O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Wednesday, February 22, 2006

Leitura Matinal -275

Que o Homem quer sempre o que não tem, sabe-se. Vivendo a
agitação, ambiciona o repouso. Quando tranquilo, deseja, com toda a aplicação, a quebra da monotonia. Não estando sozinho no Mundo, agrava-se a discrepância entre o tido e o querido, por aparente satisfação que a carne dê. Porque, lá vamos nós outra vez, triunfante na posse da extensão, ao amar verdadeiramente, não se contenta com menos do que juntar-lhe o espírito do Ser que, momentaneamente, chamou seu.
A impossibilidade de sincronizar o sono com a contraparte do seu amor fornece-lhe a ocasião para o crime de que já tinha o motivo: transformar a curiosidade cortês, no sentido passadista e fundo do termo, em desconfiança obsessiva que, contemplando o adormecimento, lhe tira, por sua vez, o sono, perpetuando a vigília de obsessivas interrogações.
Que «a incerteza que vem dos sonhos» é aqui muito superada pela de estar acordado. Condenado à desconfiança que vai corroendo, menos e mais do que o ciúme, de uma vez só, pois lhe falta o objecto concreto em que aplicar-se. Até que o intelecto perceba que a sua agitação é ultrapassada facilmente pela dos sentidos, que o absurdo questionar cede perante a intensidade do desejo. Uma outra forma de não ceder ao descanso.
Paul Valéry:

LA DORMEUSE

Quels secrets dans son coeur brûle ma jeune amie,
Ame par le doux masque aspirant une fleur?
De quels vains aliments sa naive chaleur
Fait ce rayonnement d´une femme endormie?

Souffle, songes, silence, invincible acalmie,
Tu trionphes, ô paix plus puissante qu´un pleur,
Quand de ce plein sommeil l´onde grave et l´ampleur
Conspirent sur le sein d´une telle ennemie.

Dormeuse, amas doré d´ombres et d´abandons
Ton repos redoutable est chargé de tels dons,
O biche avec langueur longue auprès d´une grappe,

Quel malgré lâme absente, occupée aux enfers,
Ta forme au ventre pur qu´un bras fluide drape,
Veille; ta forme veille, et mes yeux sont ouverts.


Associado a ««Alegoria da Paz», de Simon Vouet, «Segredos»,
de G. L. Hendon e «Sonhos e Sombras», de Arisa Boit.

2 Comments:

  • At 8:04 PM, Blogger Viajante said…

    Que o Homem pode aprender a valorizar o que tem, e a redescobri-lo, também se sabe. E entre os objectos da sua atenção, pode estar ele mesmo, na autovigilãncia ou autocontrole, domínio de Si.
    Mas será uma aposta na manutenção das fronteiras e na descoberta dos limites, o que, ao memso tempo, é quase paradoxalmente impossível.

    Sorriso leve, de pensar aporético.

     
  • At 3:55 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    É na confissão aporética desse pensar que desemboca a luta entre o controle do Homem e o seu duplo, Senhora, a sua (dele) sombra. E é coisa bem perigosa saber qual levará a melhor. Porque revela-se terrível a incontinência dos limites, até à possível negação. O certo é o combate indeciso?
    Bj.

     

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