Espírito e Sensibilidade
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Um comentário de Júlio Silva Cunha à remissão de ontem para a obra de Dickens fez-me levar da estante para a cama este livro em que há anos não pegava, para ver se encontrava nele alguma pormenorização do criticismo anti-judaico do grande romancista. É referido, sim, mas sem desenvolvimento. Em compensação são dissecados outros aspectos importantes, apesar de, por vezes, as conclusões apontarem para teses diferentes do que a leitura das obras romanescas me despertara.
Temos, assim que a procura dickensiana de integração num protestantismo lato era tácita, sendo expressa apenas a adstrição à espiritualidade emergente do Novo Testamento. Ora é esta unilateralidade que rejeita a mensagem inflexível do Antigo que me permito pôr em realce e que julgo dever fundar a hostilidade do grande Escritor ao Calvinismo e não apenas às Igrejas deste, contrariamente ao que acontecia com esse Carlyle, que, no entanto, também sobre ele influiu.
E a sintonia dele com a religiosidade popular, bem como a atracção pela forma conventual e desfilante do Catolicismo pareceriam de molde a torná-lo simpático ao Nosso Autor. Como a sua hostilidade à Revolução Francesa, que não era apenas de ordem política, antes também fundada na perseguição religiosa então empreendida. Donde provinha, pois, o preconceito anti-Católico que, confessadamente, o dominava e se expressou no apoio à Revolução de Génova, de 1846? Creio que a chave de tudo reside numa alusão do autor da obra com capa acima reproduzida: a de que ele «nunca conseguiu aceitar a Marialatria, apesar de estar sujeito ao anseio de uma vida de uma imagem feminina de espiritualidade, orientação pessoal e redenção». É o escolho em que esbarram muitos literatos não-católicos: Como admitir o arquétipo que criaram da Perfeição Naquela que a Santa Madre Igreja reconhece como Mãe de Todos, porque Geradora do Salvador? O conceito de propriedade privada das Nações Protestantes enraizou-se neles demasiado, para que o pudessem admitir.
Uma pena, muito mais de lamentar em vésperas da celebração do Divino Parto!
11 Comments:
At 7:39 PM, Anonymous said…
Caramba! Um belo texto, mas coroado por essa do "Divino Parto"! A constipação deu-lhe para o estilo da Patriarcal d'El-Rei D. João V?
At 7:57 PM, Anonymous said…
Pregunta para el erudito anglófilo Paulo.....Las obras de Walter Scott (Ivanhoe y Las Aventuras de Nigel)...¿Son anti católicas? Yo no los ha leído, pero mis referencias son esas....¿Qué opinas, amigo Paulo?
At 8:11 PM, Paulo Cunha Porto said…
Mas, Meu Caro Je Maintiendrai, um Cultor de Gongora não deveria ser sensível a esse tom, ainda que insuficientemente concretizado?
Meu Caro Çamorano:
Esse é um assunto em que já tinha pensado, anteriormente.
Apesar de as credenciais de Baronete protestante de Scott serem irremovíveis, creio que aqueles muitos romances seus que se passam no período medievo estão isentos dessa marca, pela Unidade Teológica que o Autor ambicionava e ficava bem nessa revisitação romântica de um período que foi muito menos unânime do que o que delas se exala. Mas ainda hei-de escrever um "post" sobre a forma como julgo ter o ideal de Cavalaria de "Sir" Walter influído na imagem religiosa preferencial desse Mundo perdido.
Quanto a erudição, há que procurá-la noutro lado.
Abraços a Ambos.
At 8:35 PM, Anonymous said…
En lo tocante a "Caballeros Andantes", amigo Paulo, me encuentro más próximo del Graham Green convertido al catolicismo recorriendo España en un Citroen 2 Caballos, conducido por el prudente sacerdote orensano Padre Durán........Ab.
At 8:39 PM, Paulo Cunha Porto said…
Li recentemente as memórias de Greene, caríssimo Çamorano. Infelizmente muito centradas na respectiva experiência de jornalista, gostaria de ver outras vertentes desenvolvidas.
abraço.
At 9:01 PM, Anonymous said…
Amigo Paulo: otro caballero andante, Orson Welles "refugiado" en la España franquista tras sufrir el "mobbing" de Hollywood como consecuencia de Ciudadano Kane (inspirado en el magnate Hearst, auténtico "armadanzas" de la Guerra hispano- norteamericana de Cuba en 1898).......
At 9:09 PM, Paulo Cunha Porto said…
É verdade, Meu Caro Çamorano. Essa guerra foi quase uma imposição privada desse triste magnate ao que passava por ser o poder em Washington.
Diz-me, foi, realmente, em Espanha que Welles filmou as senas do que ele queria que fosse o «D. QUIXOTE»?
Ab.
At 9:30 PM, Anonymous said…
Creo que sí, amigo Paulo. La que estoy seguro que rodó en España (Casa de Campo de Madrid) es Campanadas a Medianoche. Curiosamente, el productor Samuel Bronston (enterrado en Las Rozas de Madrid, España, al igual que Welles, en Andalucía)rodó superproducciones en España: Rey de Reyes, 55 días en Pekín, La caida del Imperio Romano, El fabulos mundo del circo (con tu medio compatricia Gina Lollobrígida), El Cid (con Charlton Heston y Sofía Loren como Doña Jimena)....pero, cuando quiso rodar La Vida de Isabel la Católica, la familia judía Dupont que lo financiaba, le retiró su apoyo y la productora quebró......¿Se "zangaron" recordando la expulsión de los judios de Sefarad por los Reyes Católicos? En lo tocante a las películas sobre Don Quijote, no suelen ser afortunadas, el rodaje terrorífico: le costó la salud al gran Fernando Rey, que tuvo que adelgazar 20 kilos y montarse a lomos de un caballo con setenta años.....Había un proyecto de hacer una nueva version con Bud Spencer y Terence Hill, pero fue desechada; la más "engraçada", la versión de Fernando Fernán Gomez (Don Quijote) y Mario Moreno "Cantinflas", un Sancho con acento mejicano........AB
At 9:43 PM, Paulo Cunha Porto said…
Ah, O Grande Rey! E eu adoro o «CHIMES AT MIDNIGHT», com aquelas filmagens fantásticas dos cavaleiros içados para as montadas e um humor esplendoroso...
Grande abraço, Caro Çamorano.
At 11:33 PM, Anonymous said…
É Júlio Silva Cunha.
Um abraço e bom parto!
J.
At 9:29 AM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro Júlio Silva Cunha:
Mil perdões, partidas do subcoinsciente, que deveria estar a pensar no Autor cujos apelidos saíram.
Já emendado foi e fica a gratidão e retribuição que o generoso abraço impõe.
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