O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Friday, October 13, 2006

«Eu Sabia Que Isto Estava Escrito Em Qualquer Lado»

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Dois dias, os precedentes, em que um almoçado misantropo se viu atrapalhado na travessia do Rossio. Ontem foi a manifestação anti-governamental, que ainda tem desculpa, por as pessoas estarem a defender-se. Não me pareceu reunir tanta gente como mais tarde foi estimado, porém sei que era apenas um ramal dela. Anteontem é que foi pior: estudantada pseudo-uniformizada aplicando praxes aos caloiros. Já disse que não sou hostil a ritos iniciáticos sofridos voluntariamente, desde que sejam porta de acesso a uma elite. O que nunca consegui foi ver esse escol no meio estudantil. E se aceito estas práticas em Coimbra, por uma continuidade de boémia que compense o deslocamento dos discentes, não consigo encontrar razão para tanto folclore numa cidade em que a maioria dos alunos das Faculdades faz a vidinha de todos os dias, escudados na mesa, tecto e empregada dos papás. O tema é velho. Gostaria de associar-me aos protestos que Aqui e Aqui contra esta pepineira já foram escritos, reproduzindo um trecho que Leitão de Barros pôs na boca dos seus dialécticos «CORVOS» vicentinos:
«- A capa e batina - dizia o esquerdista - é uma fardeta anacrónica, inquisitorial e sinistra. Além de tudo, eminentemente porca. Ainda na província, sobre as paredes caiadas dos velhos seminários e liceus, o bando juvenil de asas negras tinha um pitoresco aspecto de tradição. Em Coimbra, sobretudo, perdoa-se, porque faz parte dos monumentos nacionais, das arrufadas, das recordações de «gare» e dos bilhetes-postais ilustrados - com a condição única de o estudante ter bigode e a tricana uma dupla afirmação de patriotismo evidente. Agora em Lisboa, no meio da correria para os auto-carros, em motocicleta, com a bata branca do laboratório a sair-lhe como fralda por debaixo da capa, rasgada pelo alfaiate - segundo a conscienciosa tradição boémia -, é puramente caricato.
Mas o da direita ripostou:
- A capa e batina, meu malandro, é um tapa-misérias, uma economia, uma necessidade. Não é daí que vem mal ao mundo. Além de tudo, distingue o escolar, identifica-o. Fá-lo respeitar a indumentária própria, impõe-lhe uma conduta.
-Lérias! E as raparigas? Já viste coisa mais absurda do que essas pequenas com capa de meirinho da Boa Hora, envergando, muito convencidas, uma espécie de dominós de enterro, que não só lhes tiram toda a feminilidade mas lhes estrangulam toda a personalidade e elegância que por acaso tivessem?
O outro corvo espanejou-se, espanejou-se e ficou silencioso.
».
A ilustração é um dos desenhos de João Abel Manta que acompanham o texto.

4 Comments:

  • At 11:47 AM, Anonymous Anonymous said…

    Sem ser Coimbra, Porto e Évora, não encontro mais nenhuma academia onde a praxis académica seja vivida, e não instumentalizada só para marcar o início e fim dos anos lectivos, para não falar das Festas que de académicas pouco têm.
    Em tempos defendi a Tradição no É A HORA!, "com unhas e dentes". Não altero uma linha. Mas a realidade vivida nas universidades e institutos é, de facto, bem diferente da desejavel.

    Abraço

    ps:curioso que no IPS a tradição seja mantida e defendida pelos estudantes mais à esquerda! A margem sul é diferente em tudo...
    ps:tenho tantas saudades de Coimbra!

     
  • At 11:57 AM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Ah, Meu Caro Simão, Coimbra é bem outra coisa. Tenho Amigos que se formaram lá e que visitava na «Queima» e era completamente diferente destas concentrações na Baixa Pombalina que nem eral carne nem peixe. Ainda por cima, pelo que pude ver, as praxes nem tinham piada de maior...
    Abraço.
    Há Esquerdas assim, quando farejam possibilidades de chatear o próximo pegam em tudo...

     
  • At 2:04 PM, Anonymous Anonymous said…

    Augusto de Castro ou Leitão de Barros? Vossa Senhoria andou em libações com as jovens caloiras...
    (Mera Culpa)

     
  • At 2:38 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Lapso de escrita a remeter para uma exploração do inconsciente: talvez pela editora de um pertencer ao jornal do outro. Vou já emendar.
    Mas é bom sabê-lo de volta, mesmo que por tais motivos...

     

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