O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Thursday, March 16, 2006

Leitura Matinal -297

É pelo primeiro contacto que o inesquecível também se constrói.
A revelação, enfim, da fala a que dirigíamos um culto há muito reiterado, inundando de felicidade o solo árido de um espírito até aí limitado a esperar, muito longe. Depois das meias palavras que estimulam, das pontas descerradas que fingem dar e logo se furtam, perante o impulso de a mais aceder, vem
finalmente o claro som que tudo sobreleva, permitindo um grau de partilha que torna secundário o que resta, à nossa volta. A quebra de uma barreira que transmita a ideia de maior proximidade guia direitinho o nosso íntimo para a abstracção dos factores de infelicidade banal.
Sim, é bem o Som que quebra as muralhas e faz ignorar o mundo de pernas para o ar, as Águias transformadas em vítimas sacrificiais, virtude de conversa desbravadora que permite a entrada num reino mítico de que só tínhamos noção do encanto por indícios maravilhosos, contudo migalhas ao pé da iniciação pela Mão que melhor guia. A imagem da Ponte complementando a sagração do afecto é de sempre e de agora. Para que a exploração cúmplice desse universo escondido não seja encarnada pelo egoísmo do explorador, mas antes pela comunhão de descobridores que coloquem mais alto a Estima.
De Arsenii Tarkovskii, via Paulo da
Costa Domingos::

OS PRIMEIROS ENCONTROS

Cada momento passado juntos
Era uma celebração, uma Epifania,
Nós os dois sozinhos no mundo.
Tu, tão audaz, mais leve do que uma asa,
Descias numa vertigem a escada
A dois e dois, arrastando-me
Através de húmidos lilazes, aos teus domínios
Do outro lado, passando o espelho.

Com a Verdadeira Dimensão conferida por «A Mulher da
Boa Voz»,de Helen Nelson Reed, «Através do Espelho»,
de Mazias e «Só Nós Dois», fotografia de Dan Leung.

3 Comments:

  • At 1:01 PM, Anonymous Anonymous said…

    lindo + dor

     
  • At 4:52 PM, Blogger Viajante said…

    Ser o Som que quebra muralhas, faz lembrar as trompetas de Jericó :)
    e numa mesma linha metafórica, a necessidade de uma ordenada inspiração anterior.

    E o "mundo às avessas", como Galeano o descreve, sendo aquele em que ser solidário, justo e lúcido é um pecado capital, pode ainda assim deixar o apelo de re-virar o Mundo, de acreditar possível e urgente construir um mundo diferente, escrever uma nova história.
    Talvez passos de novas histórias se escrevam mediadas pelo Som e por descobridores que se aproximam.

    Beijo. E sorriso.

     
  • At 7:39 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Dir-me-ia tão alegre pelo Sorriso como pelo Beijo.
    O Arauto que anuncia essa transportadora satisfação poderá assentar em base muito menos distanciadora do que os instrumentos de sopro bíblicos. O segredo está sempre na ponte, que já podia vir detrás, sim, para culminar
    Beijo.

     

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