Os Pertences do Outro
Podem chamar-lhe o que quiserem, mas não ascetismo, por favor. Nem sou daqueles que consideram a opção ascética incompatível com a curiosidade, porém é mais do que evidente que a vejo como impossível de ser gerada pelo turismo. Assim, procuremos a explicação para o facto de uma exploração hoteleira situada na espelunca duma favela do Rio de Janeiro estar a ser alvo de uma procura desmedida, por parte de turistas endinheirados. O que se passa é uma mistura de duas coisas: ansiar pelo que se não tem e o ideal da viagem de ida e volta. Muitos diletantes procuram as emoções fortes de uma noite passada na Favelinha, um local que já foi perigoso, com o exacto espírito de quem entra na Montanha Russa de um parque de diversões. Finda a excitação está a vidinha cinzentona de sempre, agora mais suportável, após a pequena quebra da monotonia. Digam lá que não há uma ligeira diferença, comparando com o voto de pobreza de São Francisco de Assis?
4 Comments:
At 1:58 AM, Anonymous said…
Toda a diferença!
Vi há dias, "de urgência", os episódios de "A cidade dos homens", do Fernando Meirelles. E fiquei satisfeito por ver que há miúdos que conseguiram sair da favela.
Ir fazer turismo para uma favela é coisa que me deixa à toa. Ir espiar a desgraça alheia, a pretexto de emoções fortes? Not my cup of tea.
At 7:42 AM, Paulo Cunha Porto said…
Sabes, Caro Luís, é na mesma linha de uma coisa que me repugnou profundamente em Marrocos - a exibição de velhinhas carregadas de lenha, tidas como espectáculo de que os turistas euro-americanos gostavam muito...
Estou como Tu, "não, obrigado!".
Ab.
At 12:29 PM, Jansenista said…
"How many ears must one man have /
Before he can hear people cry?", Bob Dylan
At 6:45 PM, Paulo Cunha Porto said…
É bem verdade, Caro Jansenista, é a surdez ditada pelo comodismo, o egocentrismo e a superficialidade. Em termos de globalidade, cada vez me convenço mais de que só iríamos lá matando tudo e criando de novo a espécie. Mas é bom que nos não deixemos tentar a tomar a tarefa em mãos...
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