Leitura Matinal -63

Não há temática mais falaz do que a das tautológicas
e impensadas apologias das liberdades. No limite, a
única liberdade que importa é a de escolher as próprias
prisões. A heterodoxia pode, nuns casos, ser veículo
libertador do espírito, em muitos outros constitui a
mais inquebrantável das grilhetas, especialmente ao
obrigar o indivíduo a pensar e agir em função de si
e da contraposição ao establishment. Como já tenho
frisado, só a distância confere asas, desde que se não
transforme em afastamento, em fuga para longe da vista
ou para os abismos do próprio interior.
Por todas estas ponderosas razões, pespego nesta folha o
poema de James Oppenheim, vertido para o português por A.
Herculano de Carvalho:

O ESCRAVO

Libertaram o escravo, partindo-lhe as correntes...
E então ele ficou tão escravo como dantes.

Estava ainda acorrentado ao servilismo,
Manietado pela indolência e pela preguiça,
Ligado pelo medo e pela superstição,
pela ignorância, desconfiança e selvageria...
A sua escravidão não estava nas correntes
Mas nele mesmo...

Só podem libertar-se os homens livres...
Mas tal não é preciso:
Os homens livres libertam-se a si próprios.