Sentido & Sentidos
.
Releitura do extraordinário ensaio de Chesterton «A DEFENCE OF NONSENSE», onde este Celebrante da Razão rende homenagem à faceta dual do homem, em que dois olhares de diferentes perspectivas, épocas ou horários sobre uma mesma realidade podem integrá-la nas normas mais estritas da equação e sistematização, ou recambiá-las para o magnetismo intangível do que atrai sem se deixar explicar. Para justificar Carroll e, sobretudo, Lear, exclui do género nonsensical as passagens de Aritófanes, Rabelais e Sterne, aparentemente subsumíveis ao género, por participarem de um intuito de sátira e encontrarem nele o seu sentido e razão. Assim como considera Lear mais nonsensical que o Autor de Alice, por a exposição a que obrigava a ordenada e institucional vida pública deste remeter para a justificação do escapismo algumas das suas produções artísticas.
Por considerar a específica sedução leariana do Público como carrilando na esfera da emoção, identifica a sua força no facto de trazer uma visão do Mundo correspondente ao intuído por todos, para além «do Trágico, do Romântico e do Religioso»: «O princípio da arte pela arte é um princípio muito bom se quer dizer que há uma distinção vital entre a terra e a árvore e que a árvore tem as suas raízes na terra; mas é um princípio muito mau se significar que a árvore pode crescer ao ponto de ter as suas raízes no ar. Toda a grande literatura foi sempre alegórica - alegórica de alguma visão do universo inteiro, A ILíada apenas é grande porque toda a vida é uma batalha, A Odisseia porque toda a vida é uma viagem, o Livro de Job porque toda a vida é um enigma».
E daqui salta para a Religião que tentaria fazer os Homens tomar consciência do Extraordinário que há em cada trivialidade, uma árvore, por exemplo, esbarrando sempre com a naturalidade a que os humanos tendem a reduzi-la, quando ela encerra os dois aspectos e não apenas um, qualquer que seja, dela. Pelo que chega à conclusão de que os que dizem que a Fé é coisa sem sentido estão muito certos, mas não por ela ser uma invenção sem correspondência comprovada, antes porque a insondabilidade do Desígnio e da Criação está presente tanto na base da espiritualidade como na da ausência de evidência lógica.
Este escrito foi importantíssimo para mim, há vinte e dois anos e voltou a sê-lo hoje. Porque apontando a deficiência ocular dos que apenas conseguem ver um dos lados da Realidade, coisa tão complexa que a pretendemos sempre reduzir à nossa predisposição do momento, nos torna não só mais propensos a abarcar o que é difícil conseguir de uma vez só, como nos faz mais tolerantes, dessa tolerância que leva à compreensão e ao afecto, não da que semeia expectativas indignas.
Releitura do extraordinário ensaio de Chesterton «A DEFENCE OF NONSENSE», onde este Celebrante da Razão rende homenagem à faceta dual do homem, em que dois olhares de diferentes perspectivas, épocas ou horários sobre uma mesma realidade podem integrá-la nas normas mais estritas da equação e sistematização, ou recambiá-las para o magnetismo intangível do que atrai sem se deixar explicar. Para justificar Carroll e, sobretudo, Lear, exclui do género nonsensical as passagens de Aritófanes, Rabelais e Sterne, aparentemente subsumíveis ao género, por participarem de um intuito de sátira e encontrarem nele o seu sentido e razão. Assim como considera Lear mais nonsensical que o Autor de Alice, por a exposição a que obrigava a ordenada e institucional vida pública deste remeter para a justificação do escapismo algumas das suas produções artísticas.
Por considerar a específica sedução leariana do Público como carrilando na esfera da emoção, identifica a sua força no facto de trazer uma visão do Mundo correspondente ao intuído por todos, para além «do Trágico, do Romântico e do Religioso»: «O princípio da arte pela arte é um princípio muito bom se quer dizer que há uma distinção vital entre a terra e a árvore e que a árvore tem as suas raízes na terra; mas é um princípio muito mau se significar que a árvore pode crescer ao ponto de ter as suas raízes no ar. Toda a grande literatura foi sempre alegórica - alegórica de alguma visão do universo inteiro, A ILíada apenas é grande porque toda a vida é uma batalha, A Odisseia porque toda a vida é uma viagem, o Livro de Job porque toda a vida é um enigma».
E daqui salta para a Religião que tentaria fazer os Homens tomar consciência do Extraordinário que há em cada trivialidade, uma árvore, por exemplo, esbarrando sempre com a naturalidade a que os humanos tendem a reduzi-la, quando ela encerra os dois aspectos e não apenas um, qualquer que seja, dela. Pelo que chega à conclusão de que os que dizem que a Fé é coisa sem sentido estão muito certos, mas não por ela ser uma invenção sem correspondência comprovada, antes porque a insondabilidade do Desígnio e da Criação está presente tanto na base da espiritualidade como na da ausência de evidência lógica.
Este escrito foi importantíssimo para mim, há vinte e dois anos e voltou a sê-lo hoje. Porque apontando a deficiência ocular dos que apenas conseguem ver um dos lados da Realidade, coisa tão complexa que a pretendemos sempre reduzir à nossa predisposição do momento, nos torna não só mais propensos a abarcar o que é difícil conseguir de uma vez só, como nos faz mais tolerantes, dessa tolerância que leva à compreensão e ao afecto, não da que semeia expectativas indignas.
A Segunda figura é a ilustração de um dos Poemas do Nonsense de Peter Owen - «QUANDO O TIO JACK SE TRANSFORMOU EM SERPENTE».
3 Comments:
At 12:12 AM, Jansenista said…
Grande Chesterton, com as suas flechas sardónicas travando o eterno combate entre a sua própria bonomia católica e o seu mal-contido desprezo pela vulgaridade, querendo perdoar, mas nunca conseguindo totalmente, as fraquezas alheias.
At 1:10 AM, Anonymous said…
Amigo
Embora seja visivel que a miopia das pessoas aconselha as muitas perspectivas antes que elas saiam da opinião e entrem no domínio da certeza, não podemos diminuir a existência do Universal, da Verdade, de que as suas petrificações politicas, religiosas ou filosóficas nada mais são que alvos a derrubar por setas, surrealismos ou heréticos.
Louvo pois esse seu pendor de libertário,e de facto há que sair do condicionamento manipulativo letal que nos impinge diariamente esta sociedade cada vez mais socializada, putinizada, bucharizada, condolosamente mista de tudo, sem ser nada.
pax, pax
At 9:40 AM, Paulo Cunha Porto said…
Era um polemista terrível, decerto, Caro Jans, muito expressamente tributário de outra grande mente encerrada e corpo descomunal, São Tomás, o Qual se distinguiu sempre pelo humor e paciência evangélica, fora dos poucos momentos de cólera, como aquele em que os irmãos de sangue lhe tentaram inverter as intenções monacais, introduzindo-lhe na câmara uma tentadora atractiva...
GKC sempre se quis ver à imagem e semelhança desse Grande Vulto, descontando, evidentemente, a Canonização, a que não aspirava.
Amigo Anónimo:
Dosear a liberdade estilística que una em vez de dividir sem cair na soberba de sobrepor o individualismo radical ao Ensinamento da Pedra Angular do Culto que nos livre de egoísmos e materialismos vãos e sem centelha de graça e de Graça vem sendo, desde sempre, o meu labor, ainda que em muitos casos restrito à tentativa.
Bem haja.
Abraços a Ambos.
Post a Comment
<< Home