O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Friday, November 03, 2006

Maurras Como Chicote

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Alguém que muito estimo neste canto da blogosfera produziu ontem um post que sou obrigado a prezar bastante menos. Nele se faz uma caldeirada onde são zurzidos a Action Française, os tradicionalistas portugueses dados por inteiro como seguidores dela e os que lhe terão sentido a influência em tempos mais recentes. A presença do referencial do pensamento maurrasiano entre os intelectuais portugueses do Século XX seria, por si só, tema de tese de doutoramento. Mas gostaria de deixar alguns pontos de discordância.
1- Se Maurras tratava com hostilidade o relevo da comunidade judaica na política francesa, não o fazia por considerações étnicas apriorísticas, mas por temer a desagregação do Exército, em função da ameaça alemã e dos ataques dos Dreyffusards contra as chefias militares. Era este o significado da expressão «inimigo do interior», em que a vertente hebraica enformava apenas uma das componentes, entre as quais a Finança, ao contrário do que quer fazer passar. O movimento chamou sempre «racistas» aos seguidores de Drumont, antes das novas emergências dos anos 1930´s.
2- A postura de sacrifício dos valores foi levada ao extremo durante a Guerra de 1914-1918, apoiando o esforço da União Sagrada, comandada por um velho adversário, designação que tinha conteúdo real, ao contrário da que por cá houve, reduzida ao entendimento entre Evolucionistas e Democráticos, que tinham comum matriz, embora não matiz.
3- O exemplarismo da luta pelo seu País de armas na mão, com a queda no Campo da Honra desse Léon de Montesquieu que tanta falta fez.
4- Sendo por cá a principal doutrina tradicionalista pós-oitocentista a do Integralismo Lusitano, a injustiça de enfeudar ao Maurrasismo os doutrinadores dele. Já Sardinha protestara por António Sérgio os dar por «escravos intelectuais» da Action. Em Portugal, quem queria transpor ipsis verbis os ensinamentos da então pujante pléiade francesa era Mariotte, cujo acordado concurso para a revista «NAÇÃO PORTUGUESA» ficou comprometido por essa mesma razão, conforme deixou expresso Luís de Almeida Braga em «SOB O PENDÃO REAL». Os Integralistas citaram Maurras como muitos outros, até Proudhon, Soriano e o primeiro Rochefort, no que tinham de coincidente com o seu pensamento. Os seus fundamentos doutrinais, porém, foram encontrá-los em Suarez, Osório, Penalva e nos Grandes Miguelistas.
4- Os publicistas mais próximos de nós são por Si acusados de adicionar algum Sebastianismo. Não creio que possa generalizar-se tal, apesar da curiosidade e das páginas meritórias que vários, capitaneados pelo trio Quadros-Afonso Botelho-Sotomaior escreveram sobre o tema, numa tentativa de indagação das especificidades do Carácter Nacional, mais do que querendo fazer decorrer daí um ideário de governação. Relembre-se que o Legitimismo, por seu turno, foi sempre hostil aos Sebastianistas, encarregando José Agostinho de Macedo de os demolir, como lembra Palmeirim. Isto quando podia perfeitamente ter incorporado essa ânsia, preenchendo-a com a Figura Querida de El-Rei D. Miguel.
5- O movimento francês que execra foi criado por dois republicanos, Vaugeois e Pujo, desgostados com os ataques aos Militares e à Universidade. Mais tarde, Maurras, ressuscitando luminosamente o Tradicionalismo, fê-los ver que a rejeição do Mal que grassava nas instituições republicanas só poderia ser consequente adoptando o único remédio radical, o da Monarquia descentralizada e apartidária. Não fale nos privilégios. Com excepção de Montesquieu, todos os dirigentes de tomo da A. F. eram provenientes da burguesia e nunca elevaram a proposta política a restauração dos ditos, que, como sabe, correspondiam a uma reivindicação do Terceiro Estado, eliminando a concorrência, com a proibição de trabalhar; e originando queixas ao Rei quando esta era infringida.
5- A fundação da Action Française teve como fim reagir contra a indignidade reinante. Peço ao Jansenista, que tanto e tão justamente se vem insurgindo contra as mediocridades da nossa vida pública, que se abstenha da pascaliana injunção de obediência a poderes constituídos, por muito maus que sejam. Um qualquer Providencialismo, aplicado aos nossos dias, não trará coisa diversa de uma repulsa sem substancia. É preciso juntar à coragem de negar a de afirmar. E peço-Lhe, em atenção ao Alto Intelecto que me habituei a admirar, que não invoque facticidades correspondentes a limitações que não foram escolhidas para contrapor a visões limitadas decorrentes de escolha. Há argumentos melhores do que esse. Mais, as ideias não têm outro tempo do que aquele que a capacidade dos Homens lhes der.
Pese ao meu arrivismo na classe, gostaria que me contasse entre os amigos maurrasianos que refere.

