Leitura Matinal -142

Há angústias e angústias. A mais comum no Homem é a
que é povoada pela incerteza do Destino. A muitas naturezas
automatizadas ou fugitivas a elisão da pergunta fundamental
sobre o que poderia ter sido e, sobretudo, sobre o que será,
apresenta-se como o recurso para ir continuando a vogar. Nas
mais vulgares como nas mais extraordinárias. Mas haverá
realmente vidas vulgares? E extraordinárias? Não será a
grandeza de cada homem uma realidade cuja incapacidade
de percepção se deva, para além do seu currículo, à pressa
decisiva e decisora do observador? Idem para a pequenez humana.
Mas se destinos "tão diversos" são cinicamente equiparáveis na
morte, que responder às dúvidas do que a ultrapassam em cada caso
e que resposta a dar ao singular alvo onde julgamos ver a inocência?
Por muito igual que seja, não deixa de ser a mais inigualável das
destinações votar-se a dar resposta, para além da que vai sendo
dada pela acumulação do tempo, à magna pergunta. E é à beira
do penhasco, depois de olhar o abismo, que a vocação sacerdotal
o vence, ao virar-se para o Céu. Daí pode e deve chegar a cor que
ilumine a nossa Dúvida, digo a nossa vida. A Vida.
Do grande Poeta, não tão lembrado quanto deveria ser, o Padre
João Maia:

DESTINOS

Nasci para me fazerem perguntas?
(- e ninguém responde à que faço
vestido de batina, e com um braço
no jeito de pedir boleia
para outros destinos!)

Com o passo que não dei
e julgo ouvir noutra vereda
chegaria onde só mais tarde chegarei.
Estou em mim como quem deu uma queda.

Para onde vão os outros?
- Para a morte. (Resposta igual!)
Uns a direito, por cafés, foot-ball, teatros rotineiros
outros dando uma grandíssima volta
a partir do Cabo Canaveral.

- E este menino de olhos verdadeiros?

-Embaça uma pergunta destas!
Responder é obra mesmo com a Bíblia na mão.
Debaixo dos pés foge-nos o chão
dilata-se o horizonte a lonjuras molestas.

Que lindo ponto de interrogação!
É tão belo
que há quem julgue ter nascido
para vê-lo
e dar-lhe solução.