para o megafone da net, que um milhão - ou dez
por cento dos portugueses são homossexuais. Que faz correr
os fautores deste inquérito? Um número não é susceptível
de alimentar os instintos espreitadores de quem está de fora;
e, pelo contrário, reduzir uma preferência num domínio tão
importante da vida a uma cifra é, potencialmente, ofensivo
para os que nele são incluídos, perdendo a sua especificidade
no grupo em que se diluem. Sou absolutamente contra a
realização de sondagens sobre características permanentes da
população, estas ou outras. Já basta as que incidam sobre aspectos
circunstanciais e mutáveis, como as intenções de voto.
A menos que se queira, acentuando a relevância de um número
que já não é diminuto, pressionar no sentido de modificações
legislativas, como no campo do alargamento à preferência
minoritária do matrimónio e da adopção. E aí o atentado é
mais grave e toca-nos a todos.


Acrescento, pouco depois de ter lido um post do FG Santos,
em Santos da Casa, onde são impugnados os métodos "estatísticos"
utilizados:
a abusiva instrumentalização dos números que o Nosso Supra-Citado
Amigo revela mais vem reforçar a suspeita de que se quer abrir
fundações espúrias para campanhas que nos façam seguir o exemplo
do Senhor Zapatero.

Pleno de Nutrições

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«O Ócio Verde», de Willard Leroy Metcalf.

Leitura Matinal -224

Olhar o verde como a vida. Portador da Esperança da meninice, para a qual tudo é uma descoberta e fonte de interesse, atravessando confiante nas respostas que obtém e temendo a única ausência que
consegue captar, a da luz que a faz crescer, sem que se aperceba da omnipresente e muito mais letal ameaça que aumenta sempre e sempre espreita. Do desassossego que tirou, quer das descobertas, quer dos receios, gerou o interesse que a fez desabrochar, atingindo o apogeu da beleza e a fertilidade.
Sempre porém ameaçada pelo espectro crescente e envolvente de que a ausência dos sons que alimentaram a exstência vá, progressivamente, conquistando o terreno que lhe é cedido pelo adormecimento da vitalidade que em cada um mais difícil é de manter, face às condicionantes exteriores. Até que a desistência faça a entrega final, termo da brancura desguarnecida que a memória e o élan já não resgatam.
De Eugénio de Andrade:

ESSE VERDE

Entre o verde complacente
das palavras corre o silêncio,
assim como um cabelo
cai - ou neve.

Já foi uma criança, esse verde,
inquieta de tanto olhar
a noite nos espelhos -
agora encostada ao meu ombro
dorme no outono inacabado.

É como se me fosse consentido
conciliar a flor do pessegueiro
com um coração fatigado,
essa criança que no vento
cresce simplesmente ou esquece.

Vai perder-se, não tarda,
vai perder-se na água sem memória,
assim como indiferente cai
um cabelo - ou neve.


Com «Pessegueiro em Flor», de Van Gogh e
«O Silêncio Sob o Oculto», de
John McCormick.

A Música da Vida

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«Anjo em Verde com Violino», de Leonardo da Vinci.

Fechar o Ano em Beleza

Com o grande post do Rafael, tocando contra-revoluções várias,
em A Casa de Sarto. A não perder.

Restabelecimento

O facto de ter vindo a ser crítico de muitos pontos da sua
acção governativa não obsta a que aqui exprima o meu
voto de que o Eng.º Sócrates se restabeleça rapidamente
da lesão que contraiu a esquiar. Que o Ano Novo seja melhor,
em todos os sentidos.

Balanço

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Não sou demorado. Declaro sempre «contabilidade desorganizada». Todas as entradas ficam rodeadas da minha gratidão e os custos enviados para o limbo dos arquivos, sem outro afecto que o do ensinamento. Sempre na esperança de que a aprendizagem dê asas, mas na certeza de que as armadilhas são mais do que suficientes.
«Lembrando o Passado Olhando para o Futuro», de Fredi Taddeucci.

Thursday, December 29, 2005

O "Quiromante"

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Inspirado pelos belíssimos textos em que a Viajante se tem espelhado, pensei em que realidade deveria um complexo humano colocar diante da polida superfície que o revertesse com acréscimo de conhecimento; e qual o meio privilegiado de interpretação. Não andarei longe das conclusões que se impõem se disser que cada individualidade será o resultado da operação multiplicadora em que um dos factores esteja no conjunto de traços únicos, que encontram emblema nas linhas da mão e o outro nas leituras que sobre eles tiveram influência. Seria isto que teve presente Wolfgang Lettl em «Espelhando»?

Fui à Bruxa

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Neste tempo de segunda ordem, intervalar entre festas fortes, resolvi recorrer a meios de conhecer o futuro que se perdem nas névoas da história. Tendo entrado na barraca de uma recomendada profissional da previsão, este coração generoso que é o misantropo desatou a inquiri-la sobre os próximos tempos também no que toca à vida dos Amigos. Quando mencionei o nome de Eurico de Barros, eis o que deu a bola de cristal : C. T., pois então.

Record Transsexual

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Àqueles de entre os meus Leitores que apenas tenham a objectar questões concernendo a idade em que o Senhor Zhao Changshang decidiu mudar radicalmente a vida, sexo incluído. Resolveu este ex-cavalheiro chinês assumir a sua feminilidade por meios cirúrgicos, após um casamento de 21, em que foi pai de uma rapariga que agora o repudiou. Não foi coisa por aí além. Bastante mais velhinho é o Édipo e vejam a opção que tomou. Este dado pode é prejudicar a bíblia dos freudianos, a menos que se faça uma versão revista que dê como sáficos os amores dele com a Jocasta...

