Espanta-Pardais

Não nos entra, certamente, bolso adentro, como
a do orçamento do Prof. Cunha, mas nada há de
mais irritante para quem escreve do que caçar
uma gralha num texto seu. Hoje, de tarde, tendo
ido visitar um Amigo, pedi-lhe para ligar o
computador e abrir o «misantropo», pois queria
indicar-lhe um ponto que lhe passara despercebido.
Deferido o rogo, deparo com uma falha ortográfica
do tamanho do Mundo, ainda por cima num título.
Logo ali abusei da hospedagem que me era oferecida
e corrigi. Mas fiquei a pensar nos enganos mais
graves, aqueles que, em suporte impresso, subvertem o
sentido do texto.
E voou a minha simpatia para o inolvidável Machado de
Assis. No prólogo a um livro escrevera: «a amizade do meu
falecido Amigo cegava-lhe o juízo...». Por artes e
manhas do Diabo que atormenta os tipógrafos o "e" de
«cegava-lhe» transmutou-se num "a". E foi ver o grande
Autor do «Memorial de Aires», nos poucos meses que lhe
restaram de vida, correr, atormentado, pelas livrarias,
tentando emendar, à mão, o erro, perante a má disposição
dos livreiros, que, compreensivelmente, não achavam graça
alguma ao argumento de que «era o Autor e, por isso tinha
o direito de corrigir o que tinha escrito».