Leitura ao Entardecer -4
A suprema impotência do Homem está em lutar contra si. Dizer que
de destino se trata é já meia confissão de derrota. Mas é mais fácil persistir na luta quando se identifica um adversário exterior, que se possa estilhaçar ou vilipendiar. Quando a vontade, porém, é contrariada por partes do nosso ser, que se arvoram nas tenazes
portadoras de linhas indeléveis que nos submetem, tornando assim obsoletas as que estão em livros contidas, faz-se luz sobre a maneira que resta de impô-la. Que é a renúncia total ou parcial a si, seja pelo termo, ou por via da amputação dessa viciada parcela que ameaça prosseguir para o abismo, indiferente aos esgares de dor subsistindo no grosso de nós. Porque fácil é dizer que somos o próprio destino, se se ignorar o que qualquer mediana sabedoria ensina - que não há a pretendida unidade do nosso eu, mas que essa estranha divisibilidade leva a reconhecer no apagamento da parte condicionante a capitulante abdicação duma ideia da sua domesticabilidade.
De Leonardo Mathias:
LINHAS
Linhas cruzadas
da palma da mão
independentes e rebeldes
mais fortes do que eu!
(Escondi a mão
consultei bruxas
aceitei feitiços
insultei mágicos de feira
curandeiros de aldeia
parti bolas de cristal
rasguei cartas de baralhos)
Mais fortes do que eu,
as linhas da minha mão!
Atiçado por «Origem do Destino», de Helena
Noé van Antwerpen e «Mão», de Tölgyesi Norbert
Festményei.
de destino se trata é já meia confissão de derrota. Mas é mais fácil persistir na luta quando se identifica um adversário exterior, que se possa estilhaçar ou vilipendiar. Quando a vontade, porém, é contrariada por partes do nosso ser, que se arvoram nas tenazes
portadoras de linhas indeléveis que nos submetem, tornando assim obsoletas as que estão em livros contidas, faz-se luz sobre a maneira que resta de impô-la. Que é a renúncia total ou parcial a si, seja pelo termo, ou por via da amputação dessa viciada parcela que ameaça prosseguir para o abismo, indiferente aos esgares de dor subsistindo no grosso de nós. Porque fácil é dizer que somos o próprio destino, se se ignorar o que qualquer mediana sabedoria ensina - que não há a pretendida unidade do nosso eu, mas que essa estranha divisibilidade leva a reconhecer no apagamento da parte condicionante a capitulante abdicação duma ideia da sua domesticabilidade.
De Leonardo Mathias:
LINHAS
Linhas cruzadas
da palma da mão
independentes e rebeldes
mais fortes do que eu!
(Escondi a mão
consultei bruxas
aceitei feitiços
insultei mágicos de feira
curandeiros de aldeia
parti bolas de cristal
rasguei cartas de baralhos)
Mais fortes do que eu,
as linhas da minha mão!
Atiçado por «Origem do Destino», de Helena
Noé van Antwerpen e «Mão», de Tölgyesi Norbert
Festményei.
3 Comments:
At 11:51 AM, Anonymous said…
Nas linhas da mão se escreve o que é inato no indivíduo. E inato do indivíduo [exactamente; esse mesmo...] é dar o flanco aos aversários, pela impossibilidade de renúncia a si e ao seu ego. Assim as linhas da mão lhe escrevem o des(a)tino. Cumpts.
At 1:07 PM, JSM said…
Caro Paulo Cunha Porto
Texto intrigante! Que faz pensar...Qual será a parte inútil, que ainda assim não capitulou perante o que valia a pena salvar!?
Estas inclinações doentias, perdedoras, que deslocação de interesses representam?
Existe um texto sublime de Fernando Pessoa que reflecte um pouco sobre o destino dos homens: "À memória de António Nobre"! Talvez o reproduza no interregno, para que conste.
Um abraço.
At 1:36 PM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro Bic Laranja:
O "a" parentisado dá a ilustração perfeita da tensão provocada por uma pretensa capacidade de distinguir as inscrições determinantes em algo de nós, ou no exterior, no transcendente. Parabéns pelo achado.
Meu Caro JSM:
Creio que conheço o texto a que Se refere, que é interessantíssimo. Fico numa expectativa intensa, quer pela reprodução dele, quer pelo aparato crítico com que o Generoso Autor do «Interregno» nos costuma presentear.
Quanto à questão que levanta, encontro-lhe a perspicácia e atenção a que me habituou e que, quando aplicada aos meus pobres escritos, tanto me honra. Com efeito, qual será mais invulnerável à nossa tentativa de desvendamento e domínio? E a porção do "eu" que resiste, comparativamente àquela que insiste em determinar? Com tantos vectores em sentidos divergentes, cada uma é o resistente à outra. O que torna dramática a antinomia que, quando referida a conformações de fora, é apenas esforço e delapidação anímica.
Abraços a Ambos.
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