Psicologia de Trazer por Casa

Correm rios de admiração por se constatar que os
envolvidos nas bombas de Londres não correspondem
ao «esterótipo do imigrante pobre e segregado». Mas
onde está o espanto? Foi sempre assim. As ameaças
realmente perigosas à tranquilidade pública e ao
bem comum foram, nas mais das vezes, assinadas por
uma minoria saciada mas frustrada. Saciada porque
não passava a incerteza e a privação quotidianas.
Frustrada porque, interiormente, sentindo a barriga
aconchegada, começa a olhar para mais alto, encarando
as suas aspirações, neste Mundo ou noutros, não como
um caminho, antes como um direito. E, quando se imagina
espoliada desse direito, desencadeia-se a revolta.
Veja-se a triste história da Revolução Francesa. Não
foi a miserável e fungível multidão assaltante da
Bastilha - a prisão dos Nobres onde só poisavam sete
locatários - que a fez. Esse motim perder-se-ia nas
brumas da História, às mãos do carrasco e da vulgaridade,
sem a direcção e aproveitamento que o enquadraram. A
desgraçada autoria do feito competiu a parte da burguesia
citadina, que, organizada nos Clubes, veio a promover a
mudança do fundamento do Poder para «o conjunto da Nação»,
restringindo porém o conceito desta ao que ia considerando
ser a «parte produtiva da mesma»: comerciantes, banqueiros,
industriais e profissionais liberais. Logo que lhe foi
possível, estabeleceu os sufrágios capacitário e, sobretudo,
censitário para concluir a obra. Eis a mentalidade de quem,
tendo o dinheiro, se acha no direito de lhe juntar o poder.
Mas é também o motor psíquico de tantos elementos das classes
médias que, com ordenado certo ao fim do mês, mergulham,
conforme as habilitações literárias, nas várias charlatanices
que pululam em torno de nós, desde o curandeirismo e a bruxaria,
até a certos esoterismos de pacotilha.
Certo, aconteceu assim em muitas épocas. A vontade de poder mais,
que obnubila o facto de já se ter bastante e o rumo do dever,
deu-nos exemplos históricos tão edificantes como o recurso
aos filtros da Voisin e o Dr. Fausto.