Rupturas e Continuidades Americanas

Para todos aqueles que pensavam ser o Presidente Bush a
força de todos os males que, indiscutivelmente, para a
visão europeia, envolvem a acção externa dos EUA, devem
ser bem perturbadoras as notícias que dão a transferência
de prisioneiros a interrogar (para ou)ilegalmente pela
CIA como tendo começado durante a administração Clinton
e por ordem, ou carta branca deste.
Não há que admirar. Ainda voltarei ao tema. Mas organismos
como a Agência, ou o FBI, ou muitas outras sedes de recolha
de informação, ou de investigação, de que geralmente se não
fala, têm uma autonomia e uma linha de acção prolongada que
não é hábito ver inflectida com a mudança de governantes. O
caso de Hoover é lendário, assistindo a uma sucessão de
presidentes tipo centopeia, enquanto permanecia, com toda
a tranquilidade, à cabeça do Bureau. A intervenção americana
no Mundo, como a repressão doméstica do crime, assentam em
linhas de força que não dependem das eleições. Tenho pena
de todos aqueles que contestaram W sob este específico ponto
de vista, pois terão de reconverter as respectivas miras contra
o próximo chefe de estado americano, salvo, talvez, se vier a
ser McCain, que fez da oposição à tortura de presos uma bandeira.
E havia tanto na inovação política de Bush II para atacar com
credibilidade... Não a política económica, que começa agora a dar
frutos, com aumento da confiança dos consumidores e decréscimo
no preço dos combustíveis e dos índices de desemprego. Mas sim,
por exemplo, na política ambiental, em que a actual Administração
tem culpas tremendas em atentados vários, para mais, carregados
com suspeitas conexões empresariais.

O(s) Queixinhas

Na presidencial corrida, como no futebol, a marca a fogo dos
derrotados, impotentes para fazerem melhor, ou dos que como
tal se vêem, sem certezas de que isso venha a acontecer, encontra
alívio na culpabilização dos jornalistas. Nos clubes a coisa resolve-se
com um black-out. Mas na política há a percepção de que o
castigador passaria a castigado se não aparecesse a dar entrevistas,
ou a protagonizar conferências de imprensa.
É que os expoentes da partidocracia não têm outro espectáculo para
oferecer... E o cúmulo atinge-se ao censurar as fotografias publicadas,
não endereçando uma auto-crítica ao desgraçado modelo que,
realmente, definiu as caretas e posições descontroladas que as câmaras
fixaram.
Mais substância teriam as observações contra o domínio do panorama
da comunicação social pelos grandes grupos. Mas não feitas por quem,
noutros tempos, disse cobras e lagartos do adversário de hoje, por tardar
em prescindir do monopólio estatal na televisão.
Telefonar-me-ia o Dr. Pangloss, dizendo; «Oh, misantropo, olhe que
podia ser muito pior. Imagine que havia arbitragem, como na bola!».

Impegável

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«Bumerangue», de Daniel Senise.

Leitura Matinal -223

Quando, enfim, satisfeitos os nossos apetites de interrogação do proprio íntimo. dirigimos a nossa indagação a um impreciso mas urgente exterior, sofremos com a ausência de retorno, ou dum
retorno determinado. Essa agonia de vermos devolvidas como que por uma parede, todas as importantíssimas questões que colocámos, quais poseurs do diálogo, quando a nossa demanda mais não visava que aquietar-nos, torna qualquer um insensível ao que de belo e sereno possa ter o retorno das dúvidas de que, na nossa obcessão,
nos queríamos livrar. É na falta do reconhecimento do valor único da demanda e da sua continuidade que nasce a desesperada vontade de saber e de, se necessário for, sofrer, de modo a que fiquemos garantidos contra a solidão, a qual temos por morte em vida. Não nos apercebemos, vendados pela atracção pelo impreciso, que concretizá-lo seria o fim, muito mais temível do que a audição cambiada da nossa voz que a ninfa invisível nos envia. Se obtivéssemos o que queríamos, cair-se-ia no massacre das mãos que atiraram o bumerangue, pois ele voltaria revestido das farpas cortadoras da carne.
De Fernando Vieira:

Provéns da língua indígena da Austrália
Antípoda palavra bumerangue.
Saúdam~teos poetas que encontraram
Uma rima selvagem para sangue.

Como arma de arremesso que te assumes,
Levas veloz o espaço de vencida.
E dando corpo ao eco do teu voo
Voltas intacto ao ponto de partida.

Porém, o que interrogo, o que procuro,
Tudo o que atiro ao vento, noite fora,
Retorna com disfarces silenciando
Aquilo que pergunto e que me ignora.

No apelo que te faço, bumerangue,
Mais a nossa distância se avizinha:
Tu, na língua selvagem que te é própria.
Eu, na linguagem mansa que é minha.

Por isso, bumerangue, tu que partes
E voltas traz-me vinda não sei donde
Não a harmonia do teu voo intacto
Mas a resposta ansiada que se esconde.


Para rimar com o poema, trouxe, pleno de azul,
«O Eco Eterno», de Brownyn Bancroft.

Retorno Incógnito

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«Interrogando-me», de Nathan Jensen.

Não Há Períodos Mortos

A Globalização é uma circunstância estranha. À força de tanto
ser abordada nos Media, sem a correspondente dosagem de
concretas exemplificações que a generalidade das pessoas possa
entender, gerou a desconfiança em quem só crê no que vê - e não
tem vistas muito largas - de que se trata de "discurso para enganar
o ", sem correspondência real. Os mais atentos dão, todavia, bem
por ela. E se os seus opositores vocais recuperaram o extremismo
contestatário e manifestante de fins de 60´s do Século XX, por
acharem que ela traz demasiada desigualdade, outros há, como este
alarmado e alarmista escrevedor, que metem um olho pelo outro,
por lhe temerem o discurso igualitário que exibe, por detrás
do qual se concentram poderes sem vinculações, ardendo por
destruir especificidades estimáveis. Um pouco, fora do domínio
do pensamento puro, a oposição entre os leitores de Marx e os
de Nietzsche, nos fins de oitocentos. Mas para quem acredite
não ser esta época de férias boa para grandes voos teóricos,
tomo a liberdade de chamar a atenção para um dos mais importantes
posts que vi publicados na net, nos seis meses que levo, cá.
Ide ver e reflectir sobre o que nos diz o Rodrigo, no Batalha
Final
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Wednesday, December 28, 2005

Homens à Venda

Por uma daquelas injustiças em que a História é fértil, um
Primeiro-Ministro inglês de outrora, Walpole, ficou imerso
na fama de ter dito «Todos os homens têm um preço», com a
intenção de se gabar de conseguir corromper o mais renitente,
quando teria dito «Todos estes homens têm um preço», falando,
com nojo, dos seus ministros.
Hoje morreu alguém que perfilhava a falsa opinião do Estadista
Britânico. O homem mais rico da Austrália, um magnata da T.V.,
que metamorfoseou as regras competitivas do cricket australiano,
com novas organizações de campeonatos e calendários inovadores,
depois de não terem acedido a conceder-lhe todos os direitos de
transmissão televisiva que pretendia. Quando ainda os estava a
negociar, teria dito: «Cavalheiros, há um pouco da pega em todos
nós. Qual é o vosso preço?».
Para aquilatardes da mentalidade do falecido, dir-vos-ei que tinha
por herói Genghis Khan e dele dizia: «Não era muito digno de ser
amado, mas era tremendamente eficiente».
Creio que é pelos afectos e aversões que melhor se pode avaliar
um homem.


