No Rasto do Nome
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Faz anos de bloguismo o Jansenista. E diz que a designação que escolheu não dá de beber a prática internética de fervor religioso. Sem dúvida, pois os Jansenistas históricos negaram sempre a sua própria existência como tais, enquanto Este exibe, para alegria de todos nós, essa condição. Querendo homenageá-Lo, aqui posto o retrato, por Champaigne, do Abade de Saint-Cyran, figura importante na direcção das Almas de Port Royal, o qual é para mim simpático na sua oposição aos aspectos mais sombrios de uma figura ambígua como Richelieu - criticando o apoio deste aos poderes protestantes e desmontando a nefanda construção teológica do Ministro de Luís XIII, denominada «attrition», segundo a qual o resgate dos pecados baseado, sem mais, no temor das penas que Deus imponha, seria suficiente. Acompanho até aí, mais longe não vou.
Mas onde andará o «Jansenismo» do Nosso Homem? Creio que no pessimismo que fez os seus modelos reagir contra os extremos da capacidade humana de escolher livremente a sua acção, que viam como auto-glorificação e afastamento de Deus, tentando compensar esse triunfalismo da obra do Homem com uma vida apartada voltada para a acentuação separada da Fé e decorrente canalização para a pedagogia. Quanto a mim, não é modelo aceitável, por... optimismo exagerado e deficit de universalismo. São Francisco partiu de necessidades espirituais semelhantes, porém optou por comportamento completamente diverso, ao sublinhar a necessidade de permanecer no Mundo, embora não vivendo para este Mundo, nele integrando os que nem de perto se aproximassem da Sua via.
E onde pára então a filiação intelectual do Nosso Amigo? Creio que Lhe terá ficado de militâncias juvenis que confessa o amor a um Portugal cuja carga mística, contudo, tem pudor em afirmar, embora desgostando-se do desbaratar contemporâneo da possibilidade histórica que somos, ainda que apenas insinuada pelo que fomos. Daí, julgo, que promova a sensibilidade individual degustada no impressivismo rosseauniano e que desconfie de Roma, concorrente em universalidade na apreciação, mas disponibilizadora de uma via única que Lhe custa a aceitar, para mais condenando particularidades nacionais, a que os leitores do Bispo de Ypres, um tanto acidentalmente, se acabaram, galicanamente, por colar.
É então, quer nas abordagens sérias do que nos cerca e formou, quer nos elementos de distracção artisticos ou simples prazeres que tornam suportável a vida, que se gera essa prosa admirável, agora multiplicada com os dialécticos enfoques que estabelece com Esse Outro Grande Vulto, admirador Daqueles que, por via da defesa molinista, concitaram a rejeição das Suas Referências. Diálogo único e mais do que digno de seguir, entre Alguém que se proclama livre de Partidos e Uma Contraparte que abdica programaticamente de militâncias activas. Num momento em que o desgosto pelos caminhos que a blogosfera toma me empurram para um estado de desânimo, é esta permuta de vistas excepcional que me faz continuar.
Abraço amigo de parabéns, a Si, Caro Jans, que me apetece parafrasear, qualificando como «Tudo menos Jansenista».
6 Comments:
At 2:34 PM, Jansenista said…
Senhores, que atentado à minha austeridade, deve estar a falar de outro!
Belo retrato de Duvergier de Hauranne (Saint-Cyran) que como sabe albergou por longas temporadas o semi-indigente Cornelius Jansen, primeiro em Paris e depois em Bayonne: não conhecia bem o retrato, e conheço mal a obra de Champaigne (não sei porquê, os pensamentos jansenistas associo-os mais a Caravaggio e a Georges de la Tour).
Quanto ao retrato mais personalizado do «boneco» que coloquei de sentinela lá no Ashram, sou mau julgador em causa própria, mas revejo-me inteiramente na proeminência do galicanismo (para bem e para mal). O «boneco» é propositadamente mais nobre do que eu - e mesmo assim persiste em ser republicano!
O «boneco», porque é sonhado por mim e se assume como Jansenista, é tudo menos jansenista, tem razão (é o mesmo que o anti-maquiavelismo que ressalta dos escritos de Maquiavel). O jansenista sou eu, por detrás da máscara, fugindo dos aplausos do mundo, deixando os louros para o «boneco», mas de mim não narra a fábula...
Obrigado!
At 7:20 PM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro Jansenista:
hihiihihihi, não queria perturbar a simplicidade do homenageado ou a do Seu Duplo. Caso para dizer que, na Blogosfera, cada um está adstrito ao "doppelganger" que lhe ocorreu. E sim, o grande Caravaggio, com os seus escuros, evoca Port Royal, não chega ao Calvinismo, pelas cores quentes que também integra e pela atitude das figuras.
Quanto ao Galicanismo e Republicanismo, deixe-me "picá-Lo": Como é infausta a sina dos Regalistas sem Rei!
De Si pode não rezar a Fábula, mesmo no sentido de Mitologia. Mas será sempre local de detença obrigatória na História da Blogosfera Portuguesa.
Forte abraço.
At 7:53 PM, Anonymous said…
Um Jansenista que desconhece (ou pouconhece) M. Philippe de Champaigne é... pelo menos, suspeito.
Parabéns, quand-même.
Port-Royal
At 7:55 PM, Anonymous said…
O Georges está bem, mas... Caravaggio?
Je vous en prie, Monsieur...!
Blaise.
At 11:18 PM, Je maintiendrai said…
A festa não é minha e já deitei os foguetes noutro lado. Contudo, não vão as palavras simpáticas do Misantropo alimentar essa coisa que aí corre de que o JM é máscara do ubíquo J, ou vice versa. Alternadamente compinchas e caturras, como vai com as tertúlias e sempre com gosto meu, mas cada um no seu convento.
At 10:32 AM, Paulo Cunha Porto said…
Meu Caro Je Maintiendrai:
Credo! Não se deduza tal dos meus dizeres! Afirmei o quanto me agrada seguir o Vosso diálogo, não falei, como o Outro, em «diálogo ao espelho».
Abraço.
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