O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Sunday, May 28, 2006

De Agora a Contracosta

Em 28 de Maio de 1926 nem todos sabiam o que queriam, mas todos sabiam o que não queriam. E o que rejeitavam era a continuação de um regime universalmente odiado, salvo pelos Democráticos, outrora dirigidos por Afonso Costa. Este tinha-se afastado para o estrangeiro, desde que percebera, na altura da implantação do Sidonismo, que o exército poderia servir para mudanças mais drásticas do que a de proporcionar a faculdade de formar interlúdios ministeriais à oposição, a qual, dentro do regime, não dispunha das milícias armadas e das viciações eleitorais na mão do seu partido. Mas ao deixar a liderança visível, o País não melhorara em nada, pois à luta dos seus contra os outros havia sucedido a própria digladiação das facções "direitista", com António Maria da Silva, a "centrista" de Domingos Pereira e a radical de José Domingues dos Santos, sempre oscilantes entre a ameaça e a concretização de dissidências a acrescer a outras, prévias. Se a perseguição religiosa tinha abrandado, porque já pouco havia para perseguir, o assassinato político conheceu tempos áureos após a morte de Sidónio. Os grupos armados multiplicavam-se, as gestões catastróficas idem, com correlatas perdas no emprego; e até a soberania via as suas manifestações alienadas, com a estagnação da máquina da justiça e a criação de moeda entregue a Alves dos Reis.
O País só fingia não ter entrado em auto-gestão, pelo domínio das sociedades secretas. A 28/05/26 o Presidente da República e o Presidente do Ministério tinham nos preenchidos curricula as vergonhosas lideranças da Maçonaria e da Carbonária, respectivamente.
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Perante o triste quadro não rebentou uma revolução, mas três. A do Norte que ia descendo e proclamando, cheia de gente doutrinada, mas não unificada entre si. A de Lisboa, que, com Cabeçadas, um dos marinheiros da Rotunda de 1910, recebia de Bernardino Machado a transmissão dos poderes e era a única que queria salvar o regime, enquanto que as outras duas já tinham percebido não ser esse o meio de salvar o País. A do Sul era encabeçada por Carmona. Avançava com silenciosa eficácia e o seu Chefe, não tendo filiação partidária, prestigiara-se como Acusador em processos de rebeliões anteriores, isentando os réus no último caso, ao diagnosticar a doença da Nação. Saltava à vista quem acabaria por prevalecer. Faltava, pensava-se, encontrar quem governasse. Mas não era assim. O efémero Gomes da Costa, ao passar pela Lusa Atenas, metera na bagagem o nome de um certo Professor de Coimbra...
E hoje? Os tempos são diferentes, já se sabe. Não se mata, ainda, muita gente na rua. Mas há sinais de desagregação. A Justiça - que é por onde costuma cair o poder - já é alvo de risota. As funções financeiras da Soberania emigraram para uma Bruxelas em cuja protecção os políticos do regime confiam, mas que com alargamentos de mãos largas ficou com pés de barro e já não é gigante. As sociedades francesa e alemã evidenciam problemas gravíssimos, a Itália tem mais com que se entreter e o Reino Unido não se mete nesses assados. Se num só estado importante a coisa der para o torto a gloriosa União cairá como um castelo de cartas. E com ela o seguro de vida do regime que temos. Mas haverá Homens para o substituir? - perguntais. Descansai. aparecem sempre, mais tarde, ou mais cedo. Resta saber se ainda será a tempo.

Posted by Picasa

20 Comments:

  • At 10:55 AM, Anonymous Anonymous said…

    Parabéns pelo texto; grande título!
    Olhe! Depois dos entreguistas de 75 e da firmada capitualação em 86, Portugal acabou. No mais sossegue: o mundial da bola está aí para nos manter viva a ideia do defunto. Cumpts.

     
  • At 11:17 AM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Obrigadíssimo, Caro Bic Laranja. Mas é triste termos de nos contentar com um mero fantasma, ainda que berre muito.
    Abraço.

     
  • At 11:37 AM, Blogger Nuno Adão said…

    Sim senhor, textos destes deixam-me bem disposto logo de manhã. Não há nada como uma sã leitura!

     
  • At 11:52 AM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Obrigadíssimo, Amigo Thoth, sei bem a Que Divindade há que dar graças pela dádiva da escrita.
    Abraço.