Nota: "pega" foi a expressão encontrada para traduzir "whore".

Congratulação e Esperança

Acabo de ouvir, no noticiário da TVI, que a operação a que
foi submetido Alfredo DiStefano correu bem, embora o estado
actual envolva alguma fragilidade. Ao Nosso Amigo de Espanha
quero reafirmar o meu contentemento pelo que de bom se passou
e a confiança no que a seguir venha. Um abraço.

Não Metam Água!

Espero que as vozes dos Habituais Detractores não se levantem
para agoirar contra a FONTE de virtudes que o meu Clube acabou
de contratar.

Um Rebento! Também um Portento!

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Lembram-se desta sereia, Daryl Hannah de seu nome? Quem quiser conhecer a genealogia da Menina pode encontrá-la no magnífico estudo que a Zazie fez dos antepassados dela...

Enviados Especiais 3

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O Águia de Alverca enviou-me mais esta magnifica fotografia, cuja autoria ignoro se deve ser imputada a Ele, ou à sua Cara Metade: «Estremoz ao Entardecer». Dedico-a a todos os meus Leitores Alentejanos, com Esse Ex-Libris que é o Exemplo para todos os bloguistas, o Grande Manuel Azinhal.



Em Tempo (02/01/2006, 21.15h): soube agora que a autoria pertence à I. Mais do que uma Esperança, trata-se de uma Certeza da Fotografia Nacional.

A+B?

Duas manchetes do «CORREIO DA MANHû: «Famílias Portuguesas
Endividadas» e «Portugueses Lideram o Turismo Sexual no Brasil».
Espera-se que as duas situações descritas não estejam ligadas.
Assim como se lê, na segunda notícia, que os nossos compatriotas
«procuram sobretudo sexo com adultos». Pois. O advérbio é que
me não deixa sossegado...

O homem e o Regime

Com mérito polemista indiscutível, Vasco Graça Moura evidencia
hoje, na sua coluna de opinião no «DN» a menoridade ética em
campanha e a mediocridade absoluta como chefe de estado de um
dos actuais candidatos presidenciais. O que diz do indivíduo é
mais do que incontestável. Onde discordo é no título do escrito.
Achar quem desempenhe melhor que o visado um qualquer
cargo político é tão fácil como era para a Anita do anúncio saltar
à corda. Querer ver nele o desprestígio da república é que me
parece deslocado, pois não pode desprestigiar-se o que não tem,
à partida, qualquer capital acumulado nesse campo. O indivíduo
de que VGM trata limitou-se, sem hombridade ou educação, a
levar às últimas consequências o espírito so sistema, que assenta
no conflito. Quereriam o Prof. Miranda e os sonhadores pais de
todas as constituições que esse conflito se esgotasse na eleição e
que, a partir daí, todos os eleitos trabalhassem, conjuntamente,
para o bem da nação. É desconhecer os homens; e, em especial,
estes homens. Ganha uma eleição, o vencedor começa logo a
pensar na próxima e, se barrado pela lei nesse intento, numa
impensável vida política futura. Quando não há escrúpulos - e
neste regime como pode havê-los? - o Presidente não encontra
melhor forma de defender os seus interesses do que afrontar o
governo. Eanes contra os vários P-Ms que conheceu. O seguinte
contra Cavaco; e até uma pessoa tão aparentemente mansa como
o Dr. Sampaio com a dissoluçãozita do santanal governo menos
de cinco mesitos depois da posse. Neste último caso pareceu a
decisão legitimada pela inabilidade de escolhas e de declarações
dos governantes de então e pela ampliação delas que uma deliciada
imprensa fez, num estranho ajuste de contas que ainda está por
dilucidar. Eanes tinha uma fundamentação no facto de o regime
ainda estar a ser construído. Só o sujeito que ocupou Belém entre
os dois não encontrou razão de agir maior que a da sua ambição
pessoal e política. Diz isto muito da insuficiência do homem,
mas também da malignidade do sistema que o permite. Claro
que ele levou a intriga ao extremo que agora se revela, mas já
então se constatava. Contra os governos que conheceu, como,
igualmente, no seu próprio partido, vitimando o Dr. Constâncio.
E usando as patacas de Macau para o pior: favores aos seus
serventuários e formação da mais duvidosa das classes governativas,
a dos Coelhos, Costas e outros Melancias.
Não, por muito viciada que se ache a actuação de um grão de areia,
o problema está no deserto que é esta república partidocrática, a qual
insiste em enfeitar-se com o nome usurpado de democracia. Assim,
quando Alguém da envergadura de Vasco Graça Moura diz que
o questionado contendor nestas eleições representa «um alto risco
para a democracia» pode o perigo de tomar estas palavras à letra
dar ao mais desprevenido ganas de votar nele, para ver se este nojo
acaba de vez. Mas isso seria dar demasiada confiança a um jogo de
rejeitar.

Ousadia Perdida

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«Aquiles Lamentando a Morte de Pátroclo», de Nicholas Gay.

