A Insustentável Leveza do Ter
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É francês o flirt? Decerto porque nenhuma outra literatura elevou a tais píncaros a opção por relacionamentos que constituam escapatórias à via principal do Dever e da Duração. E porque nenhuma Mulher, mais do que a da Nova Gália, tomou tanto, como inerente ao Seu universal estatuto, a vocação de emitir chispas que funcionem como pré-preliminares da posse imediata, a rudeza que noutras Nações se contrapõe ao cansaço da propriedade sentimental.
Já que, nesse jogo filtrado dos desejos, há as emanações pedantes de classe que permitem a criação de atmosferas vedadas a estratos com mais pressa e menos conversa. Suprema ironia, este absoluto privilegiar da forma, do romance, acaba ou por negar-se, ou por extinguir-se na equivalência universal, conforme recue ou avance, hesitando ingenuamente entre o contacto e a distância que compõem a irrealidade artificialmente criada pelos protagonistas. Pelo que não espanta que alguns encontrem a bóia de salvamento no lado oposto ao do Parceiro dessa pequeníssima servidão.
De Campos Monteiro:
O FLIRT
O flirt...
O flirt, inovação recente,
é uma coisa muitíssimo inocente
Como a palavra é ingleza, e um pouco extranha,
ha quem lhe ignore a significação,
incluindo os naturaes da Gran-Bretanha,
que nunca tal fizeram nem farão.
Porque o «flirt» é francês. E é á francesa
que tem maior virtude e mais sabor.
Ha tambem quem o faça á portuguesa,
porem na tradução perde o valor.
O flirt, como afirma toda a gente,
é uma coisa muitíssimo inocente.
Uma senhora encontra um indivíduo.
Gosta d´ele Ele dela. Ambos casados,
Sabem que o amor é fruto prohibido,
e começam um «flirt» entusiasmados.
Procuram-se a miudo, e, conversando,
trocam palavras cheias de candura.
Entrelaçam as mãos de quando em quando,
e fitam-se, sorrindo com ternura.
O «flirt» é tudo que ha de mais decente,
é uma coisa muitíssimo inocente.
Passados dias, já um beijo aflora
aos lábios de ambos... e ressoa um beijo...
Scintila-lhes nos olhos o desejo...
Ele torna-se pálido... Ela cora...
Isto é amor! - dirá talvez alguem -
Amor á antiga, impuro e sensual! -
Perdão! Se fosse amor - sabem-n´o bem -
Seria desonesto e trivial.
Mas, como «flirt» é chic; e é, realmente,
uma coisa muitíssimo inocente...
Habitats bem sugeridos pela vida de Sociedade
desenhada por Mucha
e,
maritimamente, por A. F. Graves: «Flirt» vs. «Flirt».
É francês o flirt? Decerto porque nenhuma outra literatura elevou a tais píncaros a opção por relacionamentos que constituam escapatórias à via principal do Dever e da Duração. E porque nenhuma Mulher, mais do que a da Nova Gália, tomou tanto, como inerente ao Seu universal estatuto, a vocação de emitir chispas que funcionem como pré-preliminares da posse imediata, a rudeza que noutras Nações se contrapõe ao cansaço da propriedade sentimental.
Já que, nesse jogo filtrado dos desejos, há as emanações pedantes de classe que permitem a criação de atmosferas vedadas a estratos com mais pressa e menos conversa. Suprema ironia, este absoluto privilegiar da forma, do romance, acaba ou por negar-se, ou por extinguir-se na equivalência universal, conforme recue ou avance, hesitando ingenuamente entre o contacto e a distância que compõem a irrealidade artificialmente criada pelos protagonistas. Pelo que não espanta que alguns encontrem a bóia de salvamento no lado oposto ao do Parceiro dessa pequeníssima servidão.
De Campos Monteiro:
O FLIRT
O flirt...
O flirt, inovação recente,
é uma coisa muitíssimo inocente
Como a palavra é ingleza, e um pouco extranha,
ha quem lhe ignore a significação,
incluindo os naturaes da Gran-Bretanha,
que nunca tal fizeram nem farão.
Porque o «flirt» é francês. E é á francesa
que tem maior virtude e mais sabor.
Ha tambem quem o faça á portuguesa,
porem na tradução perde o valor.
O flirt, como afirma toda a gente,
é uma coisa muitíssimo inocente.
Uma senhora encontra um indivíduo.
Gosta d´ele Ele dela. Ambos casados,
Sabem que o amor é fruto prohibido,
e começam um «flirt» entusiasmados.
Procuram-se a miudo, e, conversando,
trocam palavras cheias de candura.
Entrelaçam as mãos de quando em quando,
e fitam-se, sorrindo com ternura.
O «flirt» é tudo que ha de mais decente,
é uma coisa muitíssimo inocente.
Passados dias, já um beijo aflora
aos lábios de ambos... e ressoa um beijo...
Scintila-lhes nos olhos o desejo...
Ele torna-se pálido... Ela cora...
Isto é amor! - dirá talvez alguem -
Amor á antiga, impuro e sensual! -
Perdão! Se fosse amor - sabem-n´o bem -
Seria desonesto e trivial.
Mas, como «flirt» é chic; e é, realmente,
uma coisa muitíssimo inocente...
Habitats bem sugeridos pela vida de Sociedade
desenhada por Mucha
e,
maritimamente, por A. F. Graves: «Flirt» vs. «Flirt».
3 Comments:
At 3:32 PM, Anonymous said…
Ó flirt...só a palavra me deixa sonhadora. Mas tive sempre ( a partir de ceta altura) cuidado em me ficar pelos olhares por bem reconhecer o perigo.
Mas ainda estou de sorriso
Beijinho, Paulo
At 3:40 PM, Paulo Cunha Porto said…
Beijinho, Querida MFBA.
Um certo Sorriso não é um dos principais elementos dele?
At 9:09 AM, Paulo Cunha Porto said…
Aliás, Caro Visconde, os versos também são um pouquinho passados de moda. Mas achei-lhes algum interesse na sátira que faziam ao "papel de embrulho" do real.
Na INTERNET temos virtualidades, enquanto que o "flirt" é uma realidade, apesar de se querer como de palpabilidade reduzida ou diferida.
Abraço.
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