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A 27 de Dezembro de 1917 assumia Sidónio Pais a Presidência da República, formalizando a presidencialização revolucionária da Forma de Estado, na práctica já decidida desde a chefia da junta e do governo, datadas de 8 e 12 do mesmo mês, respectivamente. Querem alguns apaixonados pelo comparativismo histórico que se trate de uma experiência portuguesa de "pré-Fascismo". A meu ver, sem razão. Não se tratou de levar um partido a conquistar o Estado. Sidónio vinha de uma das facções partidárias da República, apesar de progressivamente desiludido com as arbitrariedades dela, dominada pela máquina
Costista. Nenhuma vontade de modificar o Homem num sentido de
afirmação vital da Força. Nenhum expansionismo em política externa. Nenhum belicismo, na acepção capacitária, essencial à vida do Estado, pelo contrário, a vontade expressa de, progressivamente, decrescer o empenho numa guerra que nada dizia de bom ao Povo e apenas servia os
Democráticos com um útil António José de Almeida a reboque. A Guerra como elemento de formação, essencial às experiências Fascista, que bradava a frustração da insuficiente recompensa de um vencedor menor, e Nacional-Socialista, que aspirara os inconformismos contra uma derrota decidida não no campo de batalha, mas na turbulência revolucionária interior, não tinha aqui papel do mesmo relevo. Os veteranos da frente ainda por lá andavam, sem rotação, equipamento ou comando que se vissem. E quereriam tudo menos preparação para novas lutas.
Julgo que o paralelo que cega alguns dos observadores residirá no apoio que alguns dos que ficariam na história como
Futuristas deram a Sidónio,tal como Marinetti ao primeiro Mussolini. Mas foi completamente diversa a atitude: enquanto em Itália se procurava ua contestação total do modo de ser burguês, prolongado no Mundo criativo pelos academismos, cá a adesão intelectual dos embrionários transformadores estéticos era a ponte mítica para o cumprimento dum «carácter nacional» que viam depender de uma figura
Desejada e, porque encoberta, de vulto impreciso e latamente preenchível.
Sidónio reunia todas as condições. Para a esmagadora maioria da População era a promessa de uma tranquilidade consensual, acabando com as perseguições religiosas, querendo chamar os Monárquicos ao seio da colaboração com o regime, em vez de os apontar como criminosos, prometendo não intensificar os recrutamentos. O Homem que a corporizou vinha da Universidade e era militar, as instituições que davam políticos. E, bem apessoado, idolatrado pelas Mulheres como só D. Miguel antes dele fora, nunca seria um erro de
casting para D. Sebastião do Século XX e com mais sorte do que o Primeiro. Infelizmente, todo esse capital de esperança não previu o que, no entanto, era previsível - que uma solução não-dinástica, não-descentralizadora e jogando, mais alargadamente embora, o jogo partidário, encontraria, por força, uma Alcácer-Kibir. Foi na Estação do Rossio. O engano não estava no elenco, mas sim no argumento.
Caiu o pano.