Leitura Matinal -222

Ao Luís Graça

Em tempo de balanços altura é de reconhecer o quão hipotecadas estão as nossas existências ao estatuto de impotentes da dor. Se na morte de um familiar ainda se aceita um alívio da contenção, raras vezes recenhecem os outros e reconhecemos nós
próprios a faculdade de chorar um amigo falecido. Refugiamo-nos nos tiques desajeitados que o convívio com outras relações do morto obriga, ainda assim gestos; que como gesto não gostamos de pensar a nossa voragem interior, a qual começa na abertura de horripilantes fendas no chão que pisamos e acaba na forçada melancolia.
Porque os sinais que emitimos "não podem" ser esses. Porque qualquer lamento mais expansivo é uma jeremíada fora do lugar, que só traz embaraço aos outros. É quando sentimos o ferrete desta perda que também não foi dissolvida no tempo nem gerada por opção do que perdemos, como essas outras mortes de amigos que emergem do afastamento e não originam lutas interiores que excedam o encolher de ombros oficial. Na morte física de um amigo Vemos a nossa pessoa coagida a fazer não sabemos o quê, mas, em todo o caso, a mostrar-se o menos possível. Enquanto que desejaríamos fazer não sei o quê, que fosse muito além do possível. Vivemos no decadente conflito que pensa ser a assunção da dor a exibição dela. Aquiles não se envergonhava de chorar Pátroclo. Mas vivia na Idade dos Heróis. Que não é a nossa.
De Fernando Lemos:

Quando morre um amigo
os telhados descem de nível
para fugirem tôrres de moscas
e o ar mastigar o nervo da língua

perdem-se as mãos nos bolsos
com vergonha
e o vento arranha o pente dentro dos cabelos moles

os animais engolem ninhos nos museus
e vão romper as estradas de couraças roídas

quando morre um amigo
caem por copos os sobejos da Natureza
os acordeões de barro ficam mesmo roucos
e suspendem-se no quarto com cheiro a farmácia

morre um amigo
e é um fim de espectáculo

rolam as solas de madeira sôbre a borracha
vêm os corvos urinar nos crânios dos deuses

estabelece-se uma enorme ventania
desenhando ladrilhos entre ossos
gritam mulheres deitando espelhos ao mar

enquanto as crianças mudam apenas de jardim:
é o ninguém baixar quando rolam as moedas

quando morre um amigo sinto vergonha

as bruxas de custódia em punho
dão horas particulares
e os cais motorizados fortificam-se
quando morre um amigo

ficam as nuvens de fora do alcance do azul
perco a condução
encosto o nariz na vitrina comercial
ocultando com o andaime as feridas
com que a vida me costuma vacinar

olho o céu quando morre um amigo
para criar um abismo entre dois pés
olho as paredes que são sempre quatro
e cabe-me a vida dentro de um copo
sobejos da Natureza

o frio vem tarde nas torneiras distantes
sempre que morre um amigo

sempre que morre um amigo
é um fim de espectáculo


Seguem também «Morte de um Amigo», de Keith Theriot e
«Morte com uma Seta», de H. Hondius.

Incomodor

.

«Luto», de Georgina Griffiths.

Tuesday, December 27, 2005

Índices de Progresso

Acabo de ouvir, no «JORNAL NACIONAL» da TVI uma por que
não esperava, de todo. No seu comentário semanal, Miguel
Sousa Tavares citava como indicações estimáveis da aproximação
de Portugal aos países evoluídos
, a alta taxa de computadores por
habitante, o que se corrobora, a grande percentagem de telemóveis,
o que, embora com resmunguice, se aceita e... o crescimento do
número de divórcios. Esta é que é ideia absolutamente peregrina. E
prosseguiu, exultante por «termos chegado tão de pressa tão perto
dos outros, ao ponto de parecermos um país nórdico»...
Depois venham lá dizer que o Velho Botas é que era provinciano!
Que se considere um determinado divórcio como um progresso
concreto numa relação deteriorada, em pessoas que nem religiosa
nem eticamente façam finca-pé da posição a eles contrária, ainda
percebo. Agora, considerá-los, no seu aumento abstracto, um
sintoma de melhoria da situação nacional é que não lembraria ao
Diabo!

A Dura Resposta

.

Alguém me sabe dizer em que moda vai parando a novela da contratação de Charlize Theron para interpretar a bond girl do próximo filme da saga? A última versão que vi dava-a como tendo rejeitado o papel, o que acho estranho, depois do interesse manifestado; e que não vejo como possa constituir publicidade que a beneficie. A menos que tenha descoberto que o novo 007 não é o diamante habitual, o que já tem transpirado, com notícias de o corrigir politicamente aqui e ali. Assim compreende-se, porque, como demonstra a fotografia, ela adora minerais...
Más notícias para o Eurico!

Ver Estrelas no Leito

Calma, desta vez não é sobre sofrimentos, voluntários ou não.
Foi agora divulgado um inquérito realizado junto das estudantes
norte-americanas, pela «PLAYBOY», o que sendo estranho é,
pelos vistos, não só permitido, como bem tido. A pergunta
sacramental a que as raparigas tinham de responder era quais
as três estrelas do show business com quem não se importariam
de partilhar a intimidade, mesmo que, para isso, tivessem de
enganar os respectivos namoradinhos. Dois nomes reuniram
nomeações das moças em quantidade superior aos 50%. Para
ver quais foram e os respectivos scores, veja-se o primeiro
comentário.
Ah, é verdade, não ponham as Vossas filhas a estudar em
instituições de ensino norte-americanas.

A Comemoração do Dia

.

Com todos os problemas de saúde que atravessa, Elizabeth Taylor festeja hoje o respectivo aniversário. Não deixa de ser irónico que tendo encarnado nas fitas papéis de contraste entre a saúde física e situações de fragilidade psíquica, como a escaldate gata que punha as culpas no zinco, ou a escaldada protagonista de «Bruscamente, o Verão Passado», seja agora o corpo que traga sofrimentos a esta capricorniana. O voto de um pobre cinéfilo é que o dia de hoje marque o início de uma fase melhor e que ainda a tenhamos entre nós muito mais tempo.

