Leitura Matinal -230
Já na Antiguidade Grega era contraposta a loucura permanente e da qual, de forma voluntária, se não podia sair, à alienação passageira que o vinho
proporcionava. A biografia de Sileno diz tudo: o velho que defendia «quem não aprecia o vinho é louco» gozava da prestigiosa fama de sábio e do proveito de conhecer o futuro, como comprova o passo em que trocou as voltas a Midas.
Na mesma civilização o deus da criatividade, Dionísio, ocupava o pelouro da protecção vínica. Entre os Muçulmanos, proibida pelo Profeta a ingestão na Terra, foi diferida para o Paraíso, como recompensa post-mortem, sendo de vinho um dos quatro rios que lá correm.
No Mundo Cristão foi o Vinho Consagrado que se transformou no Sangue ritual que liga à Verdade Eterna. Mas mesmo em mais mundanas circunstãncias serve esse néctar como critério de destrinça de verdades menores perante a gigantesca pilha de joio imposta aos nossos olhos pelas circunstâncias da vida. O povo vê a verdade in vino veritas, no que diz e faz aquele que, tocado, se vê sem a miríade de recursos necessários ao embuste. Por outro lado, na civilização inglesa, serve para avaliar o carácter dos homens, ou a falta dele. Sempre inspirou profunda repugnância o teetotal, o abstémio, indivíduo reputado de falho de inteireza. E um certo Professor de Literatura Inglesa de Oxford celebrizou-se por recusar voltar a ensinar uma linha que fosse de Tennyson, a partir do momento em que o viu misturar água no Vinho do Porto.
Nos amores, já se sabe, Cupido sorvia-o com gosto. E como alívio das infelicidades é universalmente reconhecido, tal como é a ele que recorremos quando, à mesa, queremos desejar saúde. Significará essa constatação que devemos estatuir um novo mandamento que aconselhe a andar etilizado todo o tempo? Nem por sombras, afinal, como intuíram os existencialistas, caindo todavia no exagero inverso, para sermos, verdadeiramente, Homens, a felicidade também deve ser tomada com moderação...
De Ibn al-Zaqqaq:
CENA BÁQUICA
É servido, de roda, o vinho
no jardim coberto de geada.
sobre as trevas se executa
já a sentença da aurora.
Olha-nos a taça do vinho:
as pupilas das suas bolhas
substituem os olhos lânguidos.
Não se terão ocultado
as estrelas do horizonte,
apenas se mudaram
dos céus para o jardim.
Temos o «Sileno Bêbedo», de Van Dyk e
«Bacante Dando Vinho a Cupido», de Feodor Bruni.
proporcionava. A biografia de Sileno diz tudo: o velho que defendia «quem não aprecia o vinho é louco» gozava da prestigiosa fama de sábio e do proveito de conhecer o futuro, como comprova o passo em que trocou as voltas a Midas.
Na mesma civilização o deus da criatividade, Dionísio, ocupava o pelouro da protecção vínica. Entre os Muçulmanos, proibida pelo Profeta a ingestão na Terra, foi diferida para o Paraíso, como recompensa post-mortem, sendo de vinho um dos quatro rios que lá correm.
No Mundo Cristão foi o Vinho Consagrado que se transformou no Sangue ritual que liga à Verdade Eterna. Mas mesmo em mais mundanas circunstãncias serve esse néctar como critério de destrinça de verdades menores perante a gigantesca pilha de joio imposta aos nossos olhos pelas circunstâncias da vida. O povo vê a verdade in vino veritas, no que diz e faz aquele que, tocado, se vê sem a miríade de recursos necessários ao embuste. Por outro lado, na civilização inglesa, serve para avaliar o carácter dos homens, ou a falta dele. Sempre inspirou profunda repugnância o teetotal, o abstémio, indivíduo reputado de falho de inteireza. E um certo Professor de Literatura Inglesa de Oxford celebrizou-se por recusar voltar a ensinar uma linha que fosse de Tennyson, a partir do momento em que o viu misturar água no Vinho do Porto.
Nos amores, já se sabe, Cupido sorvia-o com gosto. E como alívio das infelicidades é universalmente reconhecido, tal como é a ele que recorremos quando, à mesa, queremos desejar saúde. Significará essa constatação que devemos estatuir um novo mandamento que aconselhe a andar etilizado todo o tempo? Nem por sombras, afinal, como intuíram os existencialistas, caindo todavia no exagero inverso, para sermos, verdadeiramente, Homens, a felicidade também deve ser tomada com moderação...
De Ibn al-Zaqqaq:
CENA BÁQUICA
É servido, de roda, o vinho
no jardim coberto de geada.
sobre as trevas se executa
já a sentença da aurora.
Olha-nos a taça do vinho:
as pupilas das suas bolhas
substituem os olhos lânguidos.
Não se terão ocultado
as estrelas do horizonte,
apenas se mudaram
dos céus para o jardim.
Temos o «Sileno Bêbedo», de Van Dyk e
«Bacante Dando Vinho a Cupido», de Feodor Bruni.
3 Comments:
At 11:37 AM, Anonymous said…
Belo poema de Homenagem ao "divino líquido". A propósito, temos que, um destes dias, provar um vinho que esteja à altura desta evocação: talvez o Quinta da Leda 2003. Merece-o o post, e sobretudo o seu autor e amigo.
Embora não seja este o espaço mais apropriado visto tratar-se de outro post, agradeço a dedicatória do post do Praxíteles, o primeiro maneirista.
At 11:56 AM, João Villalobos said…
Tintol logo pela manhã, hem!? Isto está bonito...
At 5:56 PM, Paulo Cunha Porto said…
Ao Francisco:
Vamos a isso, Querido Amigo. Ainda bem que gostaste. E quanto à dedicatória do outro "post", está a figura inspiradora a condizer com um seu Digno Sucessor, aquele a Quem foi dedicada.
Ao João: mas não se trata de carrascão. É vinho fino...
Abraços
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