O Misantropo Enjaulado

O optimismo é uma preguiça do espírito. E. Herriot

Monday, September 26, 2005

Imaginação Fértil

Tem vindo a ser repetido à exaustão um pretenso conceito, que
não o é realmente, pois, tal como na multiplicação e na divisão
aritméticas, sendo o nada um dos factores operativos, é, por
força, igualmente, o resultado. Falo da famigerada «ética
republicana», que, segundo as figuras públicas que a empregam,
estaria a ser violada pelos conhecidos casos de arguidos que
se candidatam a autarcas. Ética republicana? Quem já viu o
bicho que se chegue à frente. Acredito que o republicanismo,
aqui, venha no sentido parakantiano de partidocracia, pois não
vejo todos os seus vocais defensores como partidários de um
Cinco de Outubro de 1910. Ontem, no seu tempo de antena, o
Prof. Marcelo ainda tornou a coisa mais suave e vaga, referindo
a «moral republicana», ou seja, pensa-se, um sistema de valores
que pudesse sustentar, genericamente, a elaboração de um conjunto
de preceitos precisos que, veremos, de todo inexiste.
Realmente, que injunções podemos captar como traço específico
num sistema de eleições? A solitária diferença que distingue
os comportamentos iniciais esperados nos homens públicos desse regime
dos de uma monarquia tradicional, cinge-se ao empenho nos prospectivos
políticos de procurarem exercer o poder, em lugar de aguardarem
pacatamente por escolha superior. Não está em causa o bom
ou mau receituário que pretendam aplicar. O que está em jogo
é a motivação a que obedecem. E essa, porque implicando um juízo
favorável em causa própria e estimulando um aspecto concorrencial
no provimento de cargos públicos, é o contrário da obediência a
uma regra estrita por respeito ao outro. Claro que nem todos
saltam da erva para as drogas pesadas. Muitos dos que se submetem
a estas jogatanas eleiçoeiras nunca abusarão do seu estatuto, ao
ponto de usá-las para retardar ou escapar a punições. Mas, como
pano de fundo de satisfação de aspirações que abstraem de outrem,
o germen está lá: a ética republicana é a que não existe.

6 Comments:

  • At 3:42 PM, Blogger zazie said…

    «Quem já viu o
    bicho que se chegue à frente.»

    ora bem. Constato que não estou sozinha ";O)

     
  • At 6:04 PM, Blogger João Villalobos said…

    Quanto a mim, sou muito reticente ao conceito de «éticas de grupo». Estando os valores éticos ligados a valores educacionais. E podiamos aqui desfiar uma lista pouco ética de comportamentos monárquicos (senão monarcas). A pretensa ligação entre o colectivo e os valores é a base de qualquer demagogia.

     
  • At 6:06 PM, Blogger João Villalobos said…

    Dito isto, eu cá prefiro a consciência moral - universal e individual. Pois é, que queres, sou kantiano malgré moi.

     
  • At 7:57 PM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Ainda bem que a Zazie perfilha a perplexidade.

    Quanto à dúvida levantada pelo João, nunca eu disse que todos os monárquicos - e até alguns monarcas - tivessem uma biografia inatacável. O que quis frisar foi que a conduta expectável, em função do mecanismo de chegada ao poder é, nos regimes eleiçoeiros,
    incompatível com o fundamento da ética assente na consideração do Outro, a quem se crava um voto, somente depois de se decidir, no próprio caso, que se é melhor do que ele para o exercício dum cargo.
    E a referência a (para)Kant(ianos)
    queria tão-só remeter para o conceito de «república» do Autor das «Críticas», não para a sua derradeira fundamentação do comportamento, que é guitarra para a qual este blogue - e quase certamente o seu redactor - não tem unhas.

     
  • At 11:48 AM, Blogger João Villalobos said…

    Ok. Lembro só que, quando chegou a expressão «ética republicana», o rotativismo monárquico era eleiçoeiro e muito mais, e a dita associação entre as duas palavras fazia sentido para quem esperançoso as ouvia. Que hoje ainda essas duas palavras surjam juntas, isso é que já dá vontade de rir.
    Por outro lado, numas eleições que se desenrolarão num cenário de Regresso ao Passado, ainda prevejo mais viagens no tempo. H.G.Wells forever!

     
  • At 7:30 AM, Blogger Paulo Cunha Porto said…

    Eu nada tenho a ver com o rotativismo dito monárquico. Por incapacidade minha, certamente, ainda não consegui, ao que vejo, fazer passar a mensagem de que sou tradicionalista.
    As atoardas das «éticas republicanas» não nasceram com a inexistência delas patente na actuação do PRP. Apareceram com Cícero e
    têm vindo, sobretudo, a ser contrafeitas nesta terceira república.
    Um e outra nunca detalharam o que fosse.

     

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