Questões de Consciência

A demissão de um Magistrado espanhol de Pinto, por questões
jurídicas e de convicção, não lhe sendo possível aceitar a celebração
de casamentos que não entre pessoas de géneros diferentes e porque
considera incompatível a posição pública de que agora se retira
com a intervenção jurídica que a questão, para si, requer, tem alguma
semelhança, com outra, ocorrida anos atrás, mas dela diverge em
pontos capitais. Falo da abdicação por um dia do anterior Rei da
Bélgica, Balduíno, que não queria ver a sua assinatura no diploma
extensor da liberdade de abortar, por repugnar à sua consciência de
católico. Ambas as atitudes são susceptíveis de sossegar as
consciências dos seus Autores. Mas enquanto que o ex-Soberano
contou com o apoio do Parlamento e do Sucessor Familiar, que
agiram concertadamente de forma a fazer tudo voltar à mesma,
dois dias depois, o Cavalheiro espanhol que agora cessa funções
corre sozinho.
Outra diferença de tomo é que, no caso da Bélgica, o Chefe de
Estado sabia que a lei iria para a frente e que nada, no futuro,
faria contra a sua aplicação. O que não é o caso do diploma
legislativo da Espanha de hoje, que o demissionário tenciona
combater, dentro dos limites da legalidade.
Por tudo isso e também pela rede que Um tinha e que ao
Outro de todo falta, os graus de admiração que ambas as
condutas merecem são de ordem diversa. Trata-se, em
qualquer dos casos, de demarcações que honram. Mas
onde uma é apenas discordância, embora fundamental,
a outra é luta. E trata-se de deixar ou não a pele...

O Estado Actual

.

«O Jardim Sombrio», de Yves Tanguy.

Leitura Matinal -221

Tempos passados, os do idílio entre Rei e gentes, do qual a Rua era festa permanente sem a motivação escapista da diversão que combate um cansaço com outro, esse solipsismo que reduz ao próprio indivíduo e às companhias habituais o gasto do tempo
que se não tem! Passado o Tempo da absoluta comunhão entre alegria pública e privada, começaram as vozes dissidentes da malevolência a toldar a parte de felicidade dos nossos Soberanos, adivinhando já no meio das saudações a farinha e o fermento dos insultuosos revolucionários do dia seguinte. Que, passadas as alterações mediocrizantes, deixariam desertas as calçadas tornadas mais estreitas aos olhos amargos de um qualquer imparcial espectador, quanto mais nos que mantêm no seu coração o afecto,
se não a fidelidade, pela forma do Estado e a Herança Humana de quem fez a grandeza tranquila mas empreendedora dos seus Avós. Está madura a pobre fruta para ser assaltada pela derradeira e mais decadente época, a que assiste ao apagar dos restos da Beleza que
a luz do Sol e a tranquilidade das pedras antigas, combinadas, ainda proporcionavam. Estamos agora sob o império das iluminações artificiais fracas, condenados à pior das ressacas, a que sabemos permanente, arrastando-nos em terras sem memória de Realeza, tão desprezíveis que excitamos a piedade de um derradeiro ser de elite que insista em cirandar por tão tristes artérias - um gato, ainda que vadio. E, sob o peso da imensa decepção, irmana-se quem escreve ao Jeremias actualizado de que fala o Poeta. Mas sempre tendo presente que esse choro deve revestir uma dupla virtude: a de nos impedir de amar o Passado como ruínas cujo conhecimento aplaca a vontade de o fazer reviver, bem como a capacidade de se transformar na semente da acção que lhe permita retornar.
Do Poeta Brasileiro Raimundo Correia:

SAUDADE

Aqui outrora retumbaram hinos;
muito coche real nestas calçadas
e nestas praças, hoje abandonadas,
rodou por entre os ouropéis mais finos...

Arcos de flores, fachos purpurinos,
tons festivais, bandeiras desfraldadas,
girândolas, clarins, atropeladas
legíões de povo, bimbalhar de sinos...

Tudo passou! Mas dessas arcarias
negras e desses torreões medonhos
alguem se assenta sobre as lages frias;

e em torno os olhos úmidos, tristonhos,
espraia, e chora como Jeremias,
sobre a Jerusalém de tantos sonhos!



Com uma rua calcetada de Roger Duvall, «A Tristeza do Rei»,
de Matisse e uma fotografia da decadência.

Dias Felizes

.

De Antonio Joli, «O Cortejo Real em Piedigrotta».

Indico-Vos O Caminho

Não. Não dei em profeta, pobre de mim. E sei bem que não será
bonito sugerir leitura de posts em que somos gentilmente
mencionados. Mas há alturas em que o respeito que tenho pelo
correcto emprego do tempo por parte dos meus Leitores impõe que
a ética seja mandada às malvas. É que a Zazie resolveu dar-nos
mais uma preciosidade. Ala!

Monday, December 26, 2005

Assunção de Responsabilidades

Nota optimista do dia:
Falei, um pouco abaixo, do vandalismo; e quase não tem passado um
dia em que não vos incomode com a tristeza de, nesta época,
triunfar a generalizada fuga às responsabilidades. Pois bem,
a Directora de uma escola da Califórnia recebeu um envelope
com 2500 dollars e uma carta de três linhas, em que o autor da
oferta confessava ter vandalizado instalações do estabelecimento,
trinta e dois anos atrás. Explicações? Para quem for cristão
talvez o facto de a escola se chamar «San Dimas», o Bom Ladrão
crucificado ao lado de Jesus, encerre algum significado. Com a
vantagem de nada indicar que o remorso tenha operado perante
a iminência da morte. Mas nem tudo é perfeito - a carta era
anónima. A responsabilização operou, ma non troppo. E,
no entanto, para quem esteja de fora, atendendo à raridade do
gesto e ao tempo decorrido, talvez o imperfeito arrependimento
consubstancie a perfeição mesma...
Porque, às vezes, quando não exigimos perfeição, somos menos
imperfeitos.

