O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Monday, February 20, 2006

Leitura Matinal -273

A nossa necessidade construída de dominar o tempo, julgando poupá-lo pela aceleração da marcha que encetámos
tem como consequência alterar a visão que nos é facultada dos pontos que percorremos a ritmos alucinantes. Alucinantes é, de facto, o mot. Porque o nosso império sobre os minutos economizados se reflecte, em todos os sentidos, numa impossibilidade de absorvermos a naturalidade da luz e das formas, recebendo perversões delas com a excessiva pressa de uma passagem alheia à lentidão que permitiria pensá-las.
É na diluiçao dos lugares e contornos que atravessamos, na pardificação nevoenta das cores distintivas, que reside a soprema ironia do nosso poder. Querido como tirano de serviço das cronometragens nas corridas que efectuamos, acaba por tornar-nos escravos das indistinções e da irreconhicibilidade que provoca, vedando o afecto e a referência.
É que, pensando «não perder tempo», estamos a desbaratar os espaços. Não parámos o ciclo diário, sequer. A antecipação da nossa escala, prenúncio da continuação da viagem no que deveria ser o período natural do descanso, já operou as metamorfoses espirituais que substituíram a ligação a uma paisagem, ou a uma povoação, pela vertiginosa e exaustiva sucessão de imagens cada vez mais iguais, aptas a liquidar, por sua vez, a individualidade do nosso espírito, privado que foi da guarda palaciana que é o olhar.
De Ruy Ventura:

toda a luz se esbate na cinza deixada a meio do espaço
aberto entre ambas as cortinas
possuidor do vento
cada aresta se curva ante a esquina cerrada subitamente
após o contínuo movimento de passos e
neblinas.....aqui
o tempo transforma-se tal qual palavra lendária
que se esboroa em em seu corpo de árvore
faz-se e desfaz-se.....até no imprevisto
sabor dos fruto das nuvens
no lento entardecer.....comboio
cor de fevereiro no inúmero cansaço
das janelas.


sugeriu-me ««A Força da Velocidade», de Lilly
Barbarik, «As luzes Obscurecidas», de Kenneth Aptekar
e «Desvanecendo-se», de Anne Malatesta.

3 Comments:

  • At 6:34 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Não sei que papel joga a velocidade...

     
  • At 7:28 PM, Blogger Viajante said…

    Ah, os ritmos. Que diferem de velocidades :))

    "É que, pensando «não perder tempo», estamos a desbaratar os espaços."
    E a desperdiçar o tempo, trocando-o por algo que ele poderia não ser.

    E a ignorar os olhares, sim, da mesma forma que os olhados, o sentir com os sentidos...

    Pena maior nem é economizar os segundos. É ser dos que os esconde, como aos talentos, ou os enterra, na mira dos usufruir depois. Tola esperança, vãs perdas.

    Beijos.

     
  • At 4:53 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Apercebo essa nefasta ignorância deliberada de que falais como consequência da diluição das formas, motivada pela pressa. Mas pensando a Vossa réplica também aceito que o seja por essa avareza de si que dificulta o discernimento, numa perspectiva oposta, de desaceleração, mas com efeitos homólogos.
    Este adiamento é uma poupança, como a temporal, de que falei. E ambas as sovinices darão, provavelmente, em adulterar a naturalidade do Homem, para seu próprio prejuízo.
    E outros mais.

     

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