O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Friday, December 02, 2005

Leitura Matinal -197

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A mais entranhada vileza da Espécie Humana, porque em maior ou menor grau é pecha universal, consiste em tomar sempre os outros por parâmetro, quer erguendo olhares cobiçosos para o que se julga ser a saciedade e a confiança deles na sua acção, quer, na hora da desgraça
alheia, a secreta satisfação comparativa, ainda que não chegue a regozijos maléficos, por se ver não-vitimado pelas catástrofes ou infelicidades que testemunha. E o que, desde o início deveria ter sido a preocupação maior, de dar graças pelo que se possui, só nesse contexto de confronto
com males que não foram experimentados ganha a relevância que, por si só, mereceria ser reconhecida antes.
É a velha imperfeição do bicho-homem, avaliar como desejabilidade suprema alturas intermédias, com os seus riscos e limites, enquanto subvaloriza o que tem junto dele. O que só consegue ultrapassar com outros sentimentos medíocres.
De Cabral do Nascimento:

A ÁGUIA E O AVIÃO

Uma águia real,
Mãe dedicada como todas são,
Vendo passar um avião,
Dizia, tal e qual:

- És mais feliz do que eu.
Querendo, podes alcançar o céu
A todo o tempo, sem nenhum tropeço.
Eu tenho medo, sempre, de deixar o ninho
Sòzinho
E de o achar vazio, no regresso.
Porém tu partes sem nenhum receio:
Levas os filhos no teu seio.

Um dia, então,
Como visse
Cair o avião
Que já em chamas se envolvia,
Ela emendou o pensamento e disse:
- Sou mais feliz que tu... mas não sabia.


A escultura ao lado, assinada por Albert-Ernest Carrier-Belleuse,
não é mais um acto de propaganda do Glorioso. Representa Zeus,
simbolizado pela Águia, com a sua Filha Hebe, a Deusa da Juventude,
indo como ilustração da harmonia entre Pais e Filhos, como sabemos
pelo poema, a «felicidade da Ave Real».

2 Comments:

  • At 4:16 PM, Blogger Ricardo António Alves said…

    A Madeira está farta de nos dar bons poetas: o Cabral do Nascimento, o Edmundo de Bettencourt, o Herberto Helder, o José Tolentino Mendonça. É bestial como só valorizamos os Açores (grandes Antero e Nemésio, para só falarmos nos maiores), mas realmente a Madeira, para a população e os índices de desenvolvimento que teve, tem de que se orgulhar...

     
  • At 6:11 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    As «Fábulas» o Cabral do Nascimento são bastante interessantes. Tem uma adequada a quase todos as preocupações. E acaba por dizer que o verdadeiro título deveria ter sido «Epigramas».

     

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