O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Friday, June 23, 2006

Tão Longe!

À Zazie e ao JSM
Num livro a todos os títulos recomendável, «OS EXCENTRICOS DO MEU TEMPO», de L. A. Palmeirim, encontrei apontamento sobre Julião José da Silva Vieira, o Deputado Julião, o qual pôs e dispôs naquele Oriente que é a própria tradução do nome de Timor. O protagonista era um trânsfuga do Miguelismo, sob o qual fora Governador de Damão. Obcecado por condecorações e prebendas aparentadas foi aproveitado pelo Liberalismo para governar Timor, já nesse tempo o parente pobre da nossa acção ultramarina. Esta reconversão, da autoria de Costa Cabral, revelou-se caricata: com o representante português ignorando olimpicamente leis e instruções, "criando" três deputados onde a legislação só consentia um, deixando o trio sem certeza de qual era o legítimo; imitando o "exemplo irlandês", aquando da morte do Rei de Liquiçá, não permitindo a eleição de outro nativo para o trono, impondo antes um conde-reinante, pelo que foi repreendido em termos severíssimos pelo Governo, com indicação expressa da desaprovação Régia; comparando nas arengas que faziam as vezes de relatórios Timor à Grécia Antiga e «ao rei dos reis» (sic, que isto era designação mais persa que helénica) o Soberano português; e, por fim, desenvencilhando-se das pretensões holandesas que sobre o território começaram no seu tempo a ganhar força, lavrando protestos enérgicos mas cedendo nuns pontos e exprimindo-se em termos vagos noutros, o que, se o tirou de dificuldades no momento, veio a ser mais tarde aproveitado pela potência colonizadora vizinha para pressionar o aumento do seu território em prejuízo do nosso. O personagem, de regresso à Metrópole, veio a fazer carreira no parlamento. Timor, esse, ficando onde sempre esteve, passou a ser local de sedições periódicas, com um pico sinistro no assassinato do Governador Lacerda e Maia. Até que, com o período de António da Costa se pacificou uma terra em que as dissenções entre os diversos reinos foram mais do que muitas. Por fim, a Segunda Guerra Mundial, com invasões japonesa, por um lado e anglo-australiana e holandesa, pelo outro, vieram mostrar de vez a benignidade da soberania lusa. Daí para cá é o que se sabe: aos Países Baixos sucederam os seus ex-colonizados indonésios. Dos australianos, libertos de mais alguns dos laços que os ligavam à brumosa mãe-pátria, parece ter chegado agora a vez.

5 Comments:

  • At 2:51 PM, Blogger zazie said…

    muito obrigada Paulo!

    Que história mais curiosa. Timor é um manancial para se estudar tudo. O que é incrível é que praticamente ninguém se tem interessado nos últimos tempos.

    Tenho muita pena se aquela terra se perder e os laços com Portugal se quebrem de vez. Mesmo muita. Por isso é que até ando com ganas ao Xanana apesar de não gostar nada do Alkatari.

     
  • At 2:55 PM, Blogger zazie said…

    mas o Paulo já reparou como mesmo os "ideólogos" de cá falam de Timor com tanto desprezo. Transforma tudo em ideologias e já não têm memórias históricas. Isso é que me faz impressão.

    A história de Timor é um caso muito mais dramático que a de África. E a língua portuguesa é de tal modo importante que a tal geração perdida, filha dos indonésios durante o domínio tem esse handicap. As línguas nativas são de tal modo toscas que não permitem elaboração de conceitos. Eles próprios dizem que para pensar têm de o fazer em Português.

    É uma frase muito forte, não é?

     
  • At 7:16 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Querida Zazie:
    Somos dois, até porque, a partir da Segunda Guerra, o grosso da população desenvolveu genuíno gosto por Portugal e não menos verdadeiro e evangélico pacifismo, apesar de sujeito a toda a ordem de violências, por vezes oriundas de elementos da sua própria comunidade.
    Quanto à invasão ideológica, que admira? É muito mais fácil apreender uma qualquer vulgata desprovida da grandeza da Religiosidade que determine a visão de todos os acontecimentos por junto, do que estudar as raízes e metamorfoses dos comportamentos e filiações. E claro que a língua poderia bem ser o elo mais forte do afecto entre os habitantes de pontos tão distantes geograficamente e hoje tão próximos, após o grande momento de esperança
    A força é a da Verdade e a dos sentimentos.
    Beijocas.
    PS: Se voltas a tratar-me na 3ª pessoa, afino, ah se afino!

     
  • At 8:00 PM, Blogger JSM said…

    Caro Paulo Cunha Porto
    Obrigado também, neste também mais tardio.
    Tenho 'viajado' pouco nestes dias, estou agora a pôr a escrita em dia.
    Concordo com a dúvida da ilustre comentadora, estou confuso, caso raro!
    Quem é o nosso agente em Timor? Lembrando-me de Graham Greene, salvas as devidas distãncias e conteúdos.
    Será Xanana? Alkatiri? Ramos Horta? Outro notável com apelido?
    Virando a pergunta ao contrário: qual é o interesse nacional em Timor? Vamos abandonar mais uma praça, como Arzila ou Mazagão!
    Responderei com um postal, enquanto aguardamos a próxima tragédia.
    Um abraço e renovo os agradecimentos pela belíssima lição de história de que tinha, como sempre, apenas uma vaga ideia.

     
  • At 11:41 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Meu Caro JSM:
    Como sempre, vai direitinho ao fundo da questão: «Quem é que temos interesse em apoiar?». Suspeito de que os nossos políticos nem façam uma ideia demasiado nítida da resposta.
    Quanto ao Deputado Julião é figura bastante esquecida pela história, salvo em alfarrábios tenebrosos como aqueles em que este Seu servidor é viciado.
    Lá irei ao Interregno, beber a recorrente sagacidade crítica.
    Grande abraço.

     

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