O Cerco ao Castelo
Leitura de um ensaio de Vergílio Ferreira sobre a Retórica. Depois de descontar a maior evidência dela na Oratória, por ter um valor estrutural na específica necessidade de captação do receptor, transpõe para a Arte o ensinamento de que quanto menos visível ela for, mais conseguida será a obra. Um pouco como na Propaganda, digo eu, em que a mais eficaz é a que não se assume como tal, envergando a ostensiva humildade traduzida na veladamente arrogante operacionalidade da fidedignidade da Informação. No que toca ao plano artístico, segundo o Autor, o tom a esconder residiria no artifício, que, quando notado, degradaria o valor estético, decréscimo de aceitação particularmente patente na repetição, fosse na cópia de outro Autor, ou na de si mesmo. Porque, propõe, a específica retórica de movimentos como o Romantismo, que nos choca hoje, não exceptuaria a regra, na medida da interacção contemporânea dos valores partilhados: «O romantismo não é retórico para si». O fulcro da posição acha-se numa proposição que segue: «Toda a obra de arte opera um desvio de uma situação "normal", - para a emoção trágica, lírica, para o cómico, para a dura frieza, etc. O que o artista espera é converter o espectador à sua "anormalidade" mediante uma sistemática de processos. Que o espectador resista e a retórica aparece.; que o espectador ceda (às vezes só após um longo contacto que force a esquecer a estratégia) e a obra de arte é o ignorado meio de acesso a uma comunhão em plenitude».
Mas será assim? A meu ver, nem sempre. Porque a cumplicidade daquele a quem é dirigida a obra nem sempre assentará na adesão sincera que abstraia da evidência persuasiva altissonante. Os que se deliciam com as produções do Esteticismo, ou do Futurismo, por exemplo, buscam é a evidência artificiosa e mais do que retórica da degradação de valores que o riso por vezes, ou «sempre», diria Stern, é, como o afrontamento que ab initio abdica da literalidade. O consolo dos consumidores desta arte assenta no facto de ela se desmentir a cada passo do discurso como uma verdade de fundamento, apostando tudo em cativar como postura. Claro que é possível dizer que esta não é a melhor Arte do Mundo, porém obriga-nos a excepções suficientes para deitar por terra a validade da regra.
É que, para retomar a imagem, aqui «Retórica" será uma ponte, mas uma ponte levadiça. Que não deixa vãos porque não delimita, ao identificar-se com o Todo e desistir de forçar o Castelo que é cada Espírito.
5 Comments:
At 11:06 PM, MRA said…
Seria um prazer que escrevesses sobre ela "a imagem"...
Abraços
At 1:55 AM, Anonymous said…
A Miss Pearls gosta de levar na bilha
At 10:10 AM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro MRA:
É grande desafio, que ela é belíssima.
Quanto ao outro comentário, aí fica como marca da baixeza, sabendo-se que o simples acto de apagá-lo seria uma vitória para quem, escondendo-se, já se apagou da dignidade.
At 3:32 PM, Anonymous said…
Olá Paulo
Mas "Ela"só se "identifica com o Todo e desiste de forçar o Castelo que é cada Espírito" quando atinge a sua forma mais pura, e ideal.
O que nem sempre é possível, digo eu, e então nem que seja inconscientemente tenta-se sempre forçar o Castelo dos outros.
Beijinho
At 8:46 PM, Paulo Cunha Porto said…
Querida MFBA:
é a questão da ostensibilidade eversus aceitação, à qual procurei opor excepções.
Beijinho
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