11 Comments:

  • At 3:21 PM, Anonymous Anonymous said…

    É o Misantropo no seu melhor, assinalando com brilho o aniversário do seu heterónimo PCP.

    Certos "estrangeirados" têm dificuldade em perceber que alguém leia e admire (e receba, até, natural influência) sem no entanto macaquear.

    Ele há cada kant...!


    Port-Royal

     
  • At 4:43 PM, Anonymous Anonymous said…

    ¿Qué se conmemora el 3 de noviembre?

     
  • At 7:05 PM, Anonymous Anonymous said…

    Gostei muito caro Cunha Porto. Já agora quer recordar-me esse apontamento de Palmeirim sobre JA de Macedo?

     
  • At 7:57 PM, Anonymous Anonymous said…

    El 3 de noviembre se conmemora el aniversario de Don Pablo - cuarenta y tantos años (la discreción me impide ser más exacto) al servicio de la Cultura.
    Enhorabuena, Pablito!

    El Guerrero del Antifaz

     
  • At 8:32 PM, Anonymous Anonymous said…

    Parabens, Paulo..! Feliz, Feliz en tu día.....amiguito que Dios te bendiga.....Que reine la paz en tu día.....¡Y que cumplas muchos más.........!

     
  • At 9:09 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Obrigadíssimo, Port-Royal, mas atenção: Este Jansenista é valor muito seguro e quando se libertar da prisão das Afinidades Acumuladas será Enriquecimento de Tomo para o campo nacional.

    Respondido está, Çamorano Amigo.

    Meu Caro Je Maintiaindrai:
    Há uma menção ao caso no volume «EXCENTRICOS DO MEU TEMPO», no capítulo «O SENHOR PROCÓPIO (O último sebastianista)», Lisboa, 1891.
    Muito obrigado pela aprovação.

    Um Guerrero delator, ou melhor, amplificador da inconfidência?

    Obrigadíssimo, Çamorano Amicíssimo. E que em todos eles tenha o Privilégio e o Prazer da Tua Amizade.
    Abraços a Todos.

     
  • At 9:37 PM, Anonymous Anonymous said…

    Maravilhoso, meu Caro Paulo. O que pode escrever a talentosa pena de um maurrasiano comme il faut!
    Um forte abraço.

     
  • At 10:09 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Meu Caro Euro-Ultramarino:
    Foi "em defesa da Honra" como é costume dizer. Obrigadíssimo pela aprovação, em termos que só a Sua imprescindível e compensadoríssima Amizade justifica.
    Abraço.

     
  • At 10:20 PM, Anonymous Anonymous said…

    E ponto final.

     
  • At 10:34 PM, Anonymous Anonymous said…

    Ora! Logo aí... E não o tenho aqui à mão; mas prometo nota. Mais vinhetas portuguesas e lisboetas.

     
  • At 11:01 AM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Caro Euro-Ultramarino:
    É grande motivo de orgulho ver tamanho "nihil obstat", saído das teclas de umÍntimo Cultor de Bainville!

    Meu Caro Simão:
    Apesar de ser assunto digno de interminável debate, quando, como no caso, o Interlocutor o merece.

    Meu Caro Je Maintiendrai:
    Fico a aguardar, ansioso. Se tiver pressa nele, terei o maior gosto em emprestar-Lhe o meu exemplar.
    Abraços aos Três.

     

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