Recidiva
A mediocridade das aspirações cega a maioria dos Homens. Mas para aquele que disso se apercebe, prescindindo de lutar
pelo que os outros têm por objectivo, sabe que não é nos reconhecimentos formais que apenas a vaidade alimentam, nem, acrescente-se, na pregação da abdicação deles, que se encontra o crescimento da Pessoa. Bastará este saber? Não basta. Na medida em que ainda se compara aos que ficam um degrau abaixo está a cair na mesma armadilha, o que,
ainda assim, não é o pior. Esse reside na constância impermeável e solitária da busca do Fundamental, que, fornecendo-se como razão para se prender à vida e dar-lhe um sentido, prolongue a ligação ao Mundo em que, afinal também se está, evitando que se cumpra com a brevidade que a Natureza sugeriria um absurdo ciclo vital. Absurdo? Pois, aquele que, tão desprendido, deixa de saber converter a Atenção em Estima.
De Bai Juyi, traduzido por António Graça de Abreu:
A ILUSÃO DA VIDA
De menino a velho mudaram meus interesses,
mas imutáveis meus propósitos.
Outrora brincava com areia, construía pagodes a Buda,
hoje, ao tilintar do jade, reverencio o Imperador.
Tudo coisas fúteis, ocupando o existir dos homens,
sombras de nada, prolongando espaços de ser.
A serenidade é alheia às ambições mundanas,
a renúncia, o desprendimento, conduzem à verdade.
Receio apenas que tanta impaciência na busca da verdade
prolongue ainda minha estada no reino da ilusão.
As pinturas são : «Isolamento vs. Ilusão», de Lui Liu
e «O Impaciente», de Steve Dieckhoff.
pelo que os outros têm por objectivo, sabe que não é nos reconhecimentos formais que apenas a vaidade alimentam, nem, acrescente-se, na pregação da abdicação deles, que se encontra o crescimento da Pessoa. Bastará este saber? Não basta. Na medida em que ainda se compara aos que ficam um degrau abaixo está a cair na mesma armadilha, o que,
ainda assim, não é o pior. Esse reside na constância impermeável e solitária da busca do Fundamental, que, fornecendo-se como razão para se prender à vida e dar-lhe um sentido, prolongue a ligação ao Mundo em que, afinal também se está, evitando que se cumpra com a brevidade que a Natureza sugeriria um absurdo ciclo vital. Absurdo? Pois, aquele que, tão desprendido, deixa de saber converter a Atenção em Estima.
De Bai Juyi, traduzido por António Graça de Abreu:
A ILUSÃO DA VIDA
De menino a velho mudaram meus interesses,
mas imutáveis meus propósitos.
Outrora brincava com areia, construía pagodes a Buda,
hoje, ao tilintar do jade, reverencio o Imperador.
Tudo coisas fúteis, ocupando o existir dos homens,
sombras de nada, prolongando espaços de ser.
A serenidade é alheia às ambições mundanas,
a renúncia, o desprendimento, conduzem à verdade.
Receio apenas que tanta impaciência na busca da verdade
prolongue ainda minha estada no reino da ilusão.
As pinturas são : «Isolamento vs. Ilusão», de Lui Liu
e «O Impaciente», de Steve Dieckhoff.
4 Comments:
At 3:28 PM, JSM said…
Um texto complexo e não chegaram duas leituras para o decifrar. Mas o complemento visual deve estar bem escolhido e por aí talvez lá chegue. Estaremos próximos dessa fronteira da desistência! Ou será apenas um momento de adaptação a uma nova realidade que nos assusta! Que causas temos para lutar contra este torpor!? Reflexos da minha terceira idade, onde só a ironia investe contra 'a inexorável marcha do tempo'.
Um abraço e um obrigado pelas 'imagens' (especialmente a primeira) para reflexão.
At 5:31 PM, Anonymous said…
O poema é lindíssimo. E se calhar tão certo.
Beijinho
At 6:58 PM, Paulo Cunha Porto said…
Também me pareceu, Muito Caro JSM, que as imagens davam uma indicação segura de qual o caminho interpretativo a trilhar. Tem toda a razão: só a ironia, desde que não cortante contra inocentes, nos pode salvar. Em todas as idades; e, "maxime" a que for dirigida contra nós próprios.
Querida MFBA:
Também me calou fundo. E esse é o meu grande receio...
Beijinhos e abraço.
At 7:26 PM, Anonymous said…
"Inpaciente"
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