     
  • At 1:49 PM, Blogger Mendo Ramires said…

    Já imprimi e arquivei.
    Renovado abraço.

     
  • At 1:58 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Não mereceria tanto!
    Abraço apertado.

     
  • At 3:00 PM, Blogger Flávio Santos said…

    O nosso amigo Mendo deve ter um fabuloso "best off" dos blogues nacionais!

     
  • At 3:22 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    É uma Figura Única a quem o arquivo da Portugalidade muito fica a dever!

     
  • At 4:40 PM, Blogger JSM said…

    Também gostei muito de ler. Sim , Senhor, o nosso Misantropo domina a informação! Só faltou falar do papel dos monárquicos. Se calhar foi o 'papel de embrulho' do costume...a avaliar pelo que se passa hoje: um tranquilo 'silêncio dos inocentes'!
    Mas Você ainda luta!
    Parabéns.

     
  • At 5:07 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Meu Caro JSM:
    Obrigado pela generosidade do juízo. Mas aludi aos monárquicos a propósito da gente doutrinada mas entre si contraditória que vinha do Norte. E detalhei o que devia, quanto a mim, ser a posição respectiva, com o extracto de Ameal.
    Abraço.

     
  • At 5:40 PM, Blogger JSM said…

    Tem razão. Precipitei-me.
    Um abraço.

     
  • At 6:40 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Qual precipitação! É, sim, meu Caro JSM, muito amor à Causa. Se todos os Monárquicos e Filomonárquicos fossem Assim, há muito que El-Rei já estaria restaurado no Trono dos Seus Augustos Avós.
    Abraço.

     
  • At 6:45 PM, Blogger Marcos Pinho de Escobar said…

    Caro Amigo:

    Grande texto! No dia 28 de maio de '26 "nem todos sabiam o que queriam mas sabiam o que não queriam." E tiveram de esperar até 27 de abril de '28 para encontrar aquele que sabia muito bem o que queria e para onde iria. A situação actual é talvez pior do que em '26, já que às mazelas intrínsecas do regime anti-natural junta-se o poderio mundialista. Um dia rebenta...

    Um forte abraço.

     
  • At 7:04 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Meu Caro Euro-Ultramarino:
    é esse duplo obstáculo que urge levar de vencida, de preferência antes de que o rebentamento se revista de uma modalidade que espalhe muitos estilhaços.
    Não foi o Grande Homem de que fala que disse saber muito bem o que queria e para onde ia? Era a superação do simples golpe.
    Grande abraço.

     
  • At 8:29 PM, Anonymous Anonymous said…

    Curiosidad historica: el dia 28 de mayo de 1925, la Asamblea Legislativa Venezolana aprobó la propuesta del doctor Juan CARMONA, para declarar día de Fiesta en Venezuela el 28 de mayo, día natalicio del GENERAL Jacinto Lara. Otro, CARMONA, fue presidente por unas hora de Venezuela tras el golpe anti- Chávez de 2002....¿Hubiera sido el hombre del destino para salvar a Venezuela?

     
  • At 8:46 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    O Mistério dos Nomes, Caro Amigo. Interrogo-me sobre o que o Pedro Rodrigues teria a dizer sobre o tema...
    Ab.

     
  • At 11:15 AM, Anonymous Anonymous said…

    Excelente texto, Paulo! Vou passá-lo a um professor de História que nós bem conhecemos...;-)

    Abraços
    T

     
  • At 11:21 AM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Obrigado, Amigão. É sempre uma Honra conseguir Tais Leitores.
    Ab.

