No Rasto dum Palavrão
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Pelos meus doze e treze anos tive a sorte de ser aluno do Padre Chico, um Salesiano eruditíssimo que me deu aulas de História, explicando convenientemente a salganhada de estruturas económicas a que o programa oficial pós-revolucionário ainda obrigava, porém suavizando-o com a transmissão de conhecimento sobre situações muito mais apelativas, que as suas leituras e experiência lhe haviam facultado. Italiano de origem, dera duas voltas ao Mundo, tendo feito mais umas quantas viagens isoladas, pelo que era frequente ouvi-lo dizer «quando estive em x...». Fora, além disso, confessor do Rei de Itália e do ex-Regente da Hungria, o Almirante Hothy. Ora, deste sábio, o cérebro fracanhote de quem escreve guardou a primeira notícia sobre a famosa Palavra de Cambronne em Waterloo, como resposta ao General Britânico que propunha a rendição. Mas por lapso do docente, ou, mais provavelmente, por confusão do gaiato, memorizei como tendo sido proferido a alternativa fedorenta, em calão, sendo a historicamente consagrada, «A Guarda morre, mas não se rende» por um embelezamento devido a Victor Hugo.
Ontem, porém, li uma escalpelização do facto por G. Lenotre, em que dá conta das muitas publicações polémicas sobre o tema, bem como da recusa reiterada e cavalheiresca do militar em questão de assumir a autoria da versão mais romântica da réplica, acrescentando que deveria ter saído da boca de um dos seus camaradas que gostaria de identificar, para felicitá-lo. Parece que a bela frase teria brotado ao terceiro dia, após a derrota, da pena de Rougemont, ao serviço de um dos jornais que cobriram a batalha. Enquanto que a mais curta e agressiva hipótese, fora inventada, muitos anos depois, por um boémio escritor de terceira, Genty, ouvida por Nodier e transmitida a Hugo, que celebrizara esta e não a mais depurada.
Nada como corrigir os erros que nos ficaram das impressões da adolescência, mesmo que à custa de uma reedição de créditos autorais errados, como sucedeu ao infeliz M. de la Palisse!
Pelos meus doze e treze anos tive a sorte de ser aluno do Padre Chico, um Salesiano eruditíssimo que me deu aulas de História, explicando convenientemente a salganhada de estruturas económicas a que o programa oficial pós-revolucionário ainda obrigava, porém suavizando-o com a transmissão de conhecimento sobre situações muito mais apelativas, que as suas leituras e experiência lhe haviam facultado. Italiano de origem, dera duas voltas ao Mundo, tendo feito mais umas quantas viagens isoladas, pelo que era frequente ouvi-lo dizer «quando estive em x...». Fora, além disso, confessor do Rei de Itália e do ex-Regente da Hungria, o Almirante Hothy. Ora, deste sábio, o cérebro fracanhote de quem escreve guardou a primeira notícia sobre a famosa Palavra de Cambronne em Waterloo, como resposta ao General Britânico que propunha a rendição. Mas por lapso do docente, ou, mais provavelmente, por confusão do gaiato, memorizei como tendo sido proferido a alternativa fedorenta, em calão, sendo a historicamente consagrada, «A Guarda morre, mas não se rende» por um embelezamento devido a Victor Hugo.
Ontem, porém, li uma escalpelização do facto por G. Lenotre, em que dá conta das muitas publicações polémicas sobre o tema, bem como da recusa reiterada e cavalheiresca do militar em questão de assumir a autoria da versão mais romântica da réplica, acrescentando que deveria ter saído da boca de um dos seus camaradas que gostaria de identificar, para felicitá-lo. Parece que a bela frase teria brotado ao terceiro dia, após a derrota, da pena de Rougemont, ao serviço de um dos jornais que cobriram a batalha. Enquanto que a mais curta e agressiva hipótese, fora inventada, muitos anos depois, por um boémio escritor de terceira, Genty, ouvida por Nodier e transmitida a Hugo, que celebrizara esta e não a mais depurada.
Nada como corrigir os erros que nos ficaram das impressões da adolescência, mesmo que à custa de uma reedição de créditos autorais errados, como sucedeu ao infeliz M. de la Palisse!
9 Comments:
At 5:45 PM, Anonymous said…
Magistral artículo de Pedro J. Ramirez un domingo en El Mundo, año 2003, titulado "Cuidado con los Ca(m)brones", referente a que Aznar no debía fiarse del dúo Chirac/Schroeder. Al parecer el tal Cambrone tenía más dobleces que Diderot, y además de rendirse, se "cambió de bando" y se casó con una rica dama británica......¡Para que te vayas con los soldados....(gabachos).....!
At 6:54 PM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro Espadachim:
Não posso garantir, mas parece que Nodier ouviu a história a meio do século...
Meu Caro Çamorano:
O casamento com a dama britânica, de posses e idade em que, à época, o casamento entre desconhecidos já não era muito usual é verdadeiro. Penso que a rendição só ocorreu quando o próprio Napoleão a ordenou, vendo que Gouchy se tinha atrasado. Os subordinados de Cambronne chegaram a jurar ter ouvido da boca do General a famosa frase bela. E o ex-imperador, em Santa Helena, sempre louvou a resistência até ao fim da Guarda, embora atribuísse a célebre frase a outro dos seus generais. Depois da derrota só os homens de partido não aderiram aos Burbons restaurados. Era a recomposição de Talleyrand.
Mas o artigo deve ser engraçado, pelo jogo de sonoridades...
Abraços a Ambos.
At 10:50 PM, Ricardo António Alves said…
Estimável Padre Chico! As minhas melhores notas a História tive-as com ele, e nunca precisei escrever: «Quem fez o mondo fôdeuss»...
(Havia também outra dele de grande sucesso: «Minino é um maria vai conasoutras!»)
At 7:59 AM, Paulo Cunha Porto said…
Hihihihihi, Caríssimo RAA. A subsistência da italianidade no Mundo Lusitano tem destas coisas...
Agora por História: li ontem um curioso relato autobiográfico do Fereira de Castro, sobre como tentou fazer uma reportagem, ficando uma noite na prisão do Limoeiro, arrependendo-se a meio por não querer ver os presos que o esconderam punidos e acabando na cela do Governo Civil, quando se apresentou às autoridades.
Abraço.
At 12:16 PM, Anonymous said…
El Padre Chico, por lo que se ve, era Grande......
At 12:19 PM, Anonymous said…
Gran tratadista de Derecho Registral, el profesor valenciano Chico Ortiz.
At 1:51 PM, Anonymous said…
El almirante Horthy.....¿Convertido al catolicismo en Portugal?
At 9:41 PM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro Çamorano:
Um corpo pequeno que albergava um espírito de eleição.
Não conheço, mas confio totalmente.
Horthy terá morrido católico, mas não faço ideia da data de iniciação na Igreja.
Abraço.
At 12:54 AM, Ricardo António Alves said…
É verdade, é um belo texto, e memorialístico até, apesar de ter sido escrito em 1928, tinha ele 30 anos...
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