O Instrumento da Fraude

Como a Zazie falou dele, aqui, uns dias atrás, cá está o trono pontifício que em tempos medievos era colocado à entrada da Basílica de São João de
Latrão no dia da Investidura Papal. A mentalidade popular terá criado a lenda que dizia servir a abertura por baixo para comprovar o sexo do Eleito, na sequência do abalo provocado pelo pretenso escândalo da Papisa Joana. Na nossa contemporaneidade a imensa maioria dos investigadores reputados concorda que nunca, realmente, tal ser existiu. Não se entendem é na origem do mito. Uns atribuem-no a importação de um caso com pontos comuns que se teria desenrolado com um dignitário bizantino. Outros querem radicá-lo no folclore pagão, subterraneamente sobrevivo e emergente após séculos de Cristianismo. Alguns consideram-no uma inventona dos rivais imperiais do Papado, com manipulação histórica correspondente. As hipóteses são mais que muitas. A existência do objecto parece de longe mais simples: numa altura de escassez do mármore em Roma, por haver sido aplicado na construção de igrejas e de monumentos de outra natureza, precisando-se de um assento nesse material, foi-se buscar uma retrete, como havia outras em palácios e casas ricas. O que é um fim inglório para tanto esforço propagandístico. Mas que se adequa à porcaria que se tentou levantar.

A Todo o Gás

Ainda estamos demasiado em cima do acontecimento para determinar,
com certeza, a autoria e os objectivos do ataque com gás num grande
armazém de São Petersburgo. Mas vendo as consequências, cerca de
oitenta pessoas intoxicadas, pode-se dizer algo acerca da natureza
destas más acções, em geral. A primeira é quanto à diferença aceite
habitualmente entre terrorismo e vandalismo. Ambos os conceitos
partilham uma característica comum: a de terem um destinatário
psicológico abstracto e colectivo, por muito concreto e individualizado
que seja o alvo físico afectado. Assim, a distinção entre um e outro
deve remeter-se para a o tipo de satisfação que visa e o seu grau de
determinabilidade. Se o clima de medo e desgosto pretendido tem
por fim infundir o pavor que agite as massas e publicitar uma causa
de luta minoritária, são os seus autores considerados terroristas. Se
se tratar de mera expressão de revolta e afirmação não doutrinada,
caem sob a abrangência do conceito de vândalos.
A ocorrência de hoje parece não configurar uma ou outra das situações
descritas. Dizem os encarregados da investigação que as primeiras
suspeitas recaem sobre a acção de uma cadeia concorrente, para
prejudicar comercialmente um rival a caminho da prosperidade.
Apesar de não ser inteiramente circunscrita a esfera das vítimas, já que
nem só empregados, mas também clientes, foram atingidos, parece não
ser aplicável nenhuma das construções citadas, em função da motivação,
devendo os crimes correspondentes ser tratados como qualquer
tentativa de envenenamento por inalação de um particular a outro,
com o objectivo de obter um ganho material. A relevância pública
extra-criminal da coisa está no exemplo que pode dar e na extensão da
prática a grupos contestatários dispostos a tudo, como o do tristemente
célebre caso do gás Sarin de Tóquio. Não fará mal algum
aos meus queridos Leitores passarem a andar à Israelita, com uma
máscara anti-gás na bolsa, ou na pasta...

A Aliança Imbatível

.
O título refere-se à que é estabelecida entre a Sorte e a Sabedoria, aqui ilustrada na «Boneca da Fortuna», de Kathryn Hunter, que adopta uma das posições dos "Macacos Sábios". Vem ao caso em virtude do sorteio da ordem pela qual figurarão os nomes dos candidatos presidenciais, nos boletins das próximas eleições: o apurado pela sorte para o aziago 13º lugar é o mesmo que a sabedoria faz ficar como último colocado, em ambos os casos com justiça incontestável. São oráculos, Senhores!

Começo Auspicioso

As declarações e comportamento de Lech Kaczynski na cerimónia
de Juramento como Novo Presidente da Polónia estiveram recheados
de boas indicações. Na forma, ao acompanhar com uma Missa na
Catedral de São João, em Varsóvia e ao proferir a frase-opção final
«Que Deus me ajude», que o seu predecessor havia
declinado dizer. Mas também no fundo. Afirmou querer manter
em bom plano a aliança estratégica com os EUA, mas que
transmitiria as suas posições de «uma forma clara e forte»,
o que, em linguagem diplomática, significa uma retracção à
abertura e subserviência totais do tempo de Kwasniewski.
Também o tom conciliador para com o eterno pavor que é a
Rússia, ao garantir, energicamente, que pretende continuar a
aliviar as tensões acumuladas, é bastante promissor.
E, no plano interno, o equilíbrio que defendeu da
iniciativa individual e o comércio livre, contrabalançados
por solidariedade pública e defesa q.b. das produções da
Polónia, também me parece de louvar. Como a intenção de
reformular o acesso aos cargos da administração, até aqui
iniciado por favores e, muitas vezes, culminado na mais
repulsiva desonestidade que é a corrupção. Tantos
foram os diamantes num tom geral de promoção da unidade
e do interesse nacionais, sem atirar parcelas da população
umas contra as outras. Um exemplo para muitos governantes
ocidentais. Oxalá não nos desiluda.

Não Cobiçarás O Jogador do Outro

Eis o 11º Mandamento, que, como o número indica, é aplicado
ao futebol.
E é o Conselho que dou aos anti-benfiquistas, a propósito do
reforço que a imprensa diz estar o meu Clube a manducar.

Rivais Num Mesmo Fim?

.

«Alegoria da Pintura e da Escultura», de Guercino. Posted by Picasa

Leitura Matinal -220

Ao Francisco Agostinho

Se os Homens se degradam e morrem, a recordação deles é a única
oposição possível ao vazio que confirma a sentença. Somente, devemos ter em conta que a memória humana também sofre as erosões, quer da sua própria natureza, quer as provenientes da prioridade que ao nosso "Presente"concedemos, em prejuízo da rememoração dos que foram importantes. É, pois mister recorrermos a uma mnemónica que se apresente como menos perecível e que, excitando a nossa sensibilidade, intensifique o Objecto da recordação, dando-nos, e a ele, novas asas vitais.
Foi o que Praxíteles fez, de forma a imortalizar quem já imortal se queria, como a Afrodite que aqui o acompanha, mas também à sua passagem curta pela Terra, ainda que não encontrasse um escultor que o praxitelizasse. É na pura sensibilidade às esculturas que se adivinha a nostalgia do que se vive, já transportados pela inconsciente percepção da ameaça pendente. O contrário do desdém de muita juventude pela atitude de «olhar para as pedras» que considera fantasias infantis ou passatempos de velhos, relativamente impotentes nas respostas a estímulos mais carnais. Também por isso se diz que a Velhice é a segunda infância: onde uns vêem por imaginação, os outros sentem por associação, mas ambos se encontram. E Brancusi também disse: «quando já não somos crianças, estamos mortos». Nem que seja pelo nosso egoísmo. Mas este, com o passar dos anos, ainda permite um renascer. Se chegarmos lá.

De Lawrence Ferlinghetti:

HÁ TANTOS SÉCULOS PRAXÍTELES

.....Há tantos séculos Praxíteles
....................golpeava à sua volta com o maço dourado
....em pedra afeiçoando alabastrinos sonhos
articulando todo
.............o vocabulário da escultura
..........................em sílabas visíveis
.........Em bronze moldou árvores
......................Noutra estátua petrificou um camaleão
..........e às pombas de pedra concedeu que voassem
.......................Com o compasso mediu pontes
.....................e amantes
........................e alguns outros sobre-humanos seres a quem
interceptou a poeirenta marcha
......................para a morte
...............À qual nunca chegaram a chegar
......................Podeis ainda ver ou quase
..................o.hálito deles
......................Os seus olhos de pedra atravessando fixamente
três mil anos de história
..................aliviam nosso medo da velhice
.....conquanto o próprio Praxíteles
...............aos vinte e oito anos morto fosse

............Porque a escultura não é coisa
................................para jovens
.....como Constantin Brancusi
........................em data ulterior
...................disse

A Grande Luta

.

«O Anjo da Morte e o Escultor», de Daniel Chester French.

Sunday, December 25, 2005

Quem Te Avisa Teu Amigo É

Começou no Pôr do Sol de hoje o Período das Doze Noites de Natal,
que vão até à celebração da Epifania, ao nosso Dia de Reis. Por
essa Europa fora é um lapso temporal associado à libertação
dos mais variados espíritos, muitos deles nocivos. Assim na
Europa Anglo-Saxónica, como nas mitologias nórdica e germânica.
Mas até na Grécia que se ufana da claridade de Apolo e Minerva,
como noutros países balcânicos, é o tempo por excelência do vero
vampiro, aquele que habita um corpo já morto. Na generalidade
dos Países Germânicos há o relato de uma Velha, Frau Holle,
cujo nome apresenta, por vezes, variações, que anda a fiscalizar
a fiação das donzelas e a castigar as que tiveram produção
insuficiente. E nos mais profundos recantos da Alemanha crê-se
ser a época privilegiada do aparecimento dos lobisomens. Nas Ilhas
Britânicas dá-se preferência aos elfos e acredita-se que qualquer
trabalho empreendido nesta dúzia de dias está condenado ao
fracasso. Em Inglaterra, aliás, no Décimo Sexto Século, o das
perseguições religiosas, surgiu uma canção popular dita para as
crianças - mas em que os detectives eruditos querem ver um
secreto sinal do criptocatolicismo -, na qual, em cada dia, é
cantada uma prenda dada pelo amor de quem canta, versando
objectos inocentes em número igual ao do ordinal correspondente
dos doze famigerados. Há uma chave que liga cada uma dessas
inócuas ofertas a elementos essenciais do Dogma Católico, com
o alegado objectivo de burlar a repressão.
Ora, com a livre circulação de pessoas, originada pela integração
europeia, é bem possível que todas estes perigosas ameaças estejam
a caminho do nosso País. O tempo deles aí está. Todo o cuidado é
pouco!

Em Honra de Miss Pearls

.

Esta jóia de ponto de interrogação, composta por um estranho animal, misto de serpente, águia e leão, com uma pérola na boca, é a minha prenda de natal blogosférica à Extraordinária Blogger Miss Pearls. Exprime a minha curiosidade acerca da identidade da Alma Caridosa que A convenceu a abrir as caixas de comentários ao comum dos mortais. A tripla possibilidade de identificação do animal representado acentua a dúvida. Mas quem quer que tenha sido, é credor da nossa gratidão.

A Culpa de uma Nação

Alguém sabia que a tradição que diz ter o Pai Natal um livro
onde aponta os nomes dos «meninos que se portam bem e os
dos que se portam mal» é uma criação tardia, surgida na Holanda?
Se não receberam muitas prendinhas podem lançar pragas
aos compatriotas do Sr. Koeman... estando fora de questão
virar-se contra si.

Biografia da Tradição

Não pretendo, neste post inovar, antes desejo divulgar. Quantos de
nós terão presentes a origem da construção do Presépio? Pois bem,
perde-se nos remotos inícios do Cristianismo o hábito de representar
a Sagrada Família junto do Comedouro, ao ponto de as Festividades,
por alturas do Séc.IV, incluírem a consagração da Hóstia sobre uma
manjedoura, como clara invocação do Corpo de Cristo. Na Igreja de
Santa Maria Maggiore prosseguiu a prática figurativa no templo, ao
ponto de, durante o Pontificado de São Gregório III, se ter posto em
lugar de relevo uma imagem da Virgem abraçando o Menino Jesus,
passando, desde um Officium Pastori, drama litúrgico do Século XI,
os elementos a serem colocados por detrás do Altar. Mas seria preciso
esperar mais cerca de quinhentos anos para que se verificasse a grande
explosão de popularidade.
Em 1220 São Francisco de Assis visitara Belém. E tão seduzido ficara
pela forma como o Natal Lá era celebrado, que pediu autorização ao
Papa para fazer semelhantemente nas imediações da sua cidade.
Obtida a concordância, veio, três anos mais tarde, em 1223, como
nos relatam os Seus biógrafos S. Boaventura e Tomás de Celano, a
pô-la em prática. Nesse ano disse ao seu amigo Giovanni Velita, um
proprietário de Greccio que possuía uma espécie de quinta com um
recanto semelhante a uma gruta, que preparasse a representação como
hoje a conhecemos, incluindo animais. Aí foi rezada uma missa, tendo
o Poverello de Assis, que era apenas diácono, jamais havendo
sido ordenado padre, lido o Evangelho.
E foi a partir do Século XVI que a piedade geral estendeu o hábito das
Igrejas às casas particulares. Hoje está quase extinto na América do
Norte; e na Europa, ainda subsistindo com alguma notoriedade,
encontra-se em regressão. Do que também eu sou culpado. Lembro-me
de, até aos dez anos de idade, ajudar os meus Pais a colocar o
Presépio. Hoje tudo isso se desvanece em memórias.

Os Primeiros

.

«A Adoração dos Pastores», de Ridolfo Ghirlandaio.

Leitura Matinal -219

É tão Grande o Quadro do Nascimento de Jesus que as nossas
pobres mentes tentam sossegar-se pela cisão que fazem dos
Períodos Natalício e Pascal, num consciente ou inconsciente
esforço de esquecer, por instantes, ser o Menino Adorado o
Deus-Homem assassinado. Mas se esta tranquilização que
nos alivia pode ser imprecada por roncantes lembradores
da insuficiência humana, está na própria simplicidade com
que os menos letrados e os mais sábios se coligam para
alegremente render o Culto ao Recém-nascido, o germen
da Alegria com que, provavelmente, a nossa acção neste
Mundo mais harmonia conseguiria encontrar com a vontade
de Deus. E é na voz dos Simples, tornada sublime pelo Tema,
que Vos levo, na tentativa de humildade do reconhecimento
daqueles que Jesus chamou a Si, duas trovas populares:

JESUS PEQUENINO

Estava Maria
À beira do Rio,
Lavando os paninhos
Do seu bento filho.

Lavava a Senhora,
José estendia,
Chorava o menino
Com frio que tinha.

Calai, meu menino,
Calai, meu amor!
Do mundo os pecados
Me cortam de dor...

Os filhos dos homens
Em berço dourado,
E vós, meu menino,
em palhas deitado!

Em palhas deitado,
Em palhas esquecido...
Filho duma rosa,
Dum cravo nascido!

Os filhos dos homens
Em berço de flores,
E vós, meu menino,
Gemendo com dores!

Os Filhos dos homens
Em bom travesseiro,
E vós, meu menino,
Preso a um madeiro!

e

O MENINO DEUS

Um pastor vindo de longe
À nossa porta bateu;
Trouxe recado que diz:
- O Deus Menino nasceu.

Este recado tivemos,
Já meia-noite seria;
Estrelas do Céu, lá vamos
Dar parabéns a Maria.
Mas que lhe hemos de levar,
A um Deus que tanto tem?
- Ainda que muito tenha
Sempre gosta que lhe dêem
- Eu lhe levo um cordeirinho,
O melhor que eu encontrei.
- E eu lhe levo um requeijão,
O melhor que eu requeijei.
- Pois também eu aqui levo,
Fofinhos pra lhe oferecer,
Bons merendeiros de leite,
Favo de mel, pra comer.
- Vamos ter com os mais pastores,
Não se percam no caminho.
Vamos todos, e depressa,
Adorar o Deus Menino.
- Vinde também pastorinhas,
Vinde, correi a Belém;
Vinde visitar Maria
Que divino Filho tem.
- Esta noite é santa noite,
Inda assim, mesmo tão fria;
Vamos todos a Belém
Visitar Jesus, Maria.
- Ai, que formoso Menino;
Ai, que tanta graça tem!
Ai, que tanto se parece
Com sua Senhora Mãe!


Notai a expressão «preso a um madeiro» com que finda a
primeira. Da intuição sem adornos nasce a conexão com
o Outro Madeiro, o que a maldade quereria final. O Ciclo
fecha-se? Não! O CICLO ABRE-SE!

Júbilo!

.

Mais antigo que os mais célebres: «A Senhora e o Menino», de Barnaba da Modena.

Saturday, December 24, 2005

A Todos Um Bom Natal!

.

Um pedido do Eurico é uma ordem. E nada mais adequado do que Jimmy Stewart e Donna Reed em «IT´S A WONDERFUL LIFE/DO CÉU CAIU UMA ESTRELA», o filme que mais vezes vi e que me continua a fazer choramingar. Porque sou um desavergonhado, confesso-o sem rebuço. A Todos aqueles que contestei pessoalmente, mas também aos Outros, que me dão o grande privilégio de por Eles ser lido, em especial aos que já cá deixaram a Sua marca, desejo um Natal muito feliz.
E toca a andar para a mesa. A Consoada não tardará muito!

As Esquecidas

.


"Misantropo contra as injustiças", para mais numa Noite como Esta. Abstraindo por momentos da Seriedade que envolve a data, para dar um salto ao folclore, constata-se toda a gente fala no Pai Natal, uns a favor, outros contra, como o nosso Colega dos deliciosos e cada vez mais intensos Prazeres Minúsculos. Mas ninguém se lembra das pobres criaturas que fazem o trabalho pesado. É certo que o proletariado já não é o que era, mas enfim! Socorrendo-me de Desmond Morris, fico a saber que até 1822, São Nicolau, que se quer o nome de origem do Velho das Barbas, ainda não se tinha aburguesado. Ou andava a pé, ou sobrecarregava uma pileca branca. Foi só nessa data que o Poeta Clement Moore, em «UMA VISITA DE SÃO NICOLAU», deu a conhecer as oito condutoras do célebre trenó, dando um nome a cada uma delas: Audaciosa, Bailarina, Saltadora, Geniosa, Cometa, Cupido, Pomposa e Relâmpago. Podemos vê-las aqui, no duche, preparando-se para bem impressionarem, na noite que avança. Só estão sete. Há portanto uma que se assemelha ao aspecto que este Vosso amigo apresentava, na aventura abaixo descrita, da compra da sobremesa tradicional. É que há smpre um contestatário, conforme se demonstra na outra figura. Qual seria? Para mim é a Geniosa, mas estou certo de que os admiradores terão por líquido que se trata da Audaciosa. A razão do surgimento delas parece basear-se num outro idoso errante, que protagonizaria uma velha legenda finlandesa, a do Velho Inverno, que o nosso Autor, o homem do retrato cheio de verdete, teria conhecido; e dele assimilado alguns traços ao Distribuidor das Prendas. Espero que se tenha operado a reparação devida.
 
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