     
  • At 5:15 PM, Anonymous Anonymous said…

    Aparecerão homens ou, mas também mulheres, espero. O que é necessário é que o modelo, a estrutura do Estado seja boa porque senão não há quem resista. Só as boas árvores é que dão os melhores frutos. Contudo a forma democrática de governo (e não a republicana) deve ser sempre e em qualquer circustância salvagurdada. Não vamos cair no erro de repetir a História. Tenhamos presente que boa parte da sociedade portuguesa dos anos vinte clamava por uma ditadura forte para acabar com o desastre e a bandalheira da também pouco ou nada democrática, caótica, corrupta... Primeira República. O resultado depois foi o que se viu; um período obscuro e triste de quarenta e oito longos anos de supressão total das liberdades fundamentais, arbitrariedade, repressão, perseguições, torturas e assassínios. Embora a Primeira República não fosse de forma alguma um modelo do que quer que fosse e muito menos de de Democracia, a segunda foi ainda pior.
    Lamento profundamente que muitos dos defensores da restauração da Monarquia sejam saudosistas da Segunda República (Estado-Novo) e até a defendam acabando por, consequentemente, defender a república; pelo menos uma versão musculada desta. Considero que tal coisa não abona nada a favor da Monarquia pois estas posições só alimentam e fortalecem a república e os seus defensores, os detractores da Real chefia de Estado e geram inúmeros anti-corpos em boa parte dos portugueses principalmente aqueles que viveram durante esse período negro da nossa Historia recente. Tenhamos também a consciência de que nunca, numa ditadura, poderíamos ter liberdade de expressão, dizer ou escrever aquilo que pensamos quando se trata de críticas negativas ao status quo, à situação, ao regime vigente, ter blogues, em suma, expressar a nossa simples opinião sempre a bem da nação nem comentar o que é «postado» como é o que estou a fazer neste momento.
    Pessoalmente, prefiro mil vezes mais esta república e esta triste situação ao regresso da ditadura. Na minha opinião e certamente também na de muitos defensores da Monarquia incluindo o Paulo o caminho a seguir passa por um aperfeiçoamento da nossa Democracia, uma democracia para o século XXI com mais liberdade, mais igualdade, mais fraternidade – pois que estes não são Valores do republicanismo mas antes da Democracia – mais solidariedade, mais amor pelo nosso país a todos os níveis tendo como modelo a Suécia, a Noruega, a Espanha, o pequeno mas exemplar Luxemburgo ou até mesmo o Japão (sem pena de morte) e tendo mesmo a ambição de ir mais longe. Está pois à vista de todos que estes aperfeiçoamentos da nossa Democracia nunca poderiam ser uma simples maquilhagem, uma simples operação de cosmética mas antes uma vastíssima e profunda operação plástica dado o estado a que se chegou.
    A tarefa é gigantesca e para que tal se concretize é necessário que surja um ou preferencialmente vários José Mourinho da política, um ou mais génio(s) politico(s) masculinos e/ou femininos e depois da tarefa estar realizada bastaria apenas gerir, governar a nível central e local com bom senso, com gente de elevadíssima craveira, elevadíssimas qualidades morais, éticas, intelectuais, culturais e com elevadissimo sentido de responsabilidade encarando e interiorizando a causa publica (a res publica) como um sacerdócio e aí nessa altura já a governação do país seria muito mais fácil, sem a degradação da situação a que actualmente se assiste, com uma dinâmica positiva, de vitória e confiança, merecendo Portugal o respeito da comunidade internacional, e em especial dos povos que partilham connosco a nossa língua, o prestigio na cena global com uma voz forte, ouvida e respeitada honrando séculos de História e influência em todas as partes do globo. A qualidade de vida dos portugueses subiria, não tenho duvida alguma, exponencialmente. Todos ganhariam e não apenas uma pequena elite que deste modo não estaria sujeita a qualquer tipo de contingências, instabilidade e convulsões sociais que mais cedo ou mais tarde surgirão pelo actual andar da carruagem.

     
  • At 7:32 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Meu Caro Paulo Selão:
    Sou monárquico fervoroso, tanto que não desejo uma monarquia refém de partidos. Lamento muito mas não tenho a generalidade das monarquias europeias de hoje por exemplos a seguir, ressalvando a inglesa que se adapta apenas ao carácter único daquele Povo.
    Quanto aos pretensos horrores das perseguições do Estado Novo, falei a propósito no dia 28 de Abril, homenageando Salazar. Dizer que um regime que trouxe a tranquilidade e que, sim, foi encarado como libertador dos desmandos, assassinatos e perseguições diários da 1ª República é pior do que esta é coisa que não posso aceitar. O inimigo supremo está no conceito de partido e se alguma crítica há a fazer a Salazar é ter permitido o simulacro de um, a que, de resto, não ligava nenhuma. Quando convidou Franco Nogueira para MNE, este disse-lhe: «Plenamente de acordo com o esforço nacional para manter o Ultramar, mas, Senhor Presidente, eu não sou da União Nacional». Resposta: «Ah, nem seja, nem seja».
    Não quero um Rei para enfeitar vaidades. Quero-O para unir um povo. O que, conhecendo a partidarite potuguesa, não se consegue com essas organizações contra-natura.
    Um abraço discordante, mas